Stefânea 25/08/2019
Não romantizem!
"Porém, para os velhotes que pagavam pelas jovens, o fato de poder deitar-se ao lado de uma garota como aquela equivalia, sem dúvida, à felicidade de se encontrar no paraíso."
Nobel de 1968, consagrou Kawabata como um dos maiores representantes da literatura japonesa do século XX. Narrada em terceira pessoa, a obra fala de Eguchi, um homem idoso de 67 anos, que por sugestão de um amigo, também idoso, decide visitar essa casa que nada mais é do que um bordel. Um meio diferente, já que as moças que lá trabalham estão sempre dormindo sob efeito de um fortíssimo sonífero.
"Já que a menina não acordava, o cliente idoso não precisava envergonhar-se do complexo de senilidade, e ganhava permissão de perseguir livremente suas fantasias e mergulhar em recordações."
A casa tem duas regras: Não tentar acordar a menina e não fazer sexo (regra fácil de cumprir, já que é uma casa para idosos). Eguchi cumpre as regras, mas isso não torna a obra menos pesada. O livro é curto; ele vai ao estabelecimento quatro vezes durante esse período. A cada vez é uma menina diferente, sempre bem nova e pelada. Ele pode fazer o que quiser com o corpo, contanto que não o machuque.
O foco da obra não está nas garotas, e sim totalmente em Eguchi, nas suas memórias e dores do envelhecimento. Cada garota adormecida trás a ele lembranças de fatos e mulheres que passaram pela sua vida. Kawabata é quase poético na sua escrita, e prende o leitor totalmente. Não consegui desgrudar os olhos, contudo é até estranho pensar que um livro tão problemático tenha ganhado um Nobel. A objetificação da mulher é clara, a menina é como uma boneca inflável viva e só serve, na narrativa, para evocar no Eguchi as sensações. Gostei da escrita, não nego. Me fez questionar até que ponto algo doentio pode nos driblar se estiver com as palavras certas... Recomendo a leitura, e a não romantização dela.
"Por sua vez, eles não sabiam nada sobre as condições de existência ou a personalidade delas. Estava tudo planejado para não deixar nenhuma pista."
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