Entre as mãos

Entre as mãos Juliana Leite




Resenhas - Entre as Mãos


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Itallo 10/09/2022

"Talvez você possa voltar ao livro, desta vez indo direto às aberturas de cada uma das três partes, relendo as primeiras linhas e notando algo que pode ter passado despercebido."
Foi uma leitura densa, precisei dosar cada momento de leitura conforme os sentimentos que me causava: às vezes lia dezenas de páginas, às vezes lia duas ou três e me sentia muito impactado. Isso não significa que tenha sido cansativa. O fluxo da história é bem interessante, uma experiência singular e desafiadora em relação ao que é uma experiência de leitura. Ficava na ânsia por acessar a história através da experiência de outras personagens, entendendo seus sentimentos, dilemas, preocupações. Ao fim, fiquei com uma vontade de ler ainda mais. Muito satisfeito com a história.
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Yara 07/03/2022

Entre as mãos
Livro surpreendente, mas não muito fácil de ler à toa. Por algumas vezes você se perde quanto ao narrador, mas é uma história linda. Rede de apoio, independente do vínculo, nos ajuda a sobreviver, a reconstruir a vida, a organizar nossas possibilidades. Lindinho.
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Diogo 12/12/2021

A história é contada em retalhos, trechos alternando vozes e tempos diferentes, mas que fazem sentido e aos poucos vão costurando a história. É triste e forte. Fora do comum e nada clichê. No entanto, achei a leitura cansativa. Não gostei tanto quanto imaginava.
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@wesleisalgado 11/04/2021

Melancolia em retalhos
A primeira e principal coisa sobre a qual tenho que falar é a respeito da estrutura que a história é contada. É elegante, triste e genial.
Ela é toda contadaem retalhos, como uma costura, mudando de personagens, indo e voltando no tempo, mas se o leitor prestar atenção hora nenhuma fica perdido. O livro é divido em 3 partes.
I - A trama; com flashes do acidente de Magdalena, ficamos sabendo de seu passado, sua profissão de costureira, os revezes cotidianos enfrentados e a vida com seu interesse amor. Ele às vezes tomando a frente como narrador. Além de um pouco da história do pai da protagonista.
II - O Avesso; a vida de Magdalena pós acidente e sua recuperação cuidada pelas tias, além da adaptação a sua nova condição física e sentimental, nos mostrando como as coisas sempre seguem em frente e o mundo não para mesmo quando você se machuca fisicamente, tudo segue em frente.
III - Linhas soltas; respondem e justificam de certa forma, para quem achou confuso, a muitas passagens das duas parte anteriores através de linhas escritas soltas, GENIAL!
A escrita da Juliana Leite não tenta hora nenhuma ser cruel, mas retrata tão bem a vida de uma pessoa pobre e humilde como a Magdalena, e mostra como às vezes não há nem espaço para o sofrimento na vida dessas pessoas, tendo em vista o que vivem já diariamente. Seguir em frente é a condição que vida impõe para ela, independente se machucada emocional ou fisicamente. (ou ambos).
Já ficando de olho em livros futuros da autora!
OBS: Resenha nº41 do desafio Skoob 2021.
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Estêvão 03/04/2021

Acho que cheguei a uma conclusão sobre minhas leituras: não gosto de narrativas construídas em fragmentos, com tempos narrativos se sobrepondo, pequenas partes de texto que se unem para compor um todo. Foi assim com O pai da menina morta, de Tiago Ferro, e agora com este Entre as mãos, vencedor do prêmio Sesc de 2018 escrito por Juliana Leite.

No entanto, diferentemente da obra de Tiago, em Entre as mãos percebe-se que a estrutura tem um propósito mais bem definido. A obra conta a história de Magdalena, uma artesã que, após sofrer um acidente e ter suas mãos gravemente feridas, precisa encarar uma recuperação lenta sem fazer uso de seu principal instrumento de trabalho.

