Confissões de uma leitora 28/12/2017
Josiane é uma autora coringa.
Sabe aquele tipo raro de autor(a) que você tem confiança o suficiente para fechar os olhos e escolher uma de suas obras com a certeza de que valerá cada centavo que pagar, ou, se tiver sorte, baixar gratuito quando ele(a) disponibiliza? Que compartilhamos seus lançamentos mesmo sem ter lido porque sabemos que se trata de algo de qualidade?
Ela entrou nesse meu hall exclusivo de autores.
E olha que este é o SEGUNDO livro dela que leio.
O primeiro foi TRAÇOS, um conto homoafetivo lindo e cativante, super bem escrito e de uma sutileza e sensibilidade de dar inveja.
Josiane não deixou a desejar aqui, com uma exceção que me fez retirar uma estrela.
Embora seja apenas o segundo livro que leio da autora, é notável sua dedicação e imparcialidade para com os personagens, o que pra mim é essencial e o divisor de águas entre o bom e mau autor(a), além de não ser politicamente correta (melhores pessoas), “obedecer” a realidade e quem o personagem é sem medo de ser feliz. Isso pra não falar nas mensagens que o livro passa, criticas sociais que nos faz refletir sobre nós mesmos.
O PECADOR já pegou logo no prólogo.
Eu amei a “nova roupagem” do começo dos tempos, por assim dizer. É de uma criatividade e escrito de forma tão bonita que se torna crível.
O suspense fica no ar, uma fina camada, que me fez curiosa e doente por mais, para saber quando e o que iria acontecer a seguir.
Como uma garota que crê em direitos e deveres iguais, uma das coisas que me cativou de cara, além do prólogo, foi a educação igualitária que seus tios e toda parentada deu a ela, apesar de viver (ainda vivemos) em tempos onde a sociedade machista massacra a mulher e a humilha por achá-la um ser inferior ao homem.
Élen é uma guerreira, treinada desde jovenzinha para ser a herdeira do trono, a rainha, e apesar de ter uma personalidade doce e seja feminina, ela não tem nada de submissa. Ela pode ser uma leoa para defender os seus.
Nyalla é aquele personagem que chega do nada e te conquista. A amizade entre ela e Élen é de emocionar. Empatia é, de fato, um sentimento poderoso, o berço de todos os bons sentimentos, pois nos torna melhores e, consequentemente, somos melhores pessoas para o outro, também.
Gideon, bem, queria lhe dar uns murros nas fuças.
Ele é o típico cego, o fanático, a própria ignorância... e humano.
Ignorância é o berço do preconceito e dos males como fanatismo e radicalismo. Só por haver o sufixo “ismo” nota-se que boa coisa não é.
Josiane traz uma realidade que, infelizmente, ainda é muito presente em nossa sociedade. Fanáticos religiosos que usam de seu conhecimento (cego) para pregar ódio disfarçado de amor, da boa moral e bons princípios. Mas esquecem de pregar empatia, amor, respeito e tolerância para com seus semelhantes. Esquecem de ensinar que não precisamos pensar igual, concordar, apoiar ou aceitar algo, para respeitar. Só precisamos respeitar.
Por vezes em minha vida fiz e ainda faço as perguntas que Élen fez.
Somos iguais, com peles diferentes. Sangramos igual. Mesmos órgãos e necessidades. Respiramos o mesmo ar. Todos nós iremos morrer.
Por que não unimos forças para fazer o bem a todos, independente de sua orientação sexual, seu gênero, seu credo e crenças, sua cor?
Por que brigamos entre nós mesmos, criamos guerras, machucamos e matamos quando poderíamos criar um elo de amor, de empatia pelo próximo, que por sinal é gratuito?
Por que não nos respeitamos? Aliás, por que é tão difícil respeitar a pessoa que pensa diferente de você?
Seríamos mais sábios e felizes se compartilhássemos nossos conhecimentos, acrescentando na vida um do outro, acima de tudo, respeitando nossas diferenças, ainda que não concordamos.
O ponto positivo nisso tudo (sempre há um) se dá pelo fato de sermos seres pensantes, que basta apenas uma fagulha para que a dúvida se instale e gere questionamento. Infeliz é aquele que aceita tudo sem questionar. Nunca será capaz de aproveitar a beleza da vida, de aprender, amadurecer, evoluir.
Gideon é a prova do quanto à ignorância pode ferir e as vezes até matar, bem como é a prova do quão poderoso é o questionamento.
A mudança só ocorre quando nos permitimos questionar. Então surge o conflito. E isso é lindo pra caramba! É arrebatador! Nunca vi ninguém aprender no acerto, aliás, no acerto somente nos gabamos e aproveitamos. Mas, para mim, sem sombra de duvidas, os melhores e maiores aprendizados surgem do erro, do conflito interno, porque é quando paramos para dar atenção a nossa forma de pensar e agir, é quando refletimos sobre nossas ações. E que poder estupendo essa pausa com a subjetividade tem em nossas vidas!
Vougan, no entanto, é prova de que a prepotência e ambição desmedida fazem do próprio sujeito um escravo de sua podridão. Ele mesmo se afunda, e como ocorre com qualquer vitimista, ele nunca admite o erro, pois sempre reclama ser vítima do mal alheio, quando, na verdade, é vítima de si mesmo.
Admitir o erro é coisa dos fortes.
Mudar de opinião não te faz inseguro, senão inteligente e empático. Não somos os mesmos que fomos há anos, meses, semanas e dias atrás.
Essa capacidade de mudança é que faz de nós seres únicos. Podemos ver esse fenômeno em Gideon. Acompanhar sua mudança mediante seus questionamentos internos, dia após dia, foi estupendo, difícil e crível.
MAS...
O romance não me convenceu, faltou algo, mornou.
A emoção, a intensidade, o sentimento avassalador, o tipo de amor que será uma explosão. Senti essa premissa e foi surreal, antes que ela encontrasse seu amado. Mas todo esse rompante ficou lá, no antes, não transcendeu o depois. Houve algo no fim, mas, ainda assim, não rolou.
Entendo que esse era o plot da história.
Mas, para mim, Daya, teria sido mais crível se eles tivessem seguido o caminho da amizade ao invés do romance, como ocorreu entre Élen e Nyalla.
No mais, o livro é bom, de uma criatividade ímpar. É interessantíssimo saber como os reinos foram divididos, como os conflitos surgiram.
Só pelas críticas sociais vale a pena ser lido.
Não preciso lembrar que minha opinião é minha e não universal, portanto, vale exclusivamente para mim.