Nu e As 1001 Nuccias 02/02/2018Resenha do blog As 1001 NucciasResenhista: Nuccia De Cicco - imagens e citações no link do blog
Conheci a escrita da Bia através do seu romance histórico "Restos de Nós" e descobri uma autora com a incrível capacidade de ser delicada, cuidadosa e sucinta com as palavras.
Daí, eu peguei O Banquete das Hienas, vi a capa simples, mas cheia de significado e pensei que ia encontrar outra Bia. Dito e Feito.
O Banquete não é um livro que pinga sangue. A bem da verdade, escorre, verte, dá até pra torcer. Dividido em duas partes, encontramos na primeira vários contos e na segunda, o Banquete em si, grandiosos (em contexto e conteúdo, mas não em tamanho) microcontos.
"Padre Décio me falou que temos de perdoar. Mas perdão deve vir de dentro e eu fiquei oco como minha mãe. Sem - amor no - peito. Não consigo. Acho que nem mesmo Ele conseguirá. Onipresente, conhece o homem e sabe que ele é ruim."
O que impera nos contos e microcontos? A realidade, nua, crua, sanguinolenta, dolorida. Realidade pura e simples. Como bem diz na sinopse e na orelha, são contos que poderíamos encontrar em qualquer jornal, site de notícias e difusão em redes sociais, se é que já não encontramos.
Também conforme conta na sinopse, os contos desse livro têm inspiração na escrita de Rubem Fonseca, um grande escritor brasileiro contemporâneo, cuja maior característica é a narrativa urbana carregada de realidade: com violência, sutileza, sexo, brutalidade, e até um pop. Foi consagrado como reinventor da literatura noir (Fonte: Wikipédia).
Os contos variam entre primeira e terceira pessoa, possuem estilos de narração diferenciados que combinam com as personalidades dos personagens narradores, incluindo seu linguajar e modo de pensar. Alguns possuem muitas frases curtas de impacto, tornando a leitura mais ligeira sem deixar de massacrar nossos conceitos.
O português da Bia é impecável. Desde o livro anterior que sei o quanto a leitura é agradável e limpa. Nesse não foi diferente. Nenhum, anotem bem aí, nenhum mesmo erro de português, de digitação, de pontuação. Nenhuma vírgula faltando ou fora do lugar, nenhuma letra trocada. Bia e a Giostri estão de parabéns.
Diagramação linda, bem feita. Capa simples, até demais, mas convenhamos que com um título desses, nem precisava encher de efeitos.
Sobre os contos, vou deixar aqui um breve relato sobre dois dos meus preferidos, só para deixar vocês com água na boca. Só não falo sobre todos porque seria uma resenha extensa pra danar.
A filha da puta
Este conto foi premiado no Concurso Nacional de Contos Newton Sampaio. Narrado em primeira pessoa, mostra os pontos de vista de uma jovem de classe baixa, cuja mãe troca o corpo pelo que precisa, seja lá o que for. A jovem se enxerga de modo diferente, ela não troca, nem vende. Na primeira oportunidade que conseguiu de sobreviver sozinha, saiu de casa. E passou a enfrentar a rua, engravidou. O final? Tão comum, tão dia a dia, tão normal que chega a doer. Dói no coração.
"Saio e veio aquela sensação áspera. Todo mundo me olhando. Eu sei que me encaram assim porque sou filha da puta. Aqui a gente pode ser pobre e até vender o corpo, mas trocar como faz a mãe, e tão baratinho assim, não pode. Isso é feio. É baixo."
Cordeiro de Deus
Este é um conto bem curto, de uma página só, mas o impacto valeu por meio livro. Falar dele é entregar o ouro todo. É escrito em primeira pessoa em sua maior parte (só a última frase é em terceira). A descrição detalhada vem misturada aos pensamentos e divagações do narrador. Vai te chocar, claro. Por ser tão comum, tão corriqueiro.
"Mas sou um escravo. De Deus. Não podemos nos amar assim. Nunca mais."
Enfim, livro mais que recomendado se você busca uma boa variação da literatura nacional. Quem curte contistas, precisa conhecer a escrita da Bia. Vocês podem comprar o livro no site da editora ou direto com a autora.
site:
http://1001nuccias.blogspot.com.br/2018/02/resenha-livro-arroz-crime-banquete-hienas.html