A palavra “texto” vem de “tecido”, “entrelaçamento”, “tessitura”, e Juliana Leite se aproveita muito bem dessa relação entre trama textual e as tramas dos tapetes que sua personagem fabrica para construir uma narrativa fragmentada, formada por diversas vozes e tempos diferentes. Portanto, assim como os tapetes de Magdalena, esse livro é uma colcha de retalhos, e cabe a nós leitores costurarmos essas partes, dando a elas unidade e sentido.

Além dessa estrutura interessante, as imagens a que nos remete a expressão “entre as mãos” é bastante significativa, pois se relaciona com a rede de apoio e acolhimento que Magdalena encontra em seus amigos e, principalmente, em suas tias, bem como com o fato de estar tudo nas mãos: seu sustento, sua arte, sua força. Além disso, há a inevitável relação com o ofício da escrita.

Diante disso, os sentidos se tornam mais amplos e possibilitam pensarmos sobre as mãos como instrumento de trabalho, principalmente das classes menos favorecidas, em especial as do campo ou mais rudimentares, que encontram na sua força a base de seu sustento, ao mesmo tempo que revelam sua vulnerabilidade.

Indo mais além, em um ano em que a frase “ninguém solta a mão de ninguém” se tornou um slogan, uma obra como Entre as mãos ganha outro peso, pois está nela também a ideia de união, de fortalecimento e de resistência, podendo se estender a um contexto social mais amplo, dialogando com ideias de união de classes.

No entanto, mesmo proporcionando toda essa discussão, foi difícil me conectar à personagem, pois acho que a forma fragmentária mais nos afasta do que nos liga a ela, nos deixando preocupados em como encaixar as peças, e não sentindo os acontecimentos, algo que Entre as mãos tem de mais forte, juntamente com a personagem principal.

Ainda nos pontos negativos, o fato de em momento algum termos contato com os sentimentos de Magdalena, de ouvirmos a sua voz interior durante os acontecimentos é o maior erro do livro. Pois, após uma primeira parte narrada por seu namorado, o mais perto que ficamos de entrar nos sentimentos da personagem é por meio de uma Magdalena mais velha, que, por meio da escrita em tempo futuro, se dirige à Magdalena pós-acidente.

Essa, digamos, terceira personagem, é trazida numa segunda pessoa interessante, porém, ao se dirigir a si mesma em retrospecto, se mostra mais consciente dos fatos e mais racional no modo como organiza as ideias, não nos deixando perceber como Magdalena sentiu e vivenciou os acontecimentos na época em que eles ainda estavam, literalmente, latejando em suas mãos.

Portanto, essa escolha de modo de narrar revela uma preocupação formal excessiva por parte da autora, que abre mão dessa imersão dos leitores nos sentimentos de Magdalena para mostrar seu domínio sobre a narrativa.

E mesmo que os signos estejam bem colocados e sejam repletos de camadas, nossa relação se dá, ou devia se dar, principalmente com os personagens, e essa barreira criada deixa a leitura confusa e pouco envolvente.
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jonathanmelo 08/07/2020

Um experimento que deu certo
Vencedor do Prêmio Sesc de Literatura de 2018, este é o primeiro romance de Juliana Leite. Entre as Mãos conta a história de uma jovem tecelã que, em razão de um acidente, vê-se impelida a costurar os retalhos do que lhe sobrou e a refazer-se com base em memórias. Nesse sentido, o que mais chama a atenção no texto de Juliana é o modo como ela o conduz, como quem trama com linha na agulha, utilizando-se de diferentes discursos, fluxos de consciência, de um narrador em segunda pessoa pouco usual, e o faz de maneira muito segura e consistente, feito que sem dúvida dita a excelência na condução desta história.
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Debora 11/03/2020

