D.J. Alves 10/01/2022
Brasil, meu Brasil brasileiro
Imagine Jurassic Park, mas o invés dos dinossauros aterrorizando e devorando os personagens por puro instinto de predador, houvesse nazistas, ou melhor integralistas.
O movimento integralista brasileiro, foi um movimento de extrema direita que vigorou durante o primeiro governo Vargas e aparentemente foi dissolvida no Estado Novo. Mas o autor de maneira maestral, resgata esses personagens hediondos da história brasileira e usa nesse romance de ficção que tem tanto em comum com a nossa época.
O livro fala do sonho e da imaginação de construir um Parque Temático, conta sobre Disney e a sua vinda ao Brasil, de como um nacionalista decide construir Tupinilândia para comemorar a infância vivida e de como esse sonho é deturpado depois.
É uma leitura leve, fácil, agradável, cômica, cheia de referências a músicas e a cultura nacional além de explicações bem detalhadas sobre arqueologia e parques temáticos. Gostei bastante. Termino com a música que foi recorrente no livro, Aquarela do Brasil.
Brasil, meu Brasil brasileiro
Mulato inzoneiro
Vou cantar-te nos meus versos
Brasil, samba que dá
Bamboleio que faz gingar
O Brasil do meu amor
Terra de nosso senhor
SEGUEM ALGUMAS FRASES E TRECHOS INTERESSANTES DO LIVRO:
Rir é o melhor remédio
Mas a vida carrega o mesmo drama de todo cinéfilo: você não pode repetir a experiência de ver um filme pela primeira vez.?
Seria isso uma prova de unidade no pensamento humano, de que aquilo que a imaginação de um homem concebe, a de outro é capaz de produzir?
?O esperto acredita em metade da história, mas o gênio sabe em qual metade acreditar.?
onde só se tem martelos, tudo o que se vê vira prego.
O sujeito tinha os mesmos ares boçais de toda aquela tigrada, de quem nunca leu um livro porque acha que já sabe tudo o que precisa, que prende o Ferreira Gullar por achar que seus livros sobre cubismo falavam de Cuba.
Que Deus tenha piedade de nós, pelo que fizemos com este país. Quando nos tornamos piores do que aquilo que combatemos, há coisas que não podem ser perdoadas.
Os governos passam, o povo fica. Eu sou apenas um brasileiro
Acho que ele tem razão. É o que eu sempre digo: se não passou na Globo, nem aconteceu.
E lá se foram vinte anos? disse João Amadeus, servindo as três taças.? Começou como reação a uma ameaça comunista que nem sequer existia, quis ser modernizante à la Juscelino mas regrediu pro estatismo do Getúlio, agora morre sem ter dito a que veio, porque quebrou o país, e era isso.? Apontou as taças aos rapazes.? Um brinde.? A que brindaremos?? perguntou Tiago.? Aos recomeços? propôs o velho.? Ao país do futuro.
Tu estás sendo elitista? criticou Tiago.? Se as pessoas vão ao cinema ver filmes bobos, ou leem um romance barato pra se distrair da rotina, eu entendo que isso pode ser raso, que deveriam acrescentar algo à vida e não só anestesiá-la, mas a vida não é um eterno cursinho de vestibular. O divertimento simples tem a sua função,
pirarucu assado ao molho de tangerina, com risoto ao leite de coco e castanhas.
Por trás de tudo, aquela sensação otimista de que, no futuro, a indústria privada poderá superar todos os problemas da sociedade, mesmo que fosse ela própria a causa geradora deles.
Você pode perceber um equilíbrio quase simétrico entre uma tensão realista e um humor pastelão, que faz com que você não só se prepare pra próxima loucura, como se predisponha a aceitá-la, a aceitar o que a história te trouxer contanto que fuja sempre à normalidade. Porque a normalidade são as horas perdidas no trânsito, subindo no elevador, obedecendo à rotina diária, a burocracia do trabalho, a previsibilidade da vida doméstica.
Quem desdenha dos prazeres da imaginação são eunucos mentais, castrados que creem que a sua castidade provém de uma escolha elevada, e não de uma limitação intelectual. Gado pra abastecer essa grande máquina de moer gente que é o nosso país.
a terra que lhe deu a oportunidade de ser uma pessoa, e não uma estatística.
o regime militar vai acabar, mas a mentalidade autoritária e paranoica que gerou tudo isso é atemporal.
