A contradição e a ambiguidade estão presentes em cada linha da história que você está prestes a encarar nas páginas deste livro. Nada mais compreensível, uma vez que as questões relativas à sexualidade e à religião despertam tais sentimentos. Todavia, para que não fique desnorteado nem desapontado com o que vai ler, recomendo a você, leitor, recorrer à filosofia platônica, especialmente àquela conhecida parábola espeleológica, que trata da dicotomia entre o mundo imperfeito dos sentidos e o mundo verdadeiro das ideias.
A beata Vitalina, a umbandista Tereza e o pastor Ribamar, com suas certezas e inseguranças, e personalidades antagônicas (ou complementares), coabitam estes dois planos distintos. Com frequência, descem ao mundo imperfeito dos sentidos, onde a autora, no escritório, junto à irmã, lhes submete a processos de aferições e readaptações.
Em seguida, retornam aos seus nichos originários para cumprir seus imprevisíveis destinos.
Até o (anti)clímax final.
Marco Antônio Murad Neffa
Na obra Milagre em Passadouro, a novel romancista, nem por isso inabilitada para o exercício da escritura, se afirma como motivante ficcionista apta a levar o leitor até o finzinho para descobrir por conta própria o remate da trama desenvolvida por três devotos de diferentes posições comportamentais.
A atmosfera em que se processa a ação romanesca é tão fértil de situações e percalços divertidos, que se pode dizer haverem sido experenciados ante nossos olhos.
No que respeita à linguagem, é variada e múltipla: vai do popular informal ao culto padronizado. São de apreciar as expressões bem distribuídas que perpassam na narrativa, enriquecendo a contextura dramática.
Com a palavra aquele a quem se dirige o livro e se proponha avaliar.
Sobre a autora:
L úcia (Xuxu) Murad Neffa, filha mais nova de uma família tradicional libanesa em Vitória do Espírito Santo, é contadora e empresária. Nas horas de sobra, nunca deixou de se ocupar num exercício qualquer que lhe possibilitasse aprender.
Afinal, aprende-se a vida toda.
Estudando a língua portuguesa nos seus encantos, daí lhe veio a vontade de servir-se e de servi-la, a amada língua, fazendo algo por honrá-la. É então que surge a vontade de criar: de escrever um livro. O primeiro foi editado para narrar suas experiências no ramo dos negócios e que teve por nome Sete pecados empresariais (2015).
O prurido da descoberta, da revelação de que era mesmo capaz de inventar ─ não de fantasiar, mas de inventar no sentido próprio de urdir a trama ─ fê-la encorajada para enfrentar mais este desafio: o de endereçar-se no campo da literatura, dando a lume este romance de estreia: Milagre em Passadouro, onde se relata a maquinação ilícito-religiosa de três devotos que, corrompidos num objetivo comum, se lançam nas brechas da contrafação, com um plano infalível de fazer duma pacata cidade o local de turismo efervescente.
Não faltaram aos protagonistas empenho e arte no transmudarem suas práticas imorais em licitude a fim de se fazer do vício virtude.
Ficção