Tarô

Tarô Nicole Oliveira


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Tarô





Quem abrir Tarô, de Nicole Oliveira, receberá o intrigante convite de perambular pelas calçadas de um subúrbio qualquer de um país periférico. As palavras, costuradas a dedo pela autora, possuem a capacidade de transportar quem realiza tal travessia para tardes quentes, úmidas e despretensiosas do final da década de 1990. Através da companhia de três adolescentes, Vitória, Julieta e Marcela, é possível caminhar pelos quarteirões de um bairro de classe média baixa localizado na região central da capital paulista e entrar, vez ou outra, em uma casa, um bar, um salão, uma oficina, um ônibus, uma escola, uma padaria, uma igreja, um cemitério e até mesmo em um terreno baldio. Ao longo desses trajetos, se notam as alterações de suas ruas quando começam a receber a decoração antecipada de Natal, quando reúnem jovens nas calçadas em meios às férias e ao verão, quando aglomeram vizinhos em um bloco de Carnaval ou quando testemunham os preparativos para uma festa de casamento.

Através das movimentações provocadas pelos caminhos da vida e pelas cartas do tarô, quem acompanha os jogos de sorte e azar das irmãs Raz, que persistem em embaralhar noções como vontade e destino, constata que também é preciso ampliar sua leitura em direção às janelas quebradas, aos muros pichados e aos encanamentos estourados que fazem parte de seu entorno. Dessa maneira, se faz necessário farejar as trajetórias realizadas por meninas — que cheiram a chiclete, fritura, cerveja e peru queimado — através das habilidades de alguns dos animais que se apresentam nesses percursos, como uma rata, uma corva, uma tartaruguinha, um cachorro, um bode, duas cervas e alguns homens. A partir da ampliação dos sentidos, é possível reconhecer que, ano após ano, as nuvens estão ficando mais carregadas e prever que, em algum momento, o cinza precisará dar espaço a outras cores no horizonte.

Para quem já conhece a escrita de Nicole Oliveira, é uma grata surpresa identificar os aprofundamentos dos buracos que persistem em vincular gênesis e juízo final, apogeu e colapso, já presentes em Pequenas Catástrofes. Aos que ainda não tiveram oportunidade de ser conduzidos e capturados pelo modo afiado como a autora tece seus textos, esta é a ocasião para começar a se aventurar por narrativas, contos e peças de teatro nas quais o trágico se apresenta como fio condutor. Em Tarô, com olhos perfurados por agulhas, com gargantas entaladas por punhais, em meio a uma coreografia trágica que acontece enquanto o céu está prestes a desabar, o gozo de quem lê está, justamente, na busca por indagar quais forças determinam nossas existências.

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