No rastro das províncias

No rastro das províncias Sebastião Pimentel Franco...


Compartilhe


No rastro das províncias


as epidemias do Brasil oitocentista




No rastro das províncias: as epidemias no Brasil oitocentista é uma contribuição da maior importância ao campo da história das doenças. Mais que “propiciar uma panorâmica sobre a passagem dos surtos epidêmicos no Brasil do século XIX”, os trabalhos aqui reunidos apresentam análises aprofundadas e instigantes para se pensarem desdobramentos de novas pesquisas. A participação de pesquisadores de diversos estados da federação brasileira enriquece sobremaneira a coletânea, pois nos dá a perceber que o estágio do conhecimento científico sobre as doenças, o contexto político do país e as medidas de saúde pública do Estado concorreram para o enfrentamento das epidemias, mas a concretização das ações ocorreu em cada província segundo sua realidade específica. Nesse sentido, quando se analisa a maneira como as províncias lidaram com os surtos epidêmicos, fica claro também que havia vários interesses em jogo. A instalação de instituições de saúde locais, o incremento das discussões sobre teorias médico-científicas que orientaram tanto a prática de assistência aos doentes quanto as medidas de saúde pública e a utilização de práticas de cura pela população atingida foram alguns dos resultados da forma como cada diferente província lidou com as epidemias. O fato de as ações e reações das autoridades de saúde e da população terem particularidades locais fica patente quando se observam: um Amazonas, recém-alçado à província, cuja imensidão territorial e população esparsa influenciaram na realidade sanitária e mesmo no acesso à informação sobre essa realidade; uma Bahia com epidemias de febre amarela e dengue que revelaram variados aspectos da sociedade na qual se instalaram; um Ceará assolado pelo cólera, “asquerosa enfermidade”, cuja epidemia mostrou múltiplas faces e revelou uma ação duvidosa das comissões de socorros; um Espírito Santo cujas epidemias de febre amarela e cólera foram acompanhadas por meio de seu único jornal à época e onde, em especial, a epidemia de cólera suscitou litígios entre o saber médico oficial e as práticas de curadores populares; um Goiás devastado por epidemias de varíola, morbo gálico e cólera no período colonial e imperial, cuja população, em relação à assistência médica, “era digna de dó”; um Maranhão cuja capital, São Luís, vivia sob uma significativa epidemia da “mortífera peste das bexigas”, o que

incentivou a construção de novo cemitério, distante do centro urbano; uma Minas Gerais assolada por epidemia de cólera, o que motivou reações das autoridades públicas consonantes ao “desenvolvimento econômico e à ocupação do território”; um Pará que sofria com epidemias de varíola na capital, Belém, por vários anos e onde discurso e prática para o combate da doença eram permeados por divergências e convergências; um Pernambuco com incidência altíssima da tuberculose, a qual ceifou muitas vidas; um Paraná que organizou e implementou um serviço de vacinação contra a varíola, suscitando reações contrárias da população, apesar da incidência relativa da doença no estado; um Rio de Janeiro que sofreu com as epidemias de varíola e criou leis, instituto e cargos para implementar a vacinação; um Rio Grande do Sul cuja capital, Porto Alegre, contava com uma população significativa de escravizados, sobre quem se abatiam várias epidemias tanto quanto sobre a população em geral; um São Paulo negligente com as epidemias que atingiam os escravizados e os pobres e que focou sua atenção sobre as doenças epidêmicas apenas na ocasião da chegada dos imigrantes; e um Sergipe que sofreu com a rápida difusão do cólera, resultando em alta mortalidade e crise de abastecimento, e reordenou a província para combater o problema. O campo da história das doenças é uma área consolidada na comunidade de historiadores. A produção científica recente, os dossiês publicados em periódicos conceituados, as linhas de pesquisa dos programas de pós-graduação em história, a participação sempre crescente do tema em eventos da área são importantes indicadores do espaço que a história das doenças vem alcançando e revelam um progressivo e diversificado universo de projetos e pesquisadores interessados em entender, discutir e comparar as formas como diferentes sociedades se defrontaram e se defrontam com as moléstias.

Edições (1)

ver mais
No rastro das províncias

Similares


Estatísticas

Desejam
Informações não disponíveis
Trocam
Informações não disponíveis
Avaliações 0 / 0
5
ranking 0
0%
4
ranking 0
0%
3
ranking 0
0%
2
ranking 0
0%
1
ranking 0
0%

0%

0%

Osório
cadastrou em:
02/07/2023 15:44:01
Osório
editou em:
02/07/2023 15:45:02

Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR