Val Alves 07/12/2021
Um narrador de quatro patas
O narrador desse longo texto é um gato que não tem nome. Ele mora na casa de uma família que o aceitou, compulsoriamente, como hóspede e aos quais ele chama de "amos".
Osan é o dono da casa e 'amo' do Gato. Ele é um professor, casado com uma mulher que da qual não demostra nenhuma admiração e que sempre recebe em casa a visita de alguns amigos que compartilham com ele longas conversas, algumas acompanhadas por chás ou cervejas, mas sempre regadas de muita filosofia, mesmo as conversas mais triviais. E aqui irei destacar a presença de um personagem que me causou um misto de sentimentos: Meitei. Por vezes o achei desagradável, mas por fim acabei rindo em muitas ocasiões em que ele apareceu. E isso porque ele é um cara debochado, brincalhão e do tipo que solta algum comentário que não deveria no meio de uma conversa séria.
Imaginei, enquanto lia, que Soseki deveria ter algum gato de estimação, pois ele o descreve com o tipo de personalidade que a maioria de nós, donos de gatos, imaginamos ser-lhes peculiar: super crítico, observador, analítico e às vezes até um pouco arrogante. O gato não esconde a raiva que sente por não ter recebido um nome e o quanto acha seu amo - e demais humanos- um estúpido!
"(...) como eu dizia, os humanos são criaturas tolas e, quando com um ronronar felinamente afável me achego próximo a seus joelhos, na maior parte das vezes eles julgam de maneira errada que eu os adoro e não só me deixam agir como eu quero, como por vezes também me acariciam a cabeça."
Em um episódio, ainda nas primeiras páginas , o Gato conta de uma vez em que seu amo cisma em começar a fazer pinturas estimulado por um amigo que estava caçoando dele sem que ele percebesse. E aí surge uma informação importante: o Gato conta que o dono não usou as cores certas para pintá-lo, pois ele possuía uma "pelo com manchas cinza-claro, entremeadas de amarelo" e o dono não usou nenhuma dessas cores, nem "o amarelo nem o preto" ou "tampouco empregou o cinza ou o marrom." Por essa descrição, pude intuir que o Gato na verdade era uma fêmea, já que essa combinação não é comum em gatos machos.
A leitura foi, de uma forma geral, agradável. Há alguns períodos longos onde o gato descreve suas andanças no quintal e na casa dos vizinhos, além de algumas artes que ele apronta dentro de casa. Das conversas entre os homens dessa estória- as personagens femininas não tem uma participação relevante- alguns momentos reflexivos foram difíceis de compreender. Talvez precise ler mais obras japonesas para conseguir decifrar mais precisamente sua forma de pensar.