Coisas de Mineira 23/12/2020
No terceiro volume da série “Wayfarers”, “Os registros estelares de uma notável odisseia espacial”, Becky Chambers conseguiu me encantar ainda mais com a sua escrita e a história! Neste livro, estamos dentro da Frota do Êxodo, um conjunto de naves de humanos que tem muita história para ser contada, afinal, foram com elas que os últimos terráqueos deixaram o planeta terra em busca de refúgio no espaço. Na história, acompanhamos a trajetória de algumas pessoas a partir de um acidente que ocorreu muitos anos antes: Tessa, Isabel, Eyas, Kip, Sawyer.
Antes de mais nada, esse livro poderia sim ser lido separadamente, assim como os outros da série, mas as histórias são tão boas e tem um encaixe tão perfeito que isso é uma coisa que eu não aconselho (mas é a decisão de cada um). Principalmente porque essa história se passa durante os acontecimentos finais do primeiro livro “A longa viagem a um pequeno planeta hostil”. Uma das personagens, Tessa, é irmã de Ashby, o que faz com que ela comente sobre ele na história e diga sobre algumas coisas que aconteceram no primeiro livro. Mas não há spoilers, ela apenas passa o assunto por cima, com alguns comentários.
“(…) E pensar também era estranho. Ele podia pensar sobre o que estava pensando. Será que isso queria dizer que havia uma parte separada dele? Uma parte pensante e uma… parte pensante do pensamento?”
Ao contrário dos outros livros de Becky, esse livro não tem bem uma história, um acontecimento central. Cada um dos personagens está vivendo seus próprios dramas e dilemas. No primeiro livro temos a tripulação de Ashby indo para um planeta distante, temos um foco na história, apesar dela explorar os dilemas de cada um na tripulação. No segundo volume, vemos uma IA presa em um corpo físico e como ela e todos os personagens envolvidos lidam com isso, além dos dilemas de cada um, ainda temos uma história central.
Nesse volume não! Há um acontecimento que marca de alguma forma a vida deles (que está no prólogo), mas eles não estão rumando a nada, muitos deles nem se encontram, apesar de estarem na mesma nave. Em “Os registros estelares de uma notável odisseia espacial”, vemos mais os dilemas de cada personagem e uma busca por conhecer quem eles realmente são e o que eles realmente querem. Além disso, conhecemos também como é a vida dos humanos que vivem dentro das naves, e um pouco da história deles.
Acho que essa parte foi muito importante para a série. Apesar de já termos visto outros humanos nos livros anteriores, ainda não sabíamos exatamente como eram as coisas na Frota do Êxodo. Sabe a empatia? O respeito pela decisão dos outros? Ainda não sabemos tudo o que aconteceu para eles terem tido que sair da terra (apesar de ser bem óbvio, já que vivemos em um mundo real em que estamos acabando com a natureza, infelizmente), mas o pouco que ela traz na história é o suficiente para entender como esses humanos vivem.
“A constância era um conforto, um lembrete de que qualquer coisa desagradável pela qual você tivesse acabado de passar era apenas passageira, um piscar de olhos dentro de um esplendor vasto e lento.”
É interessante também ver a dinâmica que Chambers criou para essa sociedade que sobreviveu. Valores que tem como pilar principal o compartilhar com os outros e usar apenas o necessário. Quero deixar claro que nem tudo nesse mundo da Becky é perfeito, é por isso que acho que os livros dela são tão encantadores. Temos as perfeições e as imperfeições dos seres (não apenas os humanos), tornando a história mais próxima da nossa realidade, quando falamos de sentimentos, caráter (apesar de ser uma ficção científica).
Acho que já falei sobre isso antes, mas é muito bom reforçar. Becky escreve sobre pessoas, sejam de espécies diferentes ou não, ela fala sobre a essência delas. Acho esses livros da Becky um hino à igualdade, à um mundo melhor (apesar desse mundo ainda ter defeitos), mais tolerante e inclusivo. Ver como diversas espécies e planetas diferentes convivem e tentam lidar com as suas diferenças, sempre se tratando com respeito, é maravilhoso! Vou ressaltar aqui mais uma vez, eu não sou fã de ficção científica, sempre acho difícil ler livros desses gêneros, mas eu definitivamente, leio até a lista de compras da Becky!
“Todos nós dependemos de sistemas frágeis com um milhão de peças interligadas que podem ser facilmente danificadas e um dia falharão.”
Ela consegue falar sobre assuntos que são extremamente necessários, de uma forma incrível. Como o respeito pelos pronomes de cada um, por exemplo, a orientação sexual, além das diferenças entre as culturas e a empatia das pessoas. E tudo isso é feito com uma naturalidade e uma leveza, que o leitor não consegue estranhar nem os pronomes neutros que são ditos para algumas espécies.
Agora, já posso começar a exaltar as edições belíssimas que a dona Darkside traz para nós? Não só apenas histórias maravilhosas, mas ela consegue fazer uma diagramação encantadora em todos os livros (que são de capa dura!). Nessa série, ela tem mantido as capas da edição original, que tem zero defeitos e combina totalmente com a história. Se ela continuar mantendo as capas, já posso dizer que pelos spoilers do site da autora, o quarto livro será minha capa favorita!
Becky Chambers é filha de cientistas espaciais, e tem os pais como fontes de várias informações para as suas histórias. “Os registros estelares de uma notável odisseia espacial” foi indicado para prêmios respeitados como o “Hugo Awards 2019” e o “Locus 2019”, além de ter sido incluído na vitória do “Hugo Awards 2019” de melhor série. A série “Wayfarers” já conquistou vários fãs da ficção científica, e eu com certeza estou incluída nessa legião de fãs. O quarto volume da série, intitulado de “The galaxy, and the ground within”, tem previsão de lançamento lá fora para fevereiro de 2021 e a única coisa que posso pensar é: DARKSIDE TRAZ ESSE LIVRO LOGO PARA O BRASIL, POR FAVOR!
“Do solo, nos erguemos. De nossas naves, nós vivemos. Nas estrelas, sonhamos.”
Por: Ana Elisa Monteiro
Site: www.coisasdemineira.com/os-registros-estelares-de-uma-notavel-odisseia-espacial/