José Carlos 22/04/2019Sobre a (i)maturidadeAssim como acontece em seus outros romances (a saber: "Ferdydurke" e "Cosmos"), Gombrowicz faz de "Pornografia" uma surreal - e, no entanto, convincente - viagem pelos pensamentos dos seus protagonistas.
Para além dos fatos narrados, cujos acontecimentos tocam no absurdo e são envoltos por uma "mística esfera de realces e significados, como o brilho de uma luz sobre águas agitadas",as digressões do narrador (Witold - que dizem ser alterego do escritor) dão tom de loucura e devaneio ao período - 1943 - e ao local - Polônia sob ocupação nazista - em que se passa a narrativa.
O livro, portanto, inicia-se com uma viagem empreendida por Witold e Fryderyk da "ex-Varsóvia" ao campo, local onde se percebe uma calmaria comum ao passado, que naquele momento já não existia na Polônia, e onde aparentemente a guerra não causou seus efeitos.
Nesse local bucólico e arcaico, os nossos protagonistas conhecem Hênia e Karol, dois jovens que cresceram juntos e que seguem suas vidas como os demais, em obediência aos mais velhos.
A partir desse encontro, Witold e Fryderyk se tornam uma espécie de cupido, utilizando-se de sua suposta sapiência e autoridade para aproximar Hênia e Karol, com o intuito de satisfazerem os seus desejos, crendo que os jovens não tinham consciência da atração que causavam.
Assim, em diversos momentos, Witold interrompe o texto para dar voz às suas constante reflexões sobre juventude e maturidade.
Se de um lado, as personagens jovens sentem repulsa pela juventude e atração pela maturidade, de outro, as personagens maduras sentem indiferença, quando muito asco, pela maturidade e fascínio pela juventude.
No decorrer do romance, vai-se tornando clara a prontidão dos jovens em servir os adultos. Essa disposição em obedecer se evidencia na relação travada entre Karol e Siemian, membro da resistência, cujas ordens são plenamente acatadas pelo jovem.
Considerando o contexto histórico em que se passa a estória, essas situações revelam como os jovens daquela época, convencidos ou não por ideais românticos da guerra, serviram as suas pátrias, entregando-lhe a vida.
Para mim, esse romance soa mais como um pretexto para refletirmos sobre o que é maturidade e sobre quem, do alto de sua superioridade, afirma possuí-la. Super recomendo!