Os Contos de Belazarte

Os Contos de Belazarte Mário de Andrade




Resenhas - Os Contos de Belazarte


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Kimb.s 04/08/2023

Meu primeiro livro do senhor Mário de Andrade.
Confesso que entre os poucos clássicos que li, a escrita do Mário não me agradou muito, possivelmente porque ele usa muitas metáforas e exemplos dos dias em que viveu, coisa que não entendo. Porém ele consegue passar bem suas histórias mesmo em tempos diferentes, ou pelo menos deveriam ser tempos mudados. Coisas como o abandono, traição, amor e amizade, maus tratos, a angústia que ele busca retratar são sentidas pelos leitores.
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Lucas Salsicha 20/02/2023

Brasil
Encontrei esse livro no centro da cidade de Taquara, RS, tendo a antiga dona a ideia de repassar essa obra para o máximo de pessoas possível.
Mário de Andrade me surpreendeu com sua linguagem brasileira, e quero realmente dizer brasileira. Os erros de fala não presentes apenas nos diálogos, mas na narração, que traz a imagem de um amigo conversando contigo no boteco, relatando os causos de homens e mulheres que se dão bem e mal.
O retrato do jeitinho brasileiro fica nítido, e nos vemos odiando e amando personagens que vivem da melhor forma que podem.
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Raphael Rasse 22/11/2021

Belazarte me disse...
Um livro de contos que pode ser lido fora de ordem embora alguns tenham uma breve relação. Se o leitor conhecer a região da Lapa (São Paulo) talvez aproveite melhor a leitura.
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jota 26/07/2018

Pra lá de modernista
Os contos deste volume são da década de 1920, tempo em que o Brasil era mais rural do que urbano, o cinema existia mas ainda não era falado e sim legendado e orquestrado, na periferia de São Paulo se falava uma mistura de português culto e caipira, além de um palavreado cheio de expressões italianizadas (reflexo da imigração) como, por exemplo, "Porca la miséria!", várias vezes usada aqui. É que uma característica importante da narrativa de Mário de Andrade (1893-1945) é justamente o uso da oralidade, a recriação da linguagem do povo, do falar cotidiano dos suburbanos vivendo suas vidas quase miseráveis, bastante sofridas mesmo.

O Belazarte do título é o narrador (todas as histórias iniciam com "Belazarte me contou:") e alter ego do escritor mas o substantivo é igualmente usado de modo irônico e provocativo querendo significar belas artes sem refinamento, como os personagens de MA diriam, belazarte... Mário escrevia xicra e não xícara, ólio e não óleo, milhor e não melhor etc. Ou seja, as palavras são registradas como eram usadas lá bem longe do centro de São Paulo, no Brás, na Lapa, etc. Outras vezes Mário inventa palavras (de-tarde) ou verbos (correcorrer, daí correcorrendo) e usa e abusa de onomatopeias (como o som de um besouro no primeiro conto) para prender a atenção do ouvinte, quer dizer, do leitor.

O volume teria menos de cem páginas se trouxesse apenas os contos, mas além deles encontramos aqui uma introdução bastante longa escrita por Aline Nogueira Marques, que estabelece a versão final dos textos, como MA queria em 1944, na segunda edição dessa coletânea. Depois deles temos o posfácio de Tatiana Longo Figueiredo, Belazarte Bem Mais Que Modernista, em seguida um prefácio inédito escrito pelo próprio Mário de Andrade e alguns documentos e fotos de capas de edições antigas etc. Enfim, os estudiosos da obra do autor do célebre Macunaíma (1928) vão encontrar aqui material interessante sobre o MA sobretudo contista. No posfácio Tatiana cita uma resenha de Plínio Barreto, do jornal O Estado de São Paulo, de 26 de maio de 1934, em que ele acentua em Belazarte a capacidade de captar a "(...) curiosa mescla de destroços humanos de várias partes que é a plebe dos nossos bairros, espécie de feijoada social em que há de tudo e para todos os paladares." A menção a este prato tipicamente brasileiro é um belo achado metafórico para descrever a literatura de MA, sem dúvida.

