Marcus 19/04/2023Meu novo favquando o amor se torna um processo de colonização. dentro do corpo é como se o outro tomasse todo o seu eu, cometesse o genocídio de todo o seu povo em você, toma suas bases mais terrenas, joga corpos mortos na sua água, na sua cabeça-mar, você esquece a sua língua e não entende o porquê, esquece o seu nome e não lembra quem é, desiste de ser o que lhe foi ensinado. não é mais seus pais, seus irmãos, seus amigos, é apenas uma distância. a distância que fica naquele que é digno de ser amado. e nem sempre consegue.
quatro cartas se dividem em um tempo que está voltando para um possível início de história. o livro ?aquele que é digno de ser amado?, do escritor marroquino Abdellah Taïa, nos conta sobre Ahmed, um homem exilado na França e entendendo todos os processos de colonização em seu próprio corpo naquele lugar. da sexualização que sofre ao sentimento de ser sempre o outro, o livro perpassa por todas as subjetividades de uma pessoa que existe em um não-lugar, que é estrangeiro de uma terra em que vive. Na busca de raizes percebemos o quão forte é a primeira carta, para sua mãe; na maturidade da busca de si compreendemos as razões do personagem na segunda carta, de um ex-amante para ele; em sua destruição, no perder-se de si e no ato de coragem de voltar, a terceira carta nos apresenta o núcleo da história, esta é dele para um ex-namorado; na última, o desespero daquele que não foi amado.
o livro ecoará por mim em muito tempo, percebo alguma semelhança em ser negro, como eu, e ser um imigrante marroquino, como o personagem, como se os dois tivessem sempre essa vontade de pertencimento e saudade de uma casa que não é mais a mesma. por isso ficou aqui dentro, sussurrando, a voz lida de Ahmed,
contando coisas muito íntimas para mim.