O rio das Mortes, na época desta história, era um rio respeitado e temido. Não só por motivos dos seus "donos" -os Xavante -, como pela sua própria natureza: corredor, poucas praias e selvagem. Os Xavante naquele tempo estavam no auge da intolerância pelo civilizado que rondava as suas terras. Algumas expedições haviam sido feitas no rumo da Serra do Roncador, mas mal conseguiram arranhar os seus pequenos contrafortes. Em verdade, não passavam de entradas aventureiras, sem outro propósito senão o de trazer objetos e fotos para exposições nas grandes cidades. Algumas nem mesmo tinham o concordo do Marechal Rondon. Eram áreas indígenas, vedadas por lei a qualquer natureza de invasão. A primeira tentativa de atração dos Xavante, levada a efeito pelos dois padres salesianos - Fucks e Sacilotti - , foi malograda. Os religiosos foram mortos. Tudo se passou numa alta barranca de areia, de onde os sacerdotes gesticulavam para os índios que estavam na outra margem. Os Xavante por seu lado, com gestos largos, pediam aos missionários que se afastassem, que fossem embora. Como os padres não atendessem, resolveram atravessar o rio. Uma fugaz alegria brilhou nos olhos dos catequizadores. Atravessando o rio, os índios galgaram a barranca e foram se aproximando dos ingênuos religiosos. Estes, já agora desconfiando do propósito dos índios, foram se afastando, e com os braços levantados ostentavam o crucifixo. Fucks e Sacilotti plenos de fé não fizeram gesto de defesa ante os tacapes implacáveis. Pimentel Barbosa e seus homens, na segunda tentativa, a exemplo dos missionários, foram todos massacrados. Francisco Meirelles, não fossem seus excelentes rumeiros Idalino e Ladislau, teria tido o mesmo destino com os seus doze homens. Foi nesse rio das Mortes, o rio dos Xavante, onde se passou o naufrágio.
Ficção / Humor, Comédia / Literatura Brasileira