São sete as histórias narradas por Belazarte e os personagens de algumas delas podem reaparecer em outros contos, dando ainda mais certa unidade ao volume, não apenas seu linguajar ou temática. Todos os contos são interessantes como ficção e também como representação, retratos da vida suburbana da capital paulista nas décadas iniciais do século XX, além do registro de um típico modo de falar de então, eternizado na obra de MA. Destaco duas dessas histórias, que me pareceram as melhores, respectivamente a primeira e a sexta, O Besouro e a Rosa e Piá Não Sofre? Sofre.

O Besouro e a Rosa é uma narrativa até certo ponto erótica, em que numa noite de muito calor um inseto penetra não exatamente nas pétalas duma flor, mas em certa parte da anatomia de uma jovem chamada Rosa (que dormia de janela aberta) e nela desperta sensações e sentimentos nunca antes experimentados. Não à toa este é um dos contos mais conhecidos do modernista paulistano. Melhor ainda é Piá Não Sofre? Sofre. Piá = criança, menino; piazinho = menininho. E o menininho deste conto, Paulino, quatro anos, se não é lá nada feliz com a mãe meio desnaturada menos ainda será com a avó paterna, que o toma a seus cuidados (pois considera a nora uma puta) quando o pai dele é preso. Conto pra lá de modernista, com direito a palavras e expressões nunca dantes encontradas num texto de autores contemporâneos de MA e muito mais (não tem antropofagia, mas tem geofagia).

O segundo conto tem como título Jaburu Malandro, do terceiro ao quinto temos Caim, Caim e o Resto; Menina de Olho no Fundo; Túmulo, Túmulo, Túmulo; o sétimo, muito bom, é Nízia Figueira, sua criada. Quem ainda não leu qualquer livro de MA e tem curiosidade por sua obra poderia começar com essas histórias mais curtas (mas nem tanto) antes de embarcar nas outras aventuras do escritor. Verdade que os contos são quase todos com final infeliz, retratando a miséria comum dos subúrbios etc., mas a criatividade, a inventividade, a pesquisa e o experimentalismo de MA, quer dizer, sua modernidade (ele é um dos maiores artistas da famosa semana de arte moderna de 1922), fazem a leitura deste volume valer a pena, muito.

Lido entre 22 e 25/07/2018.
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Beatriz 14/08/2016

1. Introdução

Neste livro, encontram-se reunidos sete contos de Mário de Andrade, os quais partilham de vários pontos em comum. De cara, verifica-se que todos se iniciam com a expressão "Belazarte me contou", o que termina por ligá-los a, pelo menos, uma origem em comum. Caso se deseje saber quem é Belazarte, temos nossa curiosidade satisfeita em um dos contos (Túmulo, túmulo, túmulo), no qual Belazarte narra um acontecimento que se passou "lá em casa mesmo".
Além dessa origem em comum, os contos partilham uma mesma temática e uma ambientação geográfica. São histórias dos subúrbios, dos novos imigrantes, dos seus velhos habitantes e de uma boa dose de miséria, econômica e humana. Compartilha, ainda, uma tristeza que perpassa todo o livro, tornada evidente pela forma como muitos dos contos terminam. Em vez de sermos presenteados com o bordão dos contos de fada "E viveram felizes para sempre", Mário de Andrade nos fere com a afirmação de que certo personagem do conto "foi muito infeliz".
Será apresentado nesse trabalho cinco dos sete contos de Mário, a análise desses contos, o período histórico em que os contos foram escritos, a biografia do autor e o tema misérias na sociedade.










