spoiler visualizarmaripp 21/02/2024
"Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira."
Anna Karenina é uma obra, inegavelmente completa, que aborda desde questões sentimentais, até políticas e sobre agricultura, mostrando que tudo aquilo que tange o espiritual e o mundano é atemporal e inerente à sociedade. Ademais, foi um livro que me proporcionou grande surpresa, sobretudo no quesito personagens, pois, embora receba o nome de Anna Arcádievna, o livro enfoca, com maestria, nas vidas ao seu redor, como as de Kitty e de Liévin, donos da parte mais cativante de todo o livro, no meu parecer. Estes abordavam o mais fascinante dos enredos - dilemas religiosos, percepção do papel feminino na sociedade czarista, dualidades entre saúde e doença, vida conjugal, além de claro, o amor e suas penosas insalubridades e pesares, o que é, evidentemente, trabalhado também entre Anna e Vrónski -, com menção honrosa também a Aleksei Aleksándrovitch, quem me chocou pela ascensão espiritual, sendo, então, um personagem que me interessou bem mais que o esperado.
Quanto ao tema principal, este, sem hesitação, é o viés desigual e sexista da sociedade perante o adultério, fato nítido pelas repercussões dos atos de Stiepan e Anna, o que foi um paralelo doloroso de acompanhar, mas essencial e interessante da obra. O amor, em si, dos protagonistas não me comoveu tanto quanto o ódio, oriundo da paixão, o qual torna o livro um desconsolo ao mostrar o sufoco e amargura que a maior das entregas pode causar.
O desequilíbrio social da mulher, que parece estar sempre em desvantagem, a linha tênue entre amor e ódio, as hipocrisias de uma sociedade que não parece ter mudado são impressionantes e percebo, ao fim, que a vingança proposta, inicialmente, não é tido pelas mãos de Karenin, mas sim de Karenina, o que reforça a corrosão à qual as fraquezas e forças humanas podem levar.
Escrita com muita habilidade, com alguns momentos cansativos - mal de russo que adora enrolar -, entretanto com uma enorme sensibilidade e percepção das nuances humanas, seja elas físicas ou espirituais. É uma história dúbia, realista, impressionante e eterna, com personagens vastos feitos, enfim, e resumidamente, de "sombra e luz".