Resenhas - O Livro que Lucas não escreveu

Henrique Machado 06/02/2021

O Livro que Lucas não Escreveu é uma novela baseada em dados históricos. Apresentando a obra como uma tradução de texto escrito no mais puro grego - tendo sido os seus originais encontrados no cemitério da cidade grega de Tebas, em escavações feitas para uma sepultura ao lado da capelo onde primeiro foi colocado o corpo de São Lucas - Eurico Branco Ribeiro já estabelece, de pronto, o clima ficcional da sua narrativa.
É um subterfúgio literário que visa produzir determinado efeito: transformar o histórico em ficção enquanto a ficção assume características de História. Na verdade, o objetivo do Autor, amplamente alcançado aliás, é o de contar, até com minúcias, uma realidade pretérita dando-lhe o sabor de atualidade. Os acontecimentos de ontem se desenrolam como se fossem agora, pois que lemos a narrativa como um depoimento contemporâneo, depoimento de alguém que acaba de presenciar tudo que está reconstituindo. O truque - que tantas vezes utilizado pelos escritores - rende sempre a sensação de nossa presença numa época que sabemos de outrora.
O Livro que Lucas não Escreveu narra basicamente a história dos cristãos logo após a morte de Jesus, história centrada na figura de Saulo de Tarso, o Apóstolo Paulo que se dedicou a converter gentios. Nele se descrevem as aflições de lutas dos "irmãos do caminho", a difícil mas sistemática propagação da nova fé, os usos e costumes desse subversivo mundo romano, os sacrifícios que tiveram de enfrentar para o triunfo de suas crenças, as perseguições sofridas, as loucuras de Nero, as prisões césares, enfim, todo o complexo sócio-histórico-político e cultural que informou a concepção pagã de vida e a nova visão do mundo pregada pelo ideário inovador e revolucionário de Jesus Cristo.
Mas, acima de crueldade do poder romano, da iniquidade da classe dominante sobre os desvalidos, o que ressalta o livro é a firmeza de cristãos, a força do verbo novo, a sua mensagem de esperança que futrifica e se espalha por todos os quadrantes da terra, apesar dos horríveis punições e assassínios coletivos ordenados pelos representados de uma civilização caduca, amoral e injusta.
Eurico Branco Ribeiro soube realizar sua novela com extrema habilidade e, assim, faz-nos conviver com os Santos e comungar com ele de seus anseios, esperanças e, finalmente, certezas inabaláveis.