Luan 13/07/2016
Surpreendente, Uma chama entre as cinzas conta uma bela história de medo e determinação
Vejam e me digam se eu me fiz entender: para um leitor, não há alegria maior do que ler um livro de forma despretensiosa e ser, da mesma maneira, surpreendido. Foi isso que aconteceu comigo, ao ler Uma chama entre as cinzas, que além de nos oferecer uma leitura prazerosa e rápida e uma escrita de qualidade, nos falou muito sobre medo e determinação. O livro da estreante Sabaa Tahir fala basicamente disso, numa história simples, mas poderosa. Não a toa vem conquistando uma legião de leitores mundo a fora. No Brasil, apesar de não ser tão conhecido, quem leu, aprovou.
Numa obra que pode, a princípio, ser facilmente confundida com uma distopia, estamos diante do Império, que tomou conta da nação e marginalizou outros povos. Agora, esses outros povos,. Como eruditos, navegantes, entre outros, vivem à sombra de seus dominadores. Exemplo disso é o fato de que eles não sabem mais ler já que o conhecimento lhes foi tirado. Mas o ponta pé inicial do livro se dá quando os marciais, o exército do Império, aparece na casa de Laia, a nossa protagonista. Lá, eles mostram toda sua impiedosa e brutal força.
Buscando prender Darin, irmão de Laia, eles não só logram exito no objetivo, como ainda destroem o pouco da vida que a protagonista tem. Sem seus avós, o irmão e a casa, ela foge, com medo, mas com um objetivo: salvar seu irmão. Para isso, ela vai buscar, onde quer que seja, a ajuda da Resistência, um grupo que não aceita pacificamente se submeter às vontade do Império. Os marciais são treinados na academia de Blackcliff. E é justamente neste cenário que vive o nosso segundo protagonista, Elias. Prestes a se formam como marcial, ele também planeja sua deserção de lá, uma vez que nunca concordou com a forma como as coisas são feitas.
Claro, tendo dois protagonistas, ambos se interligarão. Mas essa conexão de Laia e Elias será de forma natural e nada forçado, o que me deixou muito feliz. Nem dá pra dizer, de início, caso você já esteja pensando nisso, que eles vão ser um par romântico. Pelo menos, não logo de cara. Aliás, é justamente o fato de nada parecer forçado e tudo acontecer de forma natural e simples que me agradou tanto. Em Uma chama entre as cinzas, gosto de praticamente tudo. Os protagonistas, apesar de jovens, não se assemelham aos heróis de distopias, por exemplo, onde querem ser justiceiros ou derrubar uma nação. Eles lutam por algo pessoal.
As escolhas e os caminhos percorridos pelos dois protagonistas são bastante palusíveis, longe de muitos clichês nos livros de hoje, embora em um ou outro momento a história deles caia no lugar comum. Mas nada que atrapalhe. Laia acaba se tornando uma peça fundamental da história como espiã. Ela se torna protagonista da luta dela própria e de uma outra luta também. E é isso que vai fazer com que ela e Elias acabem se encontrando. Laia é medrosa, isso é fato. Mas a culpa pelo medo que ela sente a faz se tornar determinada e uma protagonista forte, mesmo sendo volúvel. Já Elias, de medroso ele não tem nada. Sobre coragem e determinação. Além de carisma. Aliás, para ambos.
Há ainda outros personagens que carregam grande personalidade. Helene, colega de Elias, a única mulher na academia Blackcliff. Izzi, a improvável amiga de Laia. Outros com menos destaque, como a cozinheira da Comandante (já já falo dela), Spiro Teluman e Keenan, também conseguem agradar o leitor. A Comandante da academia é a vilã da história. E não é qualquer vilã. É o próprio capiroto incorporado. Ela não tem pena de ninguém, e podemos dizer que Laia vai sofrer enquanto estiver servindo-a. Não é daquelas vilãs carismáticas, é daquelas que você consegue sentir ódio palpável. E ela não é má só pra justificar um vilão. É claro que há toda uma história por trás, e com certeza você vai gostar.
É possível que em algumas resenhas e comentários sobre o livro, até porque isso também é dito na contracapa do livro, algumas pessoas cheguem a compará-lo a livros como Jogos Vorazes. Desculpem, mas não tem nada a ver. E, desculpem novamente: este é muito melhor – eu achei, paciência. Talvez só digam que haja semelhança em função de haver uma competição - AHHHH AS FAMIGERADAS COMPETIÇÕES. Todo livro que se prese, hoje, tem alguma competição no meio. Eu me pergunto: por quê? Mas neste, é diferente. A disputa acontece muito mais natural do que as outras e não dita o enredo de toda a história, embora ela seja crucial para o desenrolar. São etapas de uma eliminatória. Os competidores não são simplesmente jogados em uma arena para que se matem.
Não gostei, porém, do início, que demorou algumas poucas páginas para engrenar, pois a escritora não começa narrando o pano de fundo. Nada disso, a gente só vai entender o universo ao longo da leitura. O livro começa já com fatos e ação. O que também não me agradou é que em determinado capítulo, a leitura, que é bastante ágil, ficou monótona porque a autora enfiou uma divagação romântica que não engoli. Mas superei. Esperava uma reta final mais grandiosa em alguns sentidos, algumas coisas soaram meio clichês ou para agradar uma parcela do público leitor. Mas, no geral, não me desagradou.
O outro quesito que me deixou um pouco chateado já é em relação à editora. Soube que na edição original há um mapa que ilustra o Império. E na nossa? É claro que... não tem. Que isso, Verus? Mas tirando isso, a editora fez um bom trabalho na diagramação. A capa, igual à original, é bonita. O livro é contado em primeira pessoa, intercalando capítulos narrados por Laia e por Elias. E é impossível não ficar curioso pela continuação. Embora eu esteja realmente, uma parcela de mim acredita que o próximo volume será chato, pelo menos o encerramento deixa a entender isso. Espero estar errado.
Com uma escrita de qualidade, ágil, muita ação e revelações (praticamente em todas as páginas há isso), o primeiro livro desta série e a estreia de Sabaa como escritora me deixaram eufórico. Um livro que me conquistou fácil com uma história simples e forte. A gente percebe claramente onde a autora queria chegar, ela não se perde em momento algum. Não poderia dar menos que cinco estrelas e ainda favorita, porque, sim, merece. É, sem dúvida, uma das três melhores leituras deste ano até agora. E você faça o favor de ler.