otxjunior 12/09/2020Branco Letal, de Robert GalbraithO primeiro ponto positivo de Branco Letal é poder marcar ao fim da leitura não um, mas dois livros como lido. Pois trechos de Rosmersholm de Henrik Ibsen abrem os quase setenta capítulos desta quarta aventura do detetive reformado Cormoran Strike e sua sócia recém-casada Robin Ellacott. Setenta capítulos distribuídos por mais de seiscentas páginas que alternam entre o caso policial e os relacionamentos pessoais entre as personagens. Aquele, nas palavras de J. K. Rowling (que escreve a série sob pseudônimo), desenvolve-se numa trama complexa e desafiadora, o que para mim torna tudo mais difícil de engolir mesmo; e estes, centrados nas tensões entre Strike e Robin, geradas por mal-entendidos que poderiam ter sido resolvidos se apenas os protagonistas se comunicassem. A semelhança aqui com um bom novelão não é mera coincidência, ainda quando entra em cena a fascinante e grávida Charlotte, ex do investigador.
Quase preterido mas não menos importante, o mistério mostra-se ambicioso ao abordar de maquinações políticas e luta de classes (e aqui é divertido distinguir a voz política da autora, que não é tímida nestas questões) a criação de cavalos e coleção de arte. É longo demais para um romance policial, o que é perceptível, por exemplo, quando alguém não mencionado há vinte capítulos é citado, o que explique talvez os nomes bizarros que Rowling dá aos seus personagens, como Kinvara ou Torquil! Mas que satisfaz numa solução tão sólida quanto o plano exageradamente elaborado do vilão (cuja identidade antecipei) permite. Diverte ainda ao trazer novas luzes a um velho clichê, no que se tornou talvez meu inevitável-momento-final-de-Robin-em-perigo favorito da série.
Assim como nos livros anteriores, aqui também percebo um anacronismo, por vezes charmoso e certamente inocente, nas técnicas de investigação utilizadas. Ficava esperando Robin apresentar um relatório datilografado a qualquer momento. Mas ela se transforma na irreconhecícel Superrobin com a adição de óculos sem grau e extrai confissões de desconhecidos; enquanto Strike tira teoria de cartolas... ou privadas, inexplicavelmente três banheiros são investigados ao todo.
Em suma, Branco Letal não difere da média mediana de seus antecessores (com uma leve vantagem para o segundo volume), assim como Rowling não se firma na literatura de gênero policial. O que não deve impedir a minha leitura da próxima entrada, que seguindo a série mais famosa da autora e para minha tristeza, promete ainda mais páginas. Fica a torcida para que a qualidade seja proporcional.