Mas eu poderia tê-lo salvado, se tivesse chegado antes. Se tivesse me importado antes. Eu poderia? ter feito mais.
Homens não gostam de receber ordens de uma mulher, isso é um fato. Se o meu pai eleva a voz, ele é firme e determinado. Se eu faço o mesmo, sou a louca insensível.
?o poder corrompe??
O poder atrai os corruptíveis. E poder pelo poder se torna um? um exercício de força. Se não houvesse o comunismo? teriam que inventar outra coisa. Pra justificar o desmando
Sinais de vida no país vizinho Eu já não ando mais sozinho Toca o telefone Chega um telegrama enfim
Não existe cultura inútil, inútil é quem não tem cultura.
A verdade é que somos todos escravos do mesmo sistema. Vocês foram criados pra pensar como escravos e louvar o esforço que os oprime como se fosse o trabalho que os liberta.
Para esse fenômeno, a medicina da época tomou emprestado do grego homérico os conceitos de nostós? ?reencontro, retorno ao lar?? e álgos? ?dor, sofrimento??, e cunharam a palavra ?nostalgia?.
Somos mais do que animais, somos animais com cultura. É por isso que ela é tão vigiada, resguardada, reconstruída e, no caso do Brasil, intencionalmente negligenciada por sucessivos governos. Sem contexto, a nostalgia se torna uma ferramenta de alienação e autoritarismo. Façam o teste e percebam: o ataque à memória e à cultura é o primeiro passo de um governo autoritário, em todas as épocas, qualquer que seja a posição ideológica. Porque nossa memória cultural é um material tão sensível e volátil quanto combustível. Esse combustível alimenta o sistema, mas também pode se tornar o coquetel molotov que o incendiará.
Adoro como você faz parecer que tudo se encaixa, como se fosse inevitável? Lara disse.? Sim, mas a vida só faz sentido quando começa a ser narrada.
?Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá??. Aos olhos de Donald, tudo aquilo era uma declaração de amor ao caos urbano brasileiro, uma representação de sua capacidade afetiva e acolhedora. Era a mesma impressão que teve na primeira vez que veio ao Brasil, no final dos anos 90. Claro que era um país mais pobre do que sua terra, e mais pobre do que era o Brasil de agora, mas havia uma cordialidade que não encontrava em sua terra natal. Um lugar onde seus filhos cresciam longe da competitividade social agressiva de seus compatriotas, cultivada desde o berço no ambiente segregado das high schools, onde ninguém nunca era branco o bastante, vencedor o bastante para ser deixado em paz. Pois eram ensinados que deviam ser sempre os melhores em tudo, já que viviam no melhor país do mundo; onde se devia desprezar os perdedores, pois só deve haver vencedores no melhor país do mundo; e constantemente saudar a bandeira e idolatrá-la, aquela que é a bandeira do melhor país do mundo; e entregar redações na escola justificando por que viviam no melhor país do mundo? mesmo que ninguém ali tenha visitado outro país, alguns nem mesmo outros estados. E caso ocorresse de seu país entrar em guerra, algo tão certo quanto o sol nascer, nunca, jamais questionar por que se estava em guerra eterna. Porque quando sua identidade cultural se ancora na supremacia, você já chegou ao fascismo sem passar pela autocracia. Por isso ele amava o Brasil. Ali não precisava trabalhar oitenta horas por semana e abdicar de uma vida pessoal. E seus amigos brasileiros ainda perguntavam por que saiu de lá, por que decidiu vir logo para cá, neste lugar perdido e violento.
a frustração e a raiva violentas derivadas de uma existência controlada e miserável precisam ser canalizadas para algum lugar, de modo a entregar à população uma válvula de escape, mesmo que fosse um inimigo muitas vezes inexistente? a lógica que guia o mundo desde sempre, do ódio religioso ao político.
É a única coisa que não podem controlar, porque é a única coisa que eles não têm. Por isso que eles sentem tanto medo disso. E no final das contas, é o que vai acabar com eles. ? E o que seria isso, posso saber? ? Senso de humor, dona ? ele sorriu.