Mila F. @delivroemlivro_ 13/02/2020
Visceral, angustiante, reflexivo
Bem-vindos ao Paraíso é um livro muito forte e aborda temas controversos na Jamaica de tal forma que, o leitor, consegue SENTIR tudo o que Nicole escreve. Temas como: relação familiar, sexualidade, identidade, racismo, o poder do dinheiro, a ânsia de prosperar, o comercio sexual, o turismo, entre outros.
O romance se passa na Jamaica, isso em si já me chamou bastante atenção, pois não tinha lido nenhum livro ambientado na Jamaica. Aqui iremos acompanhar a história de uma família composta basicamente por mulheres, fortes e bastante reais. Não são mulheres perfeitas, porque ninguém é.
Acompanhar Margot, Delores (sua mãe) e Thandi (sua irmã) é uma verdadeira jornada em que vemos a opressão, a miséria e as intempéries da vida de forma nua e crua. É impossível não sentir um aperto profundo no peito e uma revolta com o carma dessas mulheres.
Ao passo que Bem-vindos ao Paraíso traz a história dessas mulheres tão fortes e que parecem destemidas, percebemos o quanto elas são psicologicamente problemáticas e frágeis ao mesmo tempo, todas preocupadas com os problemas familiares, com seus problemas pessoais e com a ânsia de prosperarem a todo custo.
O enredo consegue nos surpreender com situações inesperadas, tristes, obscenas e é impossível não se refletir muito sobre as circunstâncias miseráveis que muitas pessoas vivem para conquistarem seu ganha pão, submetendo-se a vender seu próprio corpo ou agirem como cafetão.
Um contraste enorme quando observado o "outro lado" da Jamaica: o do turismo, o do luxo e do poder. O quanto o desenvolvimento turístico da Jamaica proporciona uma série de efeitos colaterais para a população nativa que vai perdendo seu espaço, sua dignidade, seu orgulho.
Bem-vindos ao Paraíso também nos coloca diante de dicotomias sobre o certo e o errado, sobre as crenças hipócritas, o julgamento ferino, a cultura e as leis da Jamaica que são capazes de nos chocar em diversos momentos.
Confesso que, no começo de Bem-vindos ao Paraíso me vi odiando as personagens, detestando seus comportamentos, o relacionamento entre Margot e sua mãe Delores, as cobranças da família com Thandi, o tratamento que Margot dispensava a Verdene, e a ânsia dessas mulheres em quererem ter mais e mais dinheiro para tentar mudar o futuro, para serem reconhecidas, quando elas mesmas menosprezavam sua própria cor, seu próprio orgulho, seus sonhos.
Depois, com o avançar do enredo, percebi que todas eram vítimas da sociedade que viviam, então tive pena delas e do destino tão cruel que elas compartilhavam. Além disso, eram vítimas do meio, de sua criação e do desejo de fugirem do padrão do "destino preestabelecido", mas impossibilitadas de quebrarem as correntes.
Realmente Bem-vindos ao Paraíso foi uma leitura extremamente marcante, mas devo admitir que não é um livro fácil de ler, a narrativa é um pouco lenta e os diálogos estranham um pouco, porque são transliterados (como conversas reais, sem estarem em norma culta) do patuá, uma versão do idioma falado pela população mais carente da Jamaica.
Contudo, é um livro potente, visceral e que dá voz a uma realidade pouco conhecida/refletida. Sem dúvida, amei a experiência de leitura e todas as reflexões e discussões que Bem-vindos ao Paraíso propôs, para completar gostei de saber um pouco mais sobe a Jamaica, inclusive pesquisei sobre várias coisas e descobri que lá a homossexualidade ainda é crime, dá para acreditar nisso?
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