jota 25/06/2021BOM: mas talvez seja mais bem apreciado por especialistas em literatura e fãs incondicionais de ProustLido entre 17 e 24/06/2021. Avaliação da leitura: 2,7/5,0
Que me lembre li pouco Marcel Proust (1871-1922), acho que apenas No Caminho de Swann (1913), volume I de Em Busca do Tempo Perdido, e Os Prazeres e os Dias (1896), primeiro livro publicado pelo autor francês, ambos há mais de uma década. No início deste ano, com a continuação da pandemia, tinha pensado em ler os sete volumes de Tempo Perdido mas desisti logo nas primeiras páginas da releitura do volume I. Dizem que quem passa da página 80 (li isso em algum lugar na ocasião) então não pensará mais em desistir e ficará deleitado com a leitura do restante de toda sua obra. Não aconteceu comigo, infelizmente. Mas pela importância de Proust na literatura mundial e para compensar minhas deficiências de leitor, adquiri esse Salões de Paris, reunião de 22 crônicas publicadas em revistas e jornais franceses no tempo em que MP era jornalista, melhor dizendo fazia um tipo de colunismo social.
Algumas delas foram publicadas com seu nome real, outras com pseudônimos curiosos como “Étoile Filante” (Estrela Cadente), Dominique, Horatio, Pierre de Touche etc. Aqui também é preciso certa dose de paciência para levar a leitura até o final de cada texto, mas como eles são curtos – e alguns, bem poucos na verdade, são interessantes –, então não demorei tanto assim para finalizar o volume. Antes, é necessário ler a Nota do Editor, Proust Jornalista, mas especialmente a Apresentação com esboço de cronologia proustiana, de Guilherme Ignácio da Silva, professor de literatura francesa e especialista em Proust. Os dois textos são úteis, ajudam a situar as coisas e clarear fatos sobre a escrita proustiana.
Eles situam as crônicas no tempo e no espaço, quer dizer, nos salões de Paris, então frequentados por princesas, condes, condessas, membros da antiga e nova nobreza, alta burguesia ligada às artes etc. no tempo da chamada “belle epóque”. Período de cultura cosmopolita européia, sobretudo francesa, que se iniciou nos anos finais do século XIX e foi até a Primeira Guerra Mundial mais ou menos. A apresentação do professor Silva vai mais longe, identifica em algumas crônicas personagens, lugares e situações que irão depois reaparecer nas páginas de Em Busca do Tempo Perdido e isso seguramente é muito interessante para os fãs incondicionais de Proust. Mas como eu, eles terão de passar também por uma crônica altamente bajuladora (como várias das que escreveu) que Proust publicou em 1894, Festa Literária em Versalhes.
Nela ele, que então assina Toda Paris, não apenas descreve o local onde a aristocracia parisiense está reunida, o teatro de Versalhes, mas as modas, os trajes das mulheres em detalhes, os nomes daquelas pessoas todas, uma imensa lista que toma quase duas páginas da crônica! Uma atriz bastante famosa estava presente a “(...) sra. Sarah Bernhardt, usando um longo vestido de seda prateada, enfeitada com uma magnífica renda guipura de Veneza”, que depois iria declamar alguns versos de uma certa Mademoiselle Bartet. Pesquisando, descobri ser ela outra famosa atriz do final do século XIX e início do século XX. Na sequência, mais duas crônicas, ambas com o mesmo título, A Moda, porém uma de 1890 e outra de 1891, dois textos bem femininos, melhor, sobre o mundo feminino, sobre modas, vestidos de baile, um assunto que para Proust era “infinito!”. Felizmente nessa altura faltavam poucas páginas para o final do volume.
Ao mundanismo, aos ricos salões descritos nas crônicas de Proust se opõe a narrativa de outro autor francês (ou franco-argelino), de outra época, Albert Camus (1913-1960), de quem já li algumas obras e que escreveu em sua ficção autobiográfica, O Primeiro Homem, livro inacabado: “A memória dos pobres já é por natureza menos alimentada que a dos ricos, tem menos pontos de referência no espaço, considerando que eles raramente saem do lugar onde vivem, e tem também menos pontos de referência no tempo de uma vida uniforme e sem cor. [...] Só os ricos podem reencontrar o tempo perdido. Para os pobres, o tempo marca apenas os vagos vestígios do caminho da morte.” E ficamos por aqui...