Luiz Pereira Júnior 06/05/2023
Como entrevistar uma constelação
Em uma mistura de vários gêneros, “Inventário das sombras”, de José Castello, foi um dos melhores (talvez seja melhor dizer “um dos mais prazerosos”) livros que já passaram em minhas mãos nos últimos tempos.
Em que pese minha paixão por livros sobre livros (mas nem sempre sou correspondido nessa paixão, pois alguns autores parecem estar mais preocupados em demonstrar sua pretensa erudição do que em falar sobre a obra e/ou o autor. É como aquelas entrevistas em que o entrevistador tece uma pergunta muito mais longa do que deveria apenas deixando alguns momentos para o seu entrevistado responder – um certo programa de um crítico literário e também autor é o exemplo fiel disso), José Castello me surpreendeu.
Ele, José Castello, repito, tomou-me pela mão e me guiou pelo relato de suas entrevistas com alguns dos nomes mais importantes das letras, do jornalismo e da arte contemporâneos. E essa constelação das letras merece ser citada: Clarice Lispector, João Antônio, Caio Fernando Abreu, Alain Robbe-Grillet, Hilda Hilst, Manoel de Barros, Nelson Rodrigues, Adolfo Bioy Casares, Raduan Nassar, Ana Cristina César, José Saramago, Dalton Trevisan, José Cardoso Pires, João Rath e Arthur Bispo do Rosário. É ou não é uma lista impressionante?
Mas não espere um longo texto de perguntas e respostas, no melhor estilo “Páginas Amarelas” de uma certa revista famosa. O autor nos conta como chegou (literalmente) aos entrevistados, escreve suas impressões sobre a pessoa física e o estado psicológico/mental dessas celebridades, como foi recebido por elas e por seus parentes, explicita seu grau de intimidade com eles, tece uma curta biografia de cada um deles, como terminou a entrevista e, em uma espécie de breve epílogo, o que aconteceu após esses encontros iluminado(re)s.
Talvez o melhor elogio a José Castello seja tornar os imortais pessoas, tornar os mitos seres humanos. Saber que Clarice, Saramago, Borges e Nelson Rodrigues, só para citar alguns, podem estar muito distantes de nós como seres literários, mas não são em nada diferentes de nós em todo o resto.
E como é bom saber que aquelas pessoas que estudamos em sala de aula, de quem lemos os livros, de quem ouvimos falar durante boa parte de nossas vidas (e, no meu caso, sendo professor de Literatura, sobre cujos frutos mentais ensinamos) e que, muitas vezes, parecem estar em pedestais aguardando os louvores e o incenso, não são nada mais do que isso: pessoas...