A poesia é a melhor forma de se falar de amor. Um amor que vai do platonismo ao canibalismo na forma de descrever seu objeto de culto; o feminino. A história da poesia brasileira que o poeta Affonso Romano de Sant’Anna fez neste livro é uma sedutora viagem pelo desejo masculino e sua projeção no corpo do ser amado. Ao sabor da estética e dos costumes de cada época, as mulheres podem ser amadas distantes, anjos de corpos imaculados ou mulatas calientes, saboreadas como mulheres-fruto ou mulheres-caça. Os poetas neoclássicos, como Tomás Antonio Gonzaga, por exemplo, mal falavam em beijos ou seios. Já no Romantismo, a culinária é mesclada ao erotismo, na pele de mestiças cor de buriti, ao mesmo tempo cozinheiras e comida. Castro Alves é a única voz dissonante, colocando-se ao lado dos oprimidos, numa metáfora baseada na mitologia grega, em que a ninfa negra encontra Pan, o violador, o signo da morte, em A cachoeira de Paulo Afonso. As mulheres, para os parnasianos, eram semelhantes às estátuas de mármore; belas, frias e inatingíveis. Cruz e Souza e Alphonsus de Guimaraens encheram o Simbolismo de magnólias e lírios, garças e anjos. E Manuel Bandeira inaugura o século XX com a união entre o sexual e o espiritual, misturando santas, como Maria Egipcíaca e Teresa, a prostitutas, estrelas e flores. Não se pode falar em mulher na poesia sem esquecer seu maior cantor, Vinícius de Moraes. Affonso Romano de Sant’Anna revela um componente edipiano na poesia de Vinícius, recheada de imagens de Grandes Mães e de filhos-amantes. O 'Canibalismo amoroso' é um texto delicioso, uma pesquisa saborosa e fundamental para quem se interessa por literatura ou mulheres.