Recortes da memória pelas mãos
O 1o capítulo constrói o enredo. Triste. Entrecortado. Meio agoniante. O 2o começa confuso - quem está falando ali?? Mas, depois que dá pra entender, fica bom. Fica muito bom,na verdade.
A narrativa entrecortada segue o ritmo da memória, os fragmentos, os vais-e-vens. Enquanto isso, a mão é o centro. A mão tece, a mão queima, a mão escreve – na verdade, a mão fala e vive.
E, ainda que pareça estranho, este conjunto incerto dá um bom livro. Um livro que ficará no meu sentir por um tempo.
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Dani 27/08/2019

Memoria
O livro tem originalidade. A maneira como é contado o enredo imita a memória. Por vezes é possível se ver diante de um filme onde momentos são interrompidos por lapsos anárquicos de tempos passados.
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Juca Fardin 25/08/2019

Sofrível!!!!
Tentando finalizar a leitura, mas está um martírio!!!!!!
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Vinícius Rosa 02/01/2019

Entre as mãos - Juliana Leite
Se não me engano, o título previsto da obra era "Magdalena usa as mãos", como estava na lista dos finalistas, ou algo semelhante nesse sentindo que não posso dar certeza por não achar o link (talvez isso seja devaneio meu também). O que mudou em relação ao título final de interessante foi a tirada do nome da protagonista, assim, tão diretamente “escrachado”, sendo que por todo livro o nome dela fica meio que suspenso, quando ela começa a treinar a letra diz-se só que começa com "M" e pouco a pouco esse substantivo vai ficando completo, tomando forma, deixando esse trabalho para o leitor no corpo do livro, fator que gostei, que assemelha a recuperação da personagem depois do acidente.

Toda história é dividida em três partes, I. Trama, II. Avesso e III. Linhas soltas, resenhadas abaixo.

I. Trama
Nessa parte o companheiro de Magdalena descreve o acidente dela por uma ótica própria em primeira pessoal. Em muitas passagens fico bem confuso, acredito que por propósito da autora em criar um ambiente que aluda à confusão de um acidente. Essa primeira parte foi a que mais demorei para ler, tem uma mistura da história com passagens médicas em itálico e outro personagem que conversa com o companheiro. Enfim, nesse começo a Juliana mostra a condição da personagem principal desde o acidente até a alta, mesclando os tempos e as vozes. Achei confuso, diversas vezes tive que parar para entender quem estava falando e o que estava acontecendo, embora criativo.

II. Avesso
Nessa segunda parte Magdalena, a protagonista, toma a voz em segunda pessoa, algo incomum, interessante. A princípio julguei que o "você" fosse a Juliana (autora) conversando com sua personagem, mas não, vi em alguma entrevista dela que isso era a Magdalena do passado falando com a do presente. Gostei mais dessa parte que da primeira, foi mais gostoso ler essa parte, acredito que pela perspectiva agora ser contatada pela própria personagem, não por alguém a vendo de fora, e pela fluidez causada pela recuperação do incidente. Mesmo assim, ainda fiquei confuso em certas passagens. No fim dessa parte acredito que o livro já acaba e a última funciona como um bônus.

III. Linhas soltas
Como o próprio nome já diz, aqui são encontrados fragmentos de toda obra (escritos de Magdalena no hospital, no treino da letra em casa, na conversa com a tia), que funcionam para ligar partes soltas do livro. Para mim é divertido, responde algumas dúvidas deixadas, mas funcionou como um extra do material.

Acredito que em outro momento pegue o “Entre as mãos” para um releitura, já que é um livro de extrema qualidade e quero entendê-lo por completo. No geral, diversas passagens mostram uma personagem que luta muito por tudo na vida, que me identifiquei em vários sentidos (como pegar o ônibus, visitar a feira, dividir um ventilador) e a escrita da Juliana é incrível, inovadora, experimental (em vários sentidos), gostosa de ler, a obra mostra seu trabalho árduo e comprometido. O que me afetou foi o fato do livro não ser tão acessível e, creio, que um leitor pouco simpatizado com a prática teria muita dificuldade de o compreender, assim, mesmo que Magdalena seja popular, sua história não é (talvez esse não fosse objetivo da autora também e eu estou esperando algo que não era para acontecer).

Vale muito ler “Entre as mãos”, ganhador do Prêmio Sesc de Literatura, e ter sua própria opinião. Claramente é um livro forte, com um enredo e protagonista fortes, e que terá muito reconhecimento no futuro.


site: http://www.blogdaeditorarecord.com.br/2018/10/24/entre-as-maos-de-juliana-leite/
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@retratodaleitora 13/12/2018

Intenso e encantador
Entre as Mãos é o romance de estréia da escritora carioca Juliana Leite, vencedor do Prêmio Sesc de Literatura de 2018. Esse é um livro de narrativa não linear, formado como que por retalhos; uma colcha intrincada, feita a mão, formada por fragmentos de memória, lembranças, nem sempre confiáveis.

Aqui conhecemos a personagem Magdalena através de fragmentos de memória. Magdalena é uma tecelã que vende tapetes na feira, de vida simples; indo trabalhar, sofre um acidente no trânsito e tem o corpo dilacerado. Sua mão queima, seu útero é retirado, suas pernas e braços custam a funcionar, sua fala é prejudicada e também seu trabalho, o de tecer linhas e mais linhas com as mãos na construção de lindos tapetes... Agora, ela volta a morar com as três tias que a criaram para se recuperar do acidente. As quatro dividem um apartamento pequeno, sobrevivendo com pouco, mas com todo cuidado que uma pode dar a outra.


"Está aí algo que ainda tenho de você em mim: a habilidade de tomar as linhas soltas, as partes inexplicadas que sempre existem, dando a elas um encaixe, um lugar possível e modesto no conjunto de uma trama." p. 133


Essa foi uma trama que me surpreendeu bastante, tanto pela narrativa mais intrincada quando pela história em si e seus personagens. Foi uma leitura que me deu um nó na cabeça, e até agora estou tentando entender de fato o que aconteceu.

Não foi uma leitura das mais fáceis; fiz ela quase toda com a testa franzida, a cara de quem se esforça para não deixar escapar o fio que une os pedaços da trama. Mas isso só deixou a leitura mais interessante, imprevisível. A autora podia seguir pelas mais diversas direções, ela escreveu de forma a ter essa liberdade, a liberdade pra mudar a história, os personagens, a forma narrativa. Foi bem intenso. A escrita da Juliana é muito bonita, forte, e me encantou desde a primeira página.


"Você planejava as entradas dos parágrafos, a numeração dos capítulos, cuidando para que as cortinas e as cenas das cortinas, os corpos e as cenas dos corpos os lábios e os lábios em movimento para que tudo funcionasse. Você achou aquilo parecido com fazer tapetes. Tramar e escrever, coisas que se fazem com as mãos." p. 149


Certamente uma leitura que recomendo, e espero ter a oportunidade de continuar acompanhando e prestigiando o incrível trabalho da Juliana :)

site: https://umaleitoravoraz.blogspot.com/2018/12/resenha-entre-as-maos-de-juliana-leite.html
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alineaimee 08/11/2018

Tramas de Resistência
Vencedor da edição de 2018 do Prêmio Sesc de Literatura, na categoria Romance, e publicado pela editora Record, "Entre as Mãos" é uma estreia ambiciosa da escritora petropolitana Juliana Leite. Composto através de uma complexa trama de recursos narrativos - discurso direto, discurso indireto livre, fluxo de consciência, saltos temporais - o romance acompanha diferentes momentos da vida da tecelã Magdalena, que tem de reaprender a lidar com o próprio corpo e a executar as tarefas cotidianas após um grave acidente que lhe deixa sequelas e cicatrizes.

A metáfora texto/tecido não é nova, mas é explorada com muita eficiência por Juliana, que busca evidenciar o manejo das unidades, fio e sentido, num constante teste de resistência, harmonia e viabilidade da trama/história produzida. Aquilo que não cabe mais, que não funciona, pode ser desfeito, descosido para ser recosturado em novas possibilidades. O livro é dividido em três partes - Trama, Avesso e Linhas Soltas - que ressignificam uma à outra - a próxima sempre revelando o processo da anterior, afrouxando a trama para nos revelar os fios, as unidades e seus caminhos.

