Reccanello 02/04/2021Um livro digno em torno de uma vida sem valor.Tão impressionante quanto conhecer um dos homens mais aviltantes e abjetos que já pisou nesse mundo foi ver a incompetência e o desinteresse dos governos em sua caça.
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Não é que seja difícil acreditar que Mengele tenha realmente feito tudo o que lhe atribuem enquanto em Auschwitz; afinal, a história é cheia de exemplos tão ou mais horripilantes que ele. Mas, em sua grande maioria, esses exemplos são de pessoas totalmente desequilibradas, psicopatas, canibais, pessoas que, por sua excepcionalidade, mais parecem história de cinema. No caso de Mengele, então, mais que dificuldade há um incômodo, um travo amargo na garganta que vem da "banalidade" com que ele, sem nunca demonstrar o mínimo sinal de remorso, encarava seus atos (para os quais, por mais inacreditáveis que sejam, há ao menos uma testemunha da realização de cada um); que vem da proximidade de que tais atos possam ter sido praticados pelo "tio" legal e bondoso e calmo e cordato e equilibrado que conhecemos e que mora na casa ao lado e com quem já conversamos amenidades; da conivência dos amigos e dos parentes para com tal pessoa, que preferem esconder o horror por baixo de uma racionalização que, invariavelmente, leva ao clássico "ele só estava cumprindo ordens"...
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Muitíssimo bem escrito, com base em fontes mais que fidedignas, o livro nos deixa com um gosto amargo na língua, com um sentimento de apreensão e de angústia, não pelo que já aconteceu, mas por tudo que, de forma tão banal, pode acontecer novamente.