2. Período literário
A obra tem sua origem nas crônicas publicadas pelo autor na revista América Brasileira entre 1923 e 1924. Por se tratar de um escritor inovador rebelou-se contra a mesmice das normas vigentes à época tornando-se um importante modernista e transformador da linguagem.
Belazarte-alter ego de Mário de Andrade (1893-1945)-Tem sua origem nas Crônicas de Malazarte, publicadas pelo autor na revista América Brasileira entre 1923 e 1924.
Na década de 1920, o Brasil ingressava com dificuldades na modernidade, e São Paulo era a porta para entrada dessa modernização tardia. Industrializando-se e urbanizando-se aos poucos, em muitos aspectos a cidade-e o país-continuava amarrada à tradição rural. É esse o contexto dos contos de Belazarte, que Mário de Andrade começou a publicar na revista América Brasileira ainda nos anos 20, no período modernista.
3. Biografia
Mário Raul de Morais Andrade nasceu em São Paulo, em 1893. Um espírito inquieto animava sua impressionante atividade cultural: professor de música, grande pesquisador do folclore, colaborador de vários jornais e revistas, poeta, romancista, critico literário, critico musical, ensaísta de arte, folclore, literatura e música.
No ano de 1917, três fatos importantes: morte do pai; conclusão do curso de piano; e Há uma gota de sangue em cada poema, primeiro livro, publicado sob o pseudônimo de Mário Sobral. Nessa altura, Mário já adquiria fama de erudito. A participação na Semana, à publicação de Paulicéia desvairada e a nomeação como professor catedrático do. Conservatório Dramático e Musical de São Paulo consolidavam o prestigio de Mário de Andrade. A cidade de São Paulo, sua mais profunda paixão, constitui tema frequente de sua obra. Por volta de 1934, Mário foi chefe do Departamento de Cultura de São Paulo. Quatro anos depois, motivos políticos provocaram seu afastamento e a mudança para o Rio, onde exerceu o cargo de professor da Universidade do Distrito Federal. Lá ficou pouco tempo. A ligação com São Paulo era muito forte. A Segunda Guerra Mundial afetou profundamente o ânimo do poeta. Parece que essa foi uma fase de grande angústia existencial. Na tarde de 25 de fevereiro de 45, faleceu Mário de Andrade.
4. Resumo
O besouro e a Rosa
O conto que abre o livro é “O besouro e a Rosa”, foi o “primeiro conto de Belazarte”, escrito em 1923.
A narrativa mistura elementos “realistas”, “naturalistas” e grotescos, o narrador nos conta a história de Rosa, uma moça de 18 anos, que morava com duas tias desde os sete, após sua mãe ter morrido ou ter abandonado Rosa. Era a “cria” da casa de suas tias solteironas, “órfãs do capitão Fragoso Vale”. Vivia praticamente confinada; uma “freirinha”. Apesar disso, chega a ter um pretendente, João, o filho do padeiro da vizinhança, um dos poucos a vê-la com alguma regularidade, pois era o responsável pelas entregas matutinas de pão. Mas o possível romance entre eles nem começará, apesar de João tê-lo desejado muito.
Certa vez, Rosa deixara a janela de seu quarto aberto durante uma noite quente e, de madrugada, um besouro entrou em seu quarto e, sorrateiramente, percorreu seu corpo, provocando na jovem uma reação convulsiva, na qual se misturam repulsa e certo gozo desconhecido e proibido. Esse fato marca uma transformação radical em Rosa. A jovem sente que a intervenção do inseto roubara-lhe, de certa forma, a inocência e que, talvez, nunca viesse a se casar, o que sente como “UMA VERGONHA”. Rosa, então, muda completamente o modo de se relacionar com o mundo e com os outros. Perde, evidentemente, o caráter infantil e a passividade que a caracterizavam e se torna, subitamente, uma mulher indiferente, provocante e amarga, que acreditava não merecer para si nada além de variações de insetos cascudos. Termina por encontrar “seu besouro” ao se casar, abruptamente, com um bêbado da vizinhança, Pedro Mulatão. E o conto termina de modo seco: “Rosa foi muito infeliz”. Irônica, sarcástica e sadicamente, não havia qualquer príncipe à espera dessa pobre Borralheira.

