Monica Quintal 13/04/2024
"Sem saber, ele estreitou minha conexão com o mundo."
"Nas breves páginas deste relato profundamente humano, a autora esmiúça o estado de enamoramento absoluto que experimentou quando, já divorciada e mãe de dois filhos crescidos, viveu um relacionamento com um homem casado. Durante os meses em que se relacionou com A., toda a existência da autora foi regida por um novo signo, que ela disseca com precisão e franqueza. “Graças a ele”, afirma, “eu me aproximei do limite que me separa do outro, a ponto de às vezes imaginar que iria chegar do outro lado”. Essa proximidade do limiar, tão própria do sujeito apaixonado, assume formas variadas no relato. A primeira fronteira a ser deixada para trás é a da razão, que cede espaço ao pensamento mágico por meio do qual se manifesta a expectativa agonizante de ser correspondida. Cada evento, palavra ou pessoa ao redor só tem interesse para Ernaux na medida em que a faz pensar em A. Cada minuto longe dele é uma espera que transcorre de forma diversa do ritmo da vida real. Tema recorrente na obra da escritora, o tempo em Paixão simples não obedece à lógica ou à História. “Para mim não havia essa cronologia em nossa relação, eu só conhecia a presença ou a ausência”, eis o aspecto radical da paixão. Uma vez terminada a relação, o tempo entra em cena novamente, desta vez como índice do rastro deixado por um acontecimento marcante: “Estava sempre calculando, ‘há duas semanas, cinco semanas, ele foi embora’, e ‘no ano passado, nessa data, eu estava aqui, fazendo isso e aquilo’ […]. Pensava que era muito estreito o limiar entre essa reconstituição e uma alucinação, entre a memória e a loucura”. Verdadeira anatomia da alma apaixonada, este livro é também uma reflexão sobre o poder da escrita e um elogio ao luxo que é viver um grande amor."
Esse livro é uma experiência única. Fiquei surpresa com a potência da escrita, com a capacidade da autora de transmitir tanto em tão poucas páginas. A paixão que ela sente por A., um homem casado, que nitidamente não tem os mesmos sentimentos por ela, é arrebatadora, beira o doentio. A ponto de ela não conseguir sair, não conseguir viver, não querer trabalhar, com medo de perder um telefonema dele. A ponto de aceitar migalhas, de se perder com sua ausência. É uma leitura muito rápida, mas daquelas que te faz refletir e pensar na história por muito tempo depois de concluir. Essa história em si não foi minha favorita, mas me interessei muito pela escrita da autora, quero conhecer mais trabalhos dela!
"Não quero explicar minha paixão - o que me levaria a considerá-la um erro ou um transtorno do qual seria preciso me justificar -, só quero mostrar o que ela é."
"Eu tivera o privilégio de viver desde o começo, de modo constante e em plena consciência, aquilo que depois sempre acabamos descobrindo, imersos em estupor e angústia: que o homem que amamos é um completo estranho."
"Descobri do que podemos ser capazes, ou seja, de tudo: desejos sublimes ou mortais, falta de dignidade, crendices e condutas que eu julgava insensatas nos outros uma vez que eu própria não as havia experimentado. Sem saber, ele estreitou minha conexão com o mundo."