A visão futurológica de PIRITAS SIDERAIS é uma ironia dos grandes desastres ecológicos e revoluções políticas da literatura de ficção científica tradicional. A superpopulação provocou uma constrangedora crise de abastecimento dos apreciadores de churrasco e o Brasil assume oficialmente seu caráter pagão, incorporando o candomblé até no sistema de governo. A revolução da informática é vista como inevitável, estendendo seus tentáculos e causando dependência desde as formas de indústria cultural até as tecnologias de ponta. Uma galinha inca, um orixá com tendências a garimpeiro, um gourmet médium e uma mãe-de-santo que parece ter saído das capas de uma revista de moda são os ingredientes necessários para que um satânico cientista americano, visando a sua própria sobrevivência, concretize uma antiga fábula infantil. A previsão sombria da literatura cyberpunk é satirizada com retoques barrocos.
Trecho do livro:
O guarda vira de costas para o crime e segue em direção a sua moto. Berzelius Baldwin vê nisso a brecha de um presságio de Prosérpina, a que também comeu frutos proibidos. O cientista abre sorrateiramente a porta, apóia-se no estribo e, encoberto pelo próprio movimento do carro, pega a trilha do gendarme. Ele tira de um dos bolsos de seu guarda-pó um sai e, segurando a empunhadura com firmeza, crava a arma letal na omoplata do autuador. Um desenho em sfumato surge no uniforme do estertorado. O gendarme expira um chouriço e cai sem trem de pouso no asfalto. Um de seus pulmões vira um sucrilho empapado com sangue. Exéquias. O serviço tem a precisão de um cirurgião dos Hell’s Angels. Os pingos de sangue são miolhinhos de pão que edificam a criminologia.
Fonte do "Trecho do livro":
http://www.overmundo.com.br/banco/piritas-siderais