Jaburu malandro
O segundo conto do livro, escrito em 1924, é, em certo aspecto, uma continuação de “O besouro e a Rosa”.
João o padeiro do conto “o besouro e a rosa”, gostava de Rosa, mas ela se casou com outro, Carmela, uma moça muito diferente de Rosa, era bonita, ativa, impaciente, que tinha casa própria e não trabalhava, o consolou e os dois namoraram por um tempo, mas sem muita empolgação da parte dela.
Certo dia um circo chegou à cidade e a moça ficou encantada com a aparente liberdade que eles tinham, um contorcionista “homem cobre” chamado Almeidinha, lhe chamou a atenção, e a menina agora só tinha olhos pra ele. A moça começou a desprezar João que já não entendia nada do que acontecia. Quando João descobriu sofreu, mas logo seguiu a vida, pois tinha que trabalhar.
Carmela continuava encontrando Almeidinha que um dia perguntou de João, ao que Carmela respondeu: “ele queria casar comigo, mas, porém não gosto dele, é bobo. Só com você hei de casar!”. O rapaz, seu jeito esquivo, flexível, fugiu no dia seguinte. Quando Carmela soube chorou muito, a vizinhança ria dela, e mais ninguém quis se casar com ela. Camela foi muito infeliz.
Caim, Caim e o resto
Em “Caim, Caim e o resto”, de 1924, a violência gratuita entre dois irmãos com um fim trágico: um morre estrangulado e o outro perde um dedo. A briga se desenvolve sem nenhum motivo aparente, apenas um jogo de força bruta. Mário de Andrade ironiza as convenções sociais. Aldo é absorvido de seu crime porque perdeu um dedo. O dedo perdido revelaria aos juízes a legítima defesa e insanidade temporária. A mão mutilada justificaria o fratricídio. O assassino de Aldo não teve a mesma sorte, com dez dedos foi condenado. A brutalidade de um ato é amenizada ante um pedaço de corpo comovente.
Menina de olho no fundo
A sexualidade esbarrando as convenções sociais reaparece em “Menina de olho no fundo”, de 1925. Uma bela adolescente, Dolores, apaixona-se por seu professor de violino, Carlos Gomes. Este, para fugir da tentação, relaciona-se com Serafina. A relação proibida aluna/professor segue entre desencontros e jogos de amizade que disfarça o desejo de ambos. E o que os separa? As convenções sociais e a precariedade econômica de Carlos, funcionário do Conservatório, estabelecem os limites dessa relação. Os personagens não são fortes, não levam seus sentimentos às ultimas consequências. Suas ações são oscilantes. Dolores joga com Carlos ao anunciar um noivado. Carlos Gomes, por sua vez, mostra-se mesquinho por pensar na indenização que ganharia ao sair do Conservatório após os boatos de sua relação com a aluna terem chegado aos ouvidos do diretor da escola. Ao não ter firmeza em defender seu emprego, demonstra fraqueza. Dolores, no fim, reafirma a conhecida frase: “O amor é eterno enquanto dura”. Após a separação definitiva de Carlos, imposta pelos pais, e muito choro, a adolescente fica curada da angústia e do desejo por ele em três meses. Os sentimentos mais elevados dissipam-se com o tempo.

Túmulo, túmulo, túmulo
Conto de 1926, Mario de Andrade trabalha com dois personagens socialmente opostos. Aqui, o narrador, Belazarte, também é personagem. Sua relação com seu criado Ellis é uma confusa dependência mútua. Uma relação que fica entre amizade e necessidade. De um lado, a carência afetiva de Belazarte, de outro, a dependência material de Ellis (criado brasileiro e negro) a seu patrão e protetor. O trabalho manual e doméstico, simples e humilde, destina-se ao grupo social descendente dos escravos africanos. A sociedade herdeira de um sistema escravocrata.
Por maior que seja a simpatia de Belazarte, o destino de Ellis já está dado, o máximo que poderá sonhar é em ser chofer, o que já significa uma ascensão social, mas não uma ruptura com a condição de subordinação. Belazarte não deixa de julgar Ellis, vê-lo como mole, criado ruim, ainda que de confiança. O criado, por sua vez, mantém-se na posição de subalterno: em um gesto simbólico, mistura gratidão, cordialidade e submissão beijando a mão do patrão quando este concede a permissão para casar.
Belazarte se torna padrinho do filho de seu criado. A vida vai negando-lhe os sonhos e empurrando Ellis para a miséria e doença. Há um grande abismo de distância sociocultural entre patrão/criado, as diferenças vão além das condições materiais, estão além dos gestos, nas formas em que comem e nos hábitos.
A miséria das classes subalternas insiste em permanecer presente no desenrolar da vida destes, negando-lhes o sonho. O sonho de Ellis de ser chofer não se realiza, ao contrário, a vida deste personagem sofre um retrocesso, Ellis casa cedo, sua sogra tinha uma criança de colo, indicando que tivera filhos cedo. A morte também é prematura. Dolores falece logo após o parto de seu filho. A criança a segue e pouco depois Ellis justifica o terceiro túmulo do título do conto. As fases da vida não têm a mesma duração para patrão/empregado. Para os empregados as necessidades encurtam a própria vida.