Esforço, trabalho, pobreza, violência e loucura são as linhas mestras do enredo de Magdalena, que se esforça em resistir através do remendo das faltas, da costura dos cortes, do estofo dos silêncios. Alienada de parte de sua história familiar e vítima de abusos e abandonos, é com a lógica da costura, sua arte, que ela busca resistir ao absurdo e sobreviver. Ela não tem escolha a não ser rememorar passado e versões dele a fim de lhes dar, ela mesma, algum sentido; e também não tem saída a não ser encarar os medos do trauma - atravessar a avenida ameaçadora, encarar o ônibus lotado com o corpo frágil, retomar o trabalho com uma mão diferente e destreinada, assumir as cordas da própria existência. E é com um olhar atento e generoso que Juliana desfia esse processo.

"Você planejava as entradas dos parágrafos, a numeração dos capítulos, cuidando para que as cortinas e as cenas das cortinas, os corpos e as cenas dos corpos os lábios e os lábios em movimento para que tudo funcionasse. Você achou aquilo parecido com fazer tapetes. Tramar e escrever, coisas que se fazem com as mãos. (P. 149)."

A urdidura das diferentes vozes, estilos e tempos que compõem e organizam o romance é precisa: os personagens são convincentes, não se confundem; a legibilidade é fluida, sustentada por uma tensão, leve e constante, que conduz bem as transições entre os três grandes momentos do livro.

Num romance que investiga a versatilidade do ser humano através dos paralelos com a versatilidade das mãos, é inevitável a ideia do manejo, e Juliana mostra que manipula com segurança as palavras. Sua abordagem dos dilemas humanos é sensível, possui alguma delicadeza. Mas o pulso é firme.
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Alexandre Kovacs / Mundo de K 07/11/2018

Juliana Leite - Entre as mãos
Editora Record - 256 Páginas - Capa de Leonardo Iaccarino sobre ilustração de Jeanie Tomanek (Paper Doll, óleo e colagem, 2009) - Lançamento: 22/10/2018.

Romance vencedor do prêmio Sesc de Literatura de 2018, "Entre as mãos" surpreende pela originalidade na construção do texto e uma segurança difícil de se encontrar em uma autora estreante. Alternando passado, presente e futuro, assim como diferentes vozes narrativas, Juliana Leite apresenta ao leitor uma sofrida protagonista chamada Magdalena, jovem tecelã que sobrevive a um grave acidente, passando por um longo período em coma no hospital e um posterior processo de reaprendizado da fala e de reconstrução do corpo, incluindo uma das mãos, severamente queimada, em uma imagem que é uma das chaves do livro: "usar as mãos para sobreviver".

Na verdade, o tema principal do romance é a sobrevivência em um sentido bem mais amplo do que a recuperação física devido aos efeitos brutais do acidente. Magdalena é um símbolo das violências cometidas contra as mulheres em nossa sociedade, agressões que podem ser diretas como o estupro ou mais subjetivas como a dor do abandono e da solidão ou o sofrimento causado por um aborto. Mesmo as dificuldades financeiras, que provocam as pequenas e repetidas humilhações do cotidiano, como entrar em um ônibus lotado, podem representar também uma violência permanente e silenciosa, da qual é preciso sobreviver também.

O romance é dividido em três partes: Trama, Avesso e Linhas soltas, que fazem com que a evolução da escrita reproduza o processo de costurar tapetes, a criação de uma trama que se forma ao entrelaçar linhas soltas de diferentes cores. Fica muito claro para o leitor esta intenção da autora ao intercalar múltiplas vozes narrativas no tempo e no espaço, até que surja gradualmente uma imagem mais nítida do que realmente aconteceu com a protagonista. No entanto, o leitor certamente vai se surpreender com o desenho final que pode desfazer o pretenso entendimento da função e destino de cada personagem no livro.

