Paulinho 02/09/2023
Entre Cores e Lembranças
“A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que nem não misturam. Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa importância. De cada vivimento que eu real tive, de alegria forte ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa. Sucedido desgovernado. Assim eu acho, assim é que eu conto.”
ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. 20ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p. 138.
“Roseira, Medalha, Engenho e Outras Histórias” segue essa ideia narrativa do nosso querido Riobaldo. De maneira não linear acompanhamos o cotidianos de diferentes personagens, em diferentes tempos e lugares como parte da vida de Vaninha. Dizer isso pode soar pouco. A vida cotidiana, simples, os afazeres domésticos, o trabalho na roça, as brincadeiras de criança, os medos, os receios, as perdas, os sonhos, mas tudo isso compõe o que há de mais importante numa história: a vida.
Eu fiquei deslumbrado com essa obra, me emocionei em algumas passagens. Primeiro, porque a arte é deslumbrante, é um dos trabalhos gráficos mais bonitos, mais belos que eu já vi. O uso das cores é hipnotizantes, os quadros nos convidam à contemplação, é algo realmente único. Segundo, porque em muitos aspectos, minha vida estava retratada ali. Minha infância no interior da Bahia, o trabalho, as brincadeiras, os medos. Foi uma imersão muito profunda e muito poética.
Eu tive o prazer de conhecer o Jefferson Costa, na Flipelô de 2023, e ele me contou que esse era o trabalho da sua vida, e depois de ler eu entendi perfeitamente a sua felicidade em realizar tal feito artístico. Quando contei a ele um pouco da minha história ele me apontou uma página (pp. 15) e eu me vi ali desenhado ouvindo a avó contar histórias de assombração. Caso não tenha ficado claro eu estou tentando convencer você a ler essa HQ. Leia-a!
Quem me acompanha aqui sabe que minha HQ favorita é “Persépolis” da Marjane Satrapi com a qual me conectei de uma maneira tão íntima, a minha segunda “Watchmen” de Alan Moore e Dave Gibbons, principalmente, pela reflexões filosóficas dramatizadas na trama de forma tão impactante e “Cumbe” de Marcelo D’Salete por ter me impactado de uma maneira vertiginosa. Incluo agora entre os trabalhos de HQ que mais me tocaram “Roseira, Medalha, Engenho e Outras Histórias” de Jefferson Costa. Concluí a leitura imaginando quando poderia reler e encontrar novamente, Vaninha, Zeca Preto, Cotia e as cores.