Paulo 29/07/2018
Desde a publicação de A Face dos Deuses que a gente é capaz de perceber a habilidade que o Gleyzer possui em representar personagens torpes e cruéis. Desde aqueles realmente malignos até aqueles que desejam alcançar objetivos maléficos a partir de boas intenções. Em Coração de Dragão, nos vemos diante de um personagem realmente maligno e que consegue facilmente justificar suas ações a partir de um racionalismo que somente ele é capaz de entender.
A escrita deste conto é toda em primeira pessoa. A escolha foi ideal porque permite ao leitor se conectar melhor com o personagem. Afinal, é ele quem comanda a narrativa. Mais do que isso, o autor quebra a quarta parede fazendo com que o protagonista converse diretamente com o leitor. O efeito que isso produz é sensacional. Me senti como em um filme do Hannibal Lecter em que eu estou do outro lado das grades argumentando com o protagonista e tentando compreender suas motivações. A história é bem feita e redondinha. Tem um começo, um desenvolvimento e uma conclusão que conseguem torná-la simples, porém compreensível.
O protagonista foi baseado sim no Hannibal. A gente consegue traçar algumas similaridades. Porém, o autor dá toda uma personalidade ao personagem, tornando-o único. O Dragão é carismático de uma forma maligna. Se a intenção era de fato apresentar um protagonista encantador, o objetivo foi alcançado. A maneira como ele fala, como podemos imaginar os seus gestos, dá vida a ele. A narrativa nada mais é do que a de um serial killer que conta como ele iniciou sua vida de crimes. Possuindo motivações frívolas, mas que para ele são grandiosas, ele aterroriza o Brasil. A história começa com o personagem preso, marcado para a morte, mas feliz por ter conseguido deixar sua marca. E provavelmente essa é a grande temática deste conto: ser lembrado. O personagem poderia ter continuado em sua trilha invisível de assassinatos, mas isso não bastava a ele. Era preciso algo mais. Isso conta bastante o funcionamento da mente de um assassino em série.
Coração de Dragão é um conto rápido, porém muito interessante. Gleyzer demonstra que está evoluindo em sua escrita, sendo capaz de nos entregar uma história fora de sua pegada inicial, mais voltada para a fantasia, e nos apresentar uma narrativa mais violenta e cruel. Seu personagem certamente se tornou memorável aos meus olhos.
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