Karen Garbo 08/01/2024
Uma pintura do Monet
Graciosa, debochada, sensível e necessária. Eu comecei a leitura de Garota, mulher, outras como quem não quer nada, sem saber sobre a trama. No começo achei a ausência de pontuação um recurso meio vazio, mas conforme a leitura foi avançando entendi o propósito da autora: Garota, mulher, outras é um livro sem começo nem fim, uma mulher está sempre ligada a outra que está ligada a outra e assim por todas as eras e para sempre. Sabe aquela sensação que dá quando estamos num ambiente lotado de pessoas desconhecidas e nos perguntamos quais são as histórias daquelas pessoas, e logo nos entristecemos pois nunca saberemos de todo quem elas são? Pois Evaristo nos pega pela mão e nos mostra a vida íntima de cada uma, num átimo, como numa revelação. Ao ler as histórias de Amma, Yazz, Penelope, Shirley, Dominique, Carole, Grace, Hattie, nos sentimos empáticas a todas elas, entendemos suas motivações e medos, e mesmo que discordemos, nós entendemos. Pelo menos eu me senti assim. É uma leitura que vale muito a pena, mesmo com alguns deslizes da autora, como algumas focalizações narrativas falhas, por exemplo uma menina superprotegida que entende a relação simbólica entre bonecas e filmes de terror. O final chegou perigosamente próximo do piegas, mas acho que fez sentido no panorama geral da trama. Não sei se chegará a cânone da literatura como muitos estão alardeando, mas certamente Evaristo já se estabeleceu como uma voz única, fresca e potente, e é disso que a literatura (sempre) precisa.