mariiroma 08/12/2012
Até a liberdade pode ser uma coisa ruim.
Jonathan Franzen está aí para nos mostrar que até a liberdade pode ser uma coisa ruim. Estou obviamente falando de seu livro, Liberdade, e não do conceito de liberdade em si. Eta livro chato, viu.
Geralmente eu tendo a desconfiar de tudo que é descrito como o melhor e variações, mas como é um livro publicado pela Companhia das Letras, resolvi ler; eles tendem a publicar livros bons, ou no mínimo relevantes. Esse livro não é nenhum dos dois. Para começo de conversa, o livro foi extremamente mal revisado. A Companhia geralmente faz um trabalho muito bom com seus livros, mas por algum motivo esse foi uma excessão. Cheio de erros de gramática, ortografia, tradução, revisão, enfim, meu dinheiro não foi bem gasto, não. Fiquei decepcionadíssima com a atenção dada ao livro.
Se os problemas da versão brasileira não fossem o suficiente, a história por si só não é lá grandes coisas. Acho que Franzen se empolgou um pouco e resolveu escrever um romance a lá Tolstoi, mas falhou miseravelmente. Os personagens são extremamente exagerados e artificiais, e as situação são ridículas. O casamento de Patty e Walter não devia ter começado, muito menos durado tanto tempo. Apesar dela falar o livro inteiro que ama o Walter, nunca parece verdade. Patty se casou com Walter porque este a tratou bem quando Richard a tratou mal. E os tais sentimentos nobres de Richard – afastar a menina que ele gostava pelo bem do melhor amigo – foram bastante out of character (ficou claro que ele não teve problema em fazer exatamente isso antes). Todo o relacionamento Joey/Connie é patético, ele ele era mesmo oh tão independente e maduro, não entendo como possa ter sido conivente com os sentimentos da garota que é exatamente o oposto disso. O Motivo Da Vida de Connie é amar o Joey, e quanto mais se escreve sobre os dois, mas ela se revela uma personagem estúpida além da conta. Ele tira vantagem dela, o que é entendível, mas depois seu arrependimento com os investimentos é babaca, sua decisão de se casar com ela mesmo fazendo tudo para se livrar dela é risível. Não me espanta que Patty não goste de Connie – eu também odeio gente sem personalidade. Aliás, pensando cá com meus botões, Connie é uma retardada aos moldes de Bella Swan, para quem a vida se resume ao namorado e sem o namorado não há vida.
Todos os membros da família Berglund possuem pelo menos um capítulo para si. As infâncias de Patty e Walter são explicadas, Joey tem todas as suas páginas com Connie. Até Richard Katz, que não faz parte da família per se, mas é amigo íntimo, tem um espaço só para ele. Mas a Jessica não. Jessica é um personagem misterioso, não sabemos o que ela pensa, praticamente não sabemos o que ela faz, ou gosta, ou muita coisa sobre sua vida. Quando criança e adolescente, ela era mais próxima o pai, e inexplicavelmente ela assume o lado da mãe depois do divórcio. Assim, sem explicação. Incrível como Franzen achou pertinente gastar todas aquelas palavras com a migração de aves, mas não se deu ao trabalho de escrever um capítulo sequer sobre a Jessica. Ela foi a personagem esquecida (e talvez até por isso a mais real: não teve linhas suficientes para ser estragada).
Também não entendi a escolha de estilo narrativo. No começo, fiquei intrigada com a visão externa dos vizinhos, achei um modo interessante de apresentar a história e os personagens. Mas a pretensa auto-biografia de Patty não me convenceu. Se o livro foi supostamente escrito por ela, então é tudo invenção da cabeça dela. Já que Patty não pode contar nada além do ponto de vista de Patty sobre os fatos ocorridos com ela ou com terceiros que tenham chegado aos seus ouvidos, não posso entender como existem passagens sobre sexo telefônico entre Joey e Connie, ou até como Patty saberia sobre Jenna. Muita coisa simplesmente não poderia ter chegado a seus ouvidos, mas de algum modo ela sabe. Se ela não sabe e inventou, então é pior ainda, pois é preciso uma mente extremamente doentia para imaginar tudo aquilo e escrever como se fosse real. Enfim, a escolha de narração foi infeliz, se fosse tudo escrito com o usual narrador observador, esse problema não existiria e o livro seria menos pior.
E a situação toda com os pássaros, puta que pariu. Olha, eu gosto de pássaros, mas existem limites e para mim um desses limites é pegar um livro de ficção que fique falando sobre a migração sazonal dos pássaros. Não quero saber, o Richard não queria saber, nem o Walter queria saber tanto assim; para ele os pássaros eram uma desculpa para discutir o que realmente importa, a superpopulação. Quer uma causa mais escrota que essa? O cara teve dois filhos, pensou em ter um filho com a mulher que nem sua amante era, e estava pregando contra a superpopulação! Vai se foder, cara. Sério. Por favor. Quer salvar o mundo mas ajuda a criar uma mina de carvão a céu aberto, e uma fábrica de coletes a prova de bala. Não, cara. Assim não dá. As ideias de Walter são chatíssimas, e o escritor se sente na obrigação de descreve-las várias vezes para o leitor. Pode parar, cara, eu juro que pode. O mundo não precisa de mais chatos se sentindo superior a tudo e todos porque se importam com um passarinho. Não precisamos de mais um moralista que diz uma coisa e faz outra. Abaixo aos Walter do mundo!
Abaixo a esse livro! Chato, pedante, pretensioso, moralista, e, francamente, ruim. Um livro que promete muito e não entrega nada; não é um grande drama familiar, não inova no estilo, não possui a suposta observação inteligentíssima sobre a contemporaneidade dos Estados Unidos (porque o resto do mundo, né, nem se fala). No fim das contas, Jonathan Franzen foi uma decepção imensa, o que me entristece um pouco, os livros dele até tem bons títulos, mas, se foi parar para pensar, até Paulo Coelho tem bons títulos. E foi também uma decepção com a Companhia das Letras, publicando um livro com qualidade editorial bem abaixo de seu potencial.
Não recomendado. Nem um pouco recomendado.
ps: e ainda tem o final feliz para fechar com chave de alguma coisa que não de ouro.
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