Preparativos de viagem prossegue com a coleção das obras reunidas de Mario Quintana, que a Globo vem relançando desde 2005. A coleção conta com plano de edição e organização de Tânia Franco Carvalhal, também responsável pela cronologia e pela bibliografia. A fixação do texto é de Lúcia Rebello e Suzana Kanter, e o belo prefácio deste volume, de Edson Rosa da Silva.
Um dos charmes particulares deste volume, além de ser uma coletânea organizada pelo autor, é ser uma edição dupla: cada poema aparece também em fac-símile do manuscrito. Tratando-se do tema que se trata, isto adquire um significado especial. Pois a “viagem” de Quintana é, na maior parte dos poemas do livro, metafórica: é a grande viagem, a viagem que se dá através do tempo (quando não é, é a pequena viagem pelas ruas da cidade). Os “preparativos” para ela são, portanto, a própria vida.
Essa grande viagem temporal é então tratada, como seria de acontecer em Quintana, em diferentes tons, modos e formas, do poema curtíssimo ao mais extenso, da forma rimada ao verso livre, do tom irônico ao meditativo, da abordagem visual à emocional. E mesmo sutilmente erótica, como, por exemplo, no tão belo quanto pequeno “A adolescente”: “Arvorezinha crescendo... / crescendo... / crescendo... / Até brotarem dois pomos!”.
Mario Quintana é filho do modernismo de 22. Daí seu coloquialismo, sua variedade formal, sua ironia, sua urbanidade. Mas ele é um filho rebelde ao menos num aspecto: ao eliminar o ceticismo que marca o movimento. Quintana é um poeta que crê na poesia, que tem na palavra poética uma amiga e uma aliada. Essa aliança, ele a transmite ao seu público. Não há asperezas em Quintana. Sua suavidade, no entanto, é temperada por certa esperteza, por certa lucidez, que logra unir o suave ao profundo sem ceder ao mau-humor. Seus muitos leitores, encantados, agradecem, e o acompanham na viagem.