Orelha livro Cinthia Kriemler
Viúvas de Sal de Cinthia Kriemler evoca trajetórias marcadas pela constância da violência concebida à existência do gênero feminino. Muito mais que narrativas explícitas e dolorosas, a autora nos oferece personagens com perfis psicológicos desenhados em corpos atravessados pela realidade omissa que nos afoga diariamente. São ritos de passagem de uma lógica patriarcal abusiva, repulsiva e degradante. Meninas silenciadas, expostas a traumas, ao abuso sexual, à exclusão social e à alienação religiosa. Mulheres “que aprenderam a conter a raiva, a revolta, as lágrimas, a piedade”.
Não se enganem, Porto do Xaréu e sua Cooperativa de Pescadoras existem, e não estão tão distantes de nossas vidas: são sombras aprisionadas no fundo de um mar escuro. Fantasmas incapazes de retornar à superfície para respirar. Ninguém escuta os seus gritos inaudíveis. Ninguém enxerga as suas mãos estendidas buscando ajuda.
A escrita de Cinthia Kriemler foge da neutralidade. Ela é política, corajosamente ativista e expõe a ferida em carne viva. Mas por favor não agreguem à obra o rótulo excludente de “destinado a um público específico”. Viúvas de Sal é leitura obrigatória e necessária para todos, principalmente para aqueles que insistem em não escutar ou enxergar a misoginia que mata e abençoa os perversos. É também uma aula sobre sororidade, essa palavra que precisa sair do dicionário e verdadeiramente ser aplicada para além dos discursos feministas.
Quanto a João Galafuz, que ele descanse em paz e que uma nova tempestade se anuncie sem naufrágios e mortes, mas sob o brilho intenso da igualdade e respeito às mulheres.
Literatura Brasileira / Romance