Ralph 25/05/2022
4,5*
tw: dor, trauma, descrição de violência, menção de suicídio;
O livro é focada na comunidade negra e eu não tenho local de fala.
Primeiramente, The Deep é uma novella, o que explica o ritmo acelerado, a prosa e a centralidade do plot.
Genial toda a premissa de Wajiru serem os filhos de escravas negras jogadas ao mar, onde de alguma forma os bebes sobrevivem na água do mar como sobrevivem no liquido amniótico no útero da mãe e adotados pelo mar, como uma segunda mãe, ganham caldas e barbatanas. Wajiru é realmente os filhos dos humanos com o mar.
Wajiru podem ser considerados intersex (?) e rola um queer aqui, mas não é tema principal, não tem desenvolvimento nesses temas.
Focado nos descendentes de negros africanos que foram escravizados, o livro toca nos seguintes assuntos: Dor geracional, reconstrução de identidade, herança cultural, identidade de gênero, queer, saúde mental, trauma, coletivismo e individualismo, espiritualidade, a necessidade de empatia, escravidão, extinção cultural, guerras…
A dor geracional de descendentes presos as injustiças sofridas por seus antepassados que ainda prevalecem até hoje, trazem dois questionamentos: esquecer ou lembrar/lutar.
Yetu quis esquecer; como historiadora, aquela que guarda toda a história e sentimentos de seu povo e também todos os traumas e verdades da crueldade do mundo. É compreensível querer esquecer tamanha dor e apenas seguir em frente.
“Sometimes it’s not the worst thing to lose everything. Sometimes it’s good,”
said Yetu, thinking that for the first time in twenty years, she could feel the
ocean now without it overwhelming her senses.
Ai também temos a questão do coletivismo vs individualismo e identidade, onde como historiadora, Yetu não consegue separar sua própria identidade da coletividade de memórias e sentimentos de seu povo, assim como os afro descendentes que carregam a luta de seus ancestrais e independente de sua identidade pessoal, sofrem preconceitos por sua cor, ambos estão atrelados ao coletivo, tanto em identidade quanto como responsabilidade.
“I know who I am now. All I knew before was who they were, who they
wanted me to be,” said Yetu. “And it was killing me. It did kill me. I wasn’t
Yetu. I was just a shell for their whims.”
Já a Oori que perdeu todo o seu povo e herança cultural, sente que a perda da identidade esta na perda de sua ancestralidade. Oori prefere lembrar.
Oori shook her head and stood up from the water. “But your whole history.
Your ancestry. That’s who you are.”
No caso da Oori, temos a questão de reconstrução de identidade cultural. Diversos descentes de escravos perderam sua ancestralidade, não tendo conhecimento de sua própria cultura e de sequer de sua terra de origem, tendo que começar do zero, assim como os ancestrais dos Wajinru fizeram.
“What is belonging?” we ask.
She says, “Where loneliness ends.”
A dor de começar do zero e o conhecimento do porque disso, fez com que os primeiros Wajiru criassem a figura do historiador, mostrando a mesma importância que se tem em lembrar e esquecer.
Não há uma conclusão, apenas ciência que cultura e ancestralidade tem grande importância, sendo ela presente ou ausente, afeta ao coletivo e ao individuo.
Yetu, por fim, apenas diz: “Forgetting was not the same as healing.”
Acho interessante também é a necessidade de empatia, como Yetu guarda todos os horrores de seu povo, ninguém consegue entende-la, eles tratam sua dor levianamente, a fazendo se isolar, mas tem um momento que sua mãe tem suas memórias e a conexão entre as duas é maravilhoso.
Como seres com intelecto e emoções estamos sempre buscando ser compreendidos ou “vistos”, há uma necessidade de conexão com outros (exceção aos psicopatas).
É impressionante o quanto um livro de 200pgs pode tocar em tantos assuntos e de maneira tão profunda.
A leitura do livro não é fácil, mas vale muito a pena, ainda mais se tiver interesse nos topícos comentados. Da pra fazer um TCC de boas com esse livro.
Vi muita gente comparando esse livro com o The giver, na minha humilde opinião, os livros se complementam. A leitura de The giver é mais simples e fluida, enquanto falta profundidade, e The Deep tem uma leitura mais difícil, mas tem tanta profundidade que vai até no titulo.