spoiler visualizarfabiocmartins 16/03/2011
Emocionante, agressivo e por horas romântico.
Link da resenha: http://wp.me/p1mCB3-om
O livro traz um universo de contos emaranhados por histórias pessoais, tendo como pano de fundo os horrores que o holocausto trouxe à sociedade, instrumento com o qual, Theodor Busbeck , renomado médico, busca, através de acontecimentos parecidos, traçar um gráfico para determinar qual grupo irá sofrer e qual será o carrasco desse sofrimento; uma ferramenta racional para determinar os sintomas da sociedade – uma observação do horror x o tempo.
A história se passa em uma pequena cidade, onde os personagens se interagem, em sua grande maioria, ao acaso, donde Theodor Busbeck, ex marido de Mylia Busbeck, é um renomado médico, no declínio de sua carreira. Já, Mylia, sua ex-mulher, apresenta traços de insanidade, afirmando ser doente desde seu primeiro encontro com, o então, médico Theodor Busbeck e devido a essa sua loucura, é internada no hospício Georg Rosenberg, sob a custódia do director Gomperz Rulrich, um senhor de inteligência mediana, que se esconde atrás de um emprego que acredita trazer-lhe posição social, mas inveja o trabalho de Theodor Busbeck.
Kaas Busbeck, filho registrado em nome de Theodor, possui problemas físicos que o impedem de ser uma criança “normal”, por se sentir menosprezado perante os outros miúdos devido a suas desvantagens físicas, estando sempre a ser observado por seu pai, que força a normalidade dele através de condutas brosseiras e violentas.
“Horas mais tarde, Theodor, depois de uma curta conversa com o avô, chamo-o.
Kaas, assustado com a cara do pai, tentou dizer uma palavra, que não se percebeu. Theodor pediu para o filho se aproximar, e quando este deu um passo, esbofeteou-o, de uma vez, com força.
E depois disse:
- O menino tem de aprender a falar correctamente.”
Já Hinnerk Obst, ex-combatente de guerra, sofre de fobias sociais derivadas do ambiente onde passou boa parte de sua vida adulta, carregando sempre consigo, uma arma que acreditava ser a garantia de paz, e por horas, ameaçava as crianças na rua, chegava até a mirar suas cabeças da janela de seu apartamento para testar a pontaria.
E são com esses quatro personagens – principais – que o romance se desenvolve, mesclando suas vidas em acontecimentos terríveis e, muitas vezes, verdadeiros. Demonstrando os problemas sociais e psicológicos, aprofundando no amor que cada um nutri por suas loucuras. Porém, não é só sobre esses questionamentos filosóficos que se faz o livro, Gonçalo M. Tavares – e aqui deixo expresso – faz com maestria o avanço e recuo na história, misturando acontecimentos passados, futuros e presentes de forma a suscitar o desejo do leitor, que por muitas vezes é surpreendido por imaginar algo que na verdade se mostra totalmente diferente.
E assim, através de microcontos que Gonçalo M. Tavares traz para nós um universo autónomo, louco, cruel e realista, que a muitos poderá chocar, mas que na verdade se trata apenas de uma visão realista e filosófica sobre a sociedade moderna, onde loucura e sanidade se misturam a fim de compor este esplêndido romance, ganhador dos prémios José Saramago 2005 e o prêmio Ler/Millenium 2004, que o fez se destacar na literatura portuguesa como um de seus grandes nomes, somando ao currículo a grande homenagem que recebeu de José Saramago, quando este disse:
“Gonçalo M. Tavares não tem o direito de escrever tão bem apenas aos 35 anos: dá vontade de lhe bater!”