Mr.Sandman 13/02/2024
The dog days are over
O ser humano é uma criatura que deseja. Pensar não tira isso dela. Talvez pensar crie formas de articular esse desejo com ideias que ajudam a mantê-lo controlado. Mas essas ideias não os saciam. Não os controlam por definitivo. Claro que isso tudo é uma interpretação. Mas no fim das contas, a primeira saga de Chainsaw Man acaba sendo sobre isso.
O volume 11 encerra a parte 1 da obra de Tatsuki Fujimoto, chamada de "A Saga da Segurança Pública". Uma saga que no fim das contas é sobre ter, não ter e desejar. É uma grande brincadeira com esse trio de ideias. Uma articulação psicológica e fantasiosa sobre as dinâmicas que existem entre esses 3 aspectos. Não ter algo, desejar ter algo, ter esse algo. Não ter algo diferente, desejar esse algo diferente, ter esse algo diferente. Quem controla tudo isso? Quem gerencia essa experiência que, todos nós, como seres humanos, acabamos tendo? Como essas relações existem na nossa materialidade, no nosso mundo? Chainsaw Man brinca com isso em sua primeira parte sem sacrificar o divertimento, a ação, o humor e nem mesmo a criação de mundo. Ele faz tudo isso em virtude dessas reflexões, as vezes até por meio dessa reflexões e alegorias. Fujimoto é sagaz ao criar um mundo em que basicamente todo o conceito existente pode ser usado. Toda a ideia que tenha passado pela reflexão humana na história pode ser usada para fundamentar um personagem, uma trama, uma dinâmica. É muito inteligente e criativo. As possibilidades são inúmeras. E é muito chamativo justamente por ser esteticamente fabuloso. De forma geral, Chainsaw Man se reveste de uma capa bastante ligada aos shounen de luta, criando regras gerais para a mitologia, trazendo um trio principal, tendo arcos de porradaria empolgantes, mentores e por aí vai... mas consegue em meio a tudo isso, estabelecer reflexões que não são comuns a todo shounen de luta. Consegue criar um protagonista com um carisma totalmente torto e que foge complemente do protagonista boa praça dos battle shounen convencionais. Cria uma brutalidade muito específica e uma relação com o erotismo muito mais substancial que muitas obras da mesma demografia. Portanto, Chainsaw Man meio que transcende sua própria classificação...E talvez por isso pareça tão refrescante.
O último volume dessa saga consegue criar um final monumental cheio de ação e emoção para o arco emocional e existencial do Denji. Por mais que por vezes algumas cenas são confusas dentro do excesso de acontecimentos na ação, Fujimoto ainda consegue cobrir bem suas cenas e dar um final satisfatório e brutal para a Saga. Por mais que o final pareça otimista, também é deixada uma pulga atrás da orelha. Será que só por que a materialização do Controle se foi, que o controle em si também deixou de existir? Qual o poder das contingências articuladas por Makima para fazer Denji seu cachorrinho? Será que apenas pulamos de domador para domador? Será que o controle, assim que criado, jamais deixa de existir, mesmo que em pequenas proporções? Qual o nível da influência daqueles que exploraram nossa liberdade e brincaram com nossos desejos? Não sei... E talvez isso tudo seja pauta para a segunda parte. Entre tantas portas para o inferno, entre tantas portas para o passado, Chainsaw Man abre as portas para uma nova saga que vem por aí. Espero que seja tão maluca, emotiva e reflexiva quanto essa. Só sei que vou sentir falta...mesmo sabendo que o futuro é demais.