O livro do figo

O livro do figo Lilian Sais


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O livro do figo





Pode ser que um bom livro de poemas se caracterize por trazer aos leitores uma informação nova sobre o mundo. Mas isso não é tudo, já que, em alguma medida, esse é o trabalho que os bons e as boas poetas têm feito ao longo da história. No entanto, em O livro do figo, o mais recente trabalho de Lilian Sais, percebemos que o adjetivo “bom” pode ser colocado sem grandes problemas. Isso é justificado quando a poeta toma esse lugar em comum na tradição, ao nos apresentar uma possibilidade de olhar o mundo de modos diversos, para, na mesma medida, destruir e reconstruí-lo, com ironia e gentileza.

Em uma pulsão oral entre o erotismo e a ingenuidade, os poemas que compõem esse novo trabalho da finalista do Prêmio São Paulo de Literatura parecem querer descrever certas coisas, entretanto, com um riso malicioso no canto da boca, é como se soubessem que essa tarefa não é uma brincadeira, mas sim um jogo, por isso o princípio do prazer montando cada verso. Um dos primeiros modos de se acessar o mundo, o que não por acaso reverbera em todo o livro, é pela boca. A boca encostada em coisas pequenas, em breves mordidas, para falar daquilo que é grande e não fica visível de um jeito fácil. O livro do figo é uma forma de usar a boca para, junto dela, encontrar algum reencantamento com um mundo em pedaços. Colocar para fora as palavras e, categoricamente, colocar para dentro as coisas que come. Daí o ato mundano de comer não só com a boca, mas também com as mãos, as frutas, os amantes, o jogo.

Partindo do figo como figura central e paradoxal, e nisso operando uma dupla inscrição, que pode tanto ser o fruto, o motor da vida, a comida carnuda a explodir no céu da boca, quanto o jogador português de futebol — daí reinscrevendo a mordida na ótica de uma partida —, é possível também perceber sua inscrição na lógica do feminino. Enquanto aquela que detém duas bocas, uma superior e outra inferior, a mulher sempre foi vista na cultura ocidental como portadora de uma tagarelice constitutiva e, portanto, como alguém que deve ser calado, algo que deve ter sua dupla cavidade tapada. Vem daí também os sussurros dos poemas, a imagem de Eva — que foi expulsa do Paraíso por comer a fruta — com as patas sangrando, e, mais uma vez, e sobretudo, a comida que se desenha nos versos entre o prazer e o pecado.

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