Alberto 26/12/2021Bela coletânea de contos que contêm muito mais do que aparentam conter.Boa coletânea que mostra Hemingway na sua especialidade: estórias curtas, aparentemente simplórias e sem movimento, que carregam um mar de emoções e nostalgia por baixo da superfície. Gasta-se umas páginas até entender "qual é a dele", num primeiro momento parece que o texto não vai a parte alguma. Lá pelo terceiro ou quarto conto o leitor já se ambientou e percebe quanta saudade, perda, desesperança e beleza vão no fundo daquelas memórias supostamente ficcionais. Os dois contos que narram uma pescaria são exemplares: parece que nada acontece, mas a paisagem, os peixes, o clima, o rio e o brejo, tudo tem uma função simbólica e está ali para explicar os sentimentos do protagonista. Os melhores contos ficam no final do volume, são os mais claramente autobiográficos e emocionais. O conjunto dos contos constitui, bem examinando, um romance da vida do autor, com os episódios compondo um painel de uma personalidade apaixonada pela vida e sem muita chance de se dar bem. O texto de Hemingway é exemplar: frases curtas, diretas e simples. Ninguém precisa dicionário para ler o livro dele. Ninguém precisa reler uma frase para entender. Não há truques nem artifícios. A escrita é tão singela e natural quanto o cenário idílico onde os personagens de Hemingway vagam meio perdidos e machucando uns aos outros por querer ou sem querer. Indico para quem quer começar a conhecer a arte do conto, Hemingway é unanimemente um dos grandes mestre do ofício. Mas requer algum esforço para captar outros sentidos ou recados além da letra fria do texto: é obra para ler procurando, e não passeando. E é para "entender com o coração", não com a razão, já que a motivação da maioria dos contos é evocar sensações e sentimentos, e não contar um causo.