Malgrado o cuidado que sempre se deva ter quando se trata de generalizações, é possível afirmar, com elevado grau de certeza, que a violência é um ingrediente comum a todas as comunidades humanas. O conteúdo semântico da violência é diversificado, mas a sua existência formal parece difundir-se no tempo e no espaço e atingir todas as sociedades, passadas e presentes, próximas e remotas.
Em face desse elemento, tão constante quanto perturbador, os homens articularam diferentes respostas. Uma dessas respostas é a pena estatal, que consiste na imposição, por parte de um poder centralizado, de um ato violento ao autor da violência. Essa não é a única estratégia possível, pois há comunidades humanas que não dispõem nem de Estado e nem de pena, e que organizaram outros mecanismos para gerir a questão da violência. No entanto, nas sociedades modernas ditas civilizadas, a pena estatal assumiu protagonismo absoluto.
Portanto, sendo a violência um dado necessário e a pena um dado contingente, deve-se naturalmente questionar: é legítima essa estratégia de articulação da violência? O que dá ao Estado o direito, se é que há tal direito, de impor violência aos seus cidadãos em face de atos de violência praticados por eles?
Trata-se de uma indagação profunda e complexa, imbricada nas grandes áreas do saber sobre o homem: a Filosofia, a Antropologia, a Política, a Psicologia e, naturalmente, o Direito. E, como é comum acontecer com as questões existenciais, a procura dessa resposta tende a provocar frustração e perplexidade: a enormidade da pergunta dá origem a uma infinidade de conclusões, muitas contraditórias e, não raro, parciais e acanhadas demais diante do tamanho da interrogação. Mas ainda que provavelmente jamais se vá chegar a uma resposta definitiva e inteiramente satisfatória, a questão sobre as finalidades da pena permanece no horizonte da ciência penal, obrigando-a a avançar.
Crime / Direito