5. Análise da obra
As narrativas são introduzidas sempre pela frase "Belazarte me contou", o autor tentou, segundo ele próprio, “grafar exatamente, com o mais contraditório realismo, as inconsequências da fala popular", pesquisa de linguagem de utilizaria em Amar, verbo intransitivo (1926) e que chegaria ao ápice em Macunaíma, o herói sem nenhum caráter (1928).
O Narrador recolhe casos de periferia de São Paulo, distantes de sua própria realidade. "Tristonho e Realista", como o qualifica Mário de Andrade, narra histórias de mães e filhos, de meninas que se tornam mulheres, das comunidades de italianos recém-imigrados, a outra face da sociedade urbana brasileira, representada em Amar, verbo intransitivo pela burguesia industrial. Ao mesmo tempo em que encontramos em Belazarte as contradições da sociedade e da modernização, os contos se aproximam da angústia do homem preso em seu cotidiano sem brilho, desenraizado e muitas vezes coberto de sofrimento.
O pessimismo dos Contos de Belazarte é um traço do narrador, que ganhou uma voz tão particular que o autor quase não reconhecia os textos como seus. "Belazarte não sou eu", afirma Mário, invertendo a famosa defesa de Flaubert. "““ ““ Por isso tudo Belazarte existe e estes ‘meus’ contos ele é que os contou “““. “Mas, certamente, é uma das faces do escritor plural que disse serem trezentos e cinquenta.”
Na obra, narrador e personagem surgem como um dos debatedores nas “Crônicas de Malazarte”, como antagonista ao grande otimismo da personagem que dá título às crônicas. A construção de Malazarte, por sua vez, liga-se, entre outras coisas, a Pedro Malazartes, personagem importante das narrativas orais populares brasileiras.
Outro ponto importante é que os contos parecem o tempo todo apelar para nossa “moral ingênua”, apresentando histórias que, de modo geral, despertam imediatamente no leitor a sensação de injustiça, de situação que precisa se reparada. A pobre Rosa, vivendo sequestrada do mundo, uma “freirinha” confinada aos afazeres domésticos de sua vida de “cria da casa” das tias solteironas; o pobre João, padeirinho pobre, esforçado e “bom moço” que quer encontrar uma moça para casar e que é duas vezes preterido; os irmãos Aldo e Tino, que entram em conflito pelo amor de uma vizinha, destruindo a antiga união entre eles; as duas mulheres solitárias, Nízia Figueira e Prima Rufina, vivendo apartadas do mundo numa chácara; o professor de música do conto “Menina de olho no fundo”, que perde o emprego por capricho de uma aluna; o pobre Ellis lutando contra a miséria e tentando, por meio do esforço e do trabalho, construir uma vida para ele, sua esposa e filho; e, talvez no pior de todos os exemplos, Paulino, um menino de quatro anos que vive a miséria em várias expressões: a fome, o abandono, a falta de carinho e cuidado, a humilhação, numa série de injustiças e brutalidades já anunciada no título do conto (“Piá não sofre? Sofre.”), entre outros exemplos.
As narrativas de Mário de Andrade, encontra-se a mesma fatalidade do Conto, mas pelo avesso: ao invés de destinados à felicidade, à recompensa e ao restabelecimento da ordem e da justiça ingênuas, em Belazarte, as personagens parecem fadadas à infelicidade, ao sofrimento e à injustiça: Rosa não apenas não encontra seu príncipe como acaba casado com um “besouro”, o bêbado Pedro Mulatão; Carmela vê frustrados seus sonhos de uma vida diferente daquela que as moças de sua idade e inserção social tinham, pois o “príncipe” que a resgataria desse lodo foge de mansinho, de madrugada, quando sente que o namorico começava a ficar mais sério e comprometedor. Ou ainda, a morte não só não é abolida como é sadicamente reposta e enfatizada, como que decretando a impossibilidade de superação da miséria, tal como ocorre em “Túmulo, túmulo, túmulo”.
6. Tema
O subúrbio, a miséria, a tristeza
A modernização trouxe grandes diferenças sociais, em grandes cidades é visível à divisão social, de um lado da rua há crianças passando fome e do outro lado, executivos dentro de seus paletós bebem vinhos que poderiam várias cestas básicas para essas crianças.
A miséria em que alguns vivem não é só vista em países subdesenvolvidos, mas toda e qualquer sociedade moderna esta cheia de injustiças. O cotidiano é cheio de imagens que passam despercebidas pelo resto das pessoas, mendigos com frio deitados pelas ruas, mulheres cheias de filhos no colo, mas sem nenhum dinheiro no bolso, empregadas desperdiçando água aos litros enquanto limpam a poeira das calçadas.
As desigualdades precisam ter um fim para que a sociedade caminhe em harmonia e evolua, a única solução para que haja igualdade entre as pessoas vem através da educação, educação eleva todos os indivíduos a níveis de cidadãos, tornando-os conscientes do mundo a sua volta, só a educação pode abrir os olhos e mentes.
7. Considerações Finais