Na primeira parte, o companheiro de Magdalena acompanha os procedimentos da equipe médica no atendimento de emergência logo após o acidente. Uma descrição bastante intermitente e fragmentada dá as primeiras orientações ao leitor sobre a vida do casal antes do acidente e de como este ocorreu, mas ainda ficam muitas lacunas sem explicação. A narrativa entrecortada parece simbolizar o estado precário da protagonista e a urgência da situação que está ocorrendo, uma luta entre a vida e a morte.

"São cinco ao mesmo tempo, três de azul, dois de branco. Um monitor transmite linhas verdes, apita de vez em quando. Eles só reagem a um dos apitos, o contínuo. Se debruçam sobre ela e empurram o peito contra a cama até que o barulho do monitor volte a ser de goteira. Até agora aconteceu duas vezes. Até agora funcionou. Na última, foi possível ouvir daqui de fora um barulho seco, uma haste se partindo dentro do peito dela. Foi a costela, um deles disse, só pode ter sido. Ficaram de conferir daqui a pouco." (Pág. 13)

Na segunda parte, a voz narrativa muda do companheiro em primeira pessoa para uma Magdalena que, olhando retrospectivamente para o passado, se dirige a si mesma, agora em segunda pessoa, refazendo o caminho da reconstrução do corpo. Neste processo, a história dos seus pais e da família assume um papel muito importante na trama, particularmente a ajuda das tias em todo o tratamento, depois da alta do hospital. A partir deste ponto fica mais claro para o leitor o que realmente ocorreu antes e depois do acidente.

"Me sentei há pouco aqui com as folhas que trazem a tua letra, com os teus objetos guardados, esse conjunto: miudezas que você juntou criando uma costura. Reconheço a tua escolha por escrever a partir dos objetos — começar por aquilo que persistia real, para então compor as circunstâncias ao redor. Assim pareceu ser possível se lembrar do resto, certo?, ou no mínimo pressupor, imaginar. Não faria diferença entre uma coisa e outra, no nosso caso, desde que tivéssemos um registro. Algo em mãos." (Pág. 147)

E aparece, então, a força da escrita na reconstrução e transformação da protagonista em outra mulher, bem diferente e mais forte do que aquela de antes do acidente. A tragédia certamente nunca foi superada, mas a sobrevivência em cada pequena vitória do cotidiano leva a jovem tecelã a um caminho de superação e amadurecimento no qual as atividades manuais e o próprio ato de escrever exercem um papel decisivo de força e resistência.

"Se sentou para escrever uma mulher — um centro, uma casa, um relevo, uma mulher que pudesse ser você, mas que fosse de imediato algo mais do que isso. Algo inexato e, por isso, múltiplo. (...) Começar pelas vozes, era o que você queria. Quais delas você escolheria, como falariam?, um encontro entre elas?, trocas de palavras?, como se resolveriam sobre o que veio antes e depois do teu corpo inexplicavelmente deitado sobre o asfalto?" (Pág. 148)

Na terceira parte, como se deduz pelo título, Linhas Soltas, uma série de fragmentos isolados descrevendo os diálogos no hospital (que eram escritos devido à perda da fala) e também outras passagens, como as alterações nas rezas, um recurso muito bem explorado já na primeira parte, encerram o romance construído sobre uma estrutura que, se não chega a ser experimental, exige bastante atenção do leitor mas se revela no final uma leitura muito recompensadora e envolvente. Mais uma revelação e contribuição importante do Prêmio Sesc para a literatura brasileira contemporânea.

Juliana Leite (Petrópolis, 1983) é graduada em Comunicação Social pela UERJ e mestre em Literatura Comparada pela mesma instituição. Integra a antologia "14 novos autores brasileiros", organizada por Adriana Lisboa. Em 2018, foi selecionada para a residência artística "Publication Intensive" da revista de arte contemporânea "Triple Canopy" (NY). Vive no Rio de Janeiro. "Entre as mãos" é seu primeiro romance.
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