Neste trabalho estudamos o livro Os Contos de Belazarte, de Mário de Andrade, publicado em 1934. Nosso primeiro passo foi mostrar o descompasso entre o narrador e o que ele narra. Mario de Andrade tem uma escrita intelectual e muito culta, já Belazarte se caracteriza pelo seu pessimismo exacerbado, os contos se aproximam da angústia do homem preso em seu cotidiano sem brilho, desenraizado e muitas vezes coberto de sofrimento. Nesses contos Mario mostra outra face da sociedade e sua modernização.
Em Contos de Belazarte, o autor lança um olhar ácido e, ao mesmo tempo, poético, sensível e tocante sobre o cotidiano, os sentimentos e relações da pequena burguesia e das pessoas excluídas da sociedade: mulheres pobres, proletários, crianças, empregados, solteironas. Mario mostra nesses contos outra face da sociedade e sua modernização.
Por fim, deve-se prestar especial atenção à linguagem e ortografia utilizada nas histórias. Mário de Andrade faz uso de recursos da língua oral, da linguagem do povo, criando, assim, uma maior proximidade entre o leitor e os tristes personagens que permeiam suas histórias.


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Jansen 10/11/2015

Muito bom. Marco do modernismo brasileiro, são historias urbanas, coloquiais e com sotaque popular. De alguma maneira os considerei líricos apesar de serem casos que se pode considerar tristes. Normalmente pessoas simples que sofrem mal de amor ou doenças e que foram registradas pelo autor. Foi meu primeiro contato com o autor de Macunaíma, o herói sem caráter. 
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Angelo 23/06/2011

O subúrbio, a miséria, a tristeza
Neste livro, encontram-se reunidos sete contos de Mário de Andrade, os quais partilham de vários pontos em comum. De cara, verifica-se que todos se iniciam com a expressão "Belazarte me contou", o que termina por os ligar a, pelo menos, uma origem em comum. Caso se deseje saber quem é Belazarte, temos nossa curiosidade satisfeita em um dos contos (Túmulo, túmulo, túmulo), no qual Belazarte narra um acontecimento que se passou "lá em casa mesmo".

Além dessa origem em comum, os contos partilham uma mesma temática e uma ambientação geográfica. São histórias dos subúrbios, dos novos imigrantes, dos seus velhos habitantes e de uma boa dose de miséria, econômica e humana. Compartilham, ainda, uma tristeza que perpassa todo o livro, tornada evidente pela forma como muitos dos contos terminam. Em vez de sermos presenteados com o bordão dos contos de fada "E viveram felizes para sempre", Mário de Andrade nos fere com a afirmação de que certo personagem do conto "foi muito infeliz".

Por fim, deve-se prestar especial atenção à linguagem e ortografia utilizados nas histórias. Mário de Andrade faz uso de recursos da língua oral, da linguagem do povo, criando, assim, uma maior proximidade entre o leitor e os tristes personagens que permeiam suas histórias.
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Chiquinho 27/07/2009

Assim Belazarte me contou...
São contos a partir de 1923 ( O Besouro e a Rosa). A edição que li foi a sétima e fiz algumas anotações. Mário de Andrade escreveu XICRA e CHACRA ao invês de xícara e chácara. Por que? As palavras estão lá, respectivamente nas páginas 99 e 137. Percebi também que no conto Túmulo, túmulo, túmulo, o personagem que narra o conto (Belazarte) deixa bem claro tendências homossexuais, e olha que este conto é de 1926.
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Topo Gigio 18/01/2009

Piá não sofre? Sofre
Para ler com o lencinho na mão. A leitura deste conto é dolorosa. Mario de Andrade escreveu-o em 1926. A infância miserável, o abandono, os maus-tratos, a falta de perspectiva continuam tão atuais que parece que foi escrito ontem. O menino Paulino, o piá do título, nunca mais saiu do meu coração, sempre me lembrando que os Paulinos de hoje suplicam atenção, carinho e a dignidade a que todos os seres humanos deveriam ter direito.
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