spoiler visualizarErich 13/04/2024
Li na edição do Clube de Literatura Clássica.
De modo geral, adorei a escrita do Turguêniev. Já tinha gostado no "Diário de um homem supérfluo" que li antes deste, e este novo livro reforça essa impressão minha. Recorda-me de fato o "espírito russo" tal como em Dostoiévski e Tolstoi. Gostei também da história, e senti em alguns momentos que gostaria de tê-la lido antes. Quem sabe tivesse me ajudado a melhorar minha relação tanto com meu falecido pai quanto com outras pessoas doutra geração. Ou talvez não tivesse ajudado em nada, pois talvez eu simplesmente tivesse outro entendimento da obra se o tivesse lido em outra época.
Um personagem central à obra é Bazarov, o niilista.
- É um niilista
- Niilista. Provém do latim nihil, ou seja, "nada", pelo que sei; significa que esta palavra se refere a uma pessoa que... que não reconhece nada?
- Diz antes que não respeita nada
- Que tem uma atitude crítica em relação a tudo
- Não é a mesma coisa?
- Não, não é. O niilista é uma pessoa que não se inclina perante quaisquer autoridades, que não aceita sem provas princípio nenhum, por mais respeitado que seja.
E acho que é a minha impressão sobre ele que seria diferente se eu tivesse lido a obra na adolescência. Minha opinião e respeito dele é um pouco similar à minha opinião a respeito de Nietzsche: alguém muito inteligente, que começa a seguir um bom caminho reflexivo, mas que se perde devido à sua indignação, que o turva e o impede de seguir adiante. Sinto na obra de Nietzsche (e isto é minha concepção pessoal, claro; nada aqui embasado em estudiosos do pensador) que ele odeia tanto o cristianismo e seus produtos, e respira tanto na atmosfera de estar preso nesta concepção, que fica perdido após dar o primeiro passo. Uma vez que o deus cristão é superado, parece-me que o pensador acaba, pois ele somente formulava o anti.
Assim também vejo Bazarov, o niilista. Ele se coloca contra tudo, como se devesse duvidar de qualquer coisa. Mas não consegue superar seu ódio padrão à ordem "atual" das coisas e ser mais pragmático: agir em prol da mudança. O orgulho, que ele coloca como uma capa protetora, parece que o cega. E, no ato de se sentir seu próprio deus e superior a todos os mortais, mas avalia suas próprias falhas e contradições. Dizer-se um pensador que é contra qualquer ordem estabelecida e simplesmente aceitar os preconceitos comuns contra mulheres me parece no mínimo contraditório, senão hipócrita.
- Não, foi uma conversa de nada; apeteceu-lhe badalar a língua. É o senhor, nada a dizer: o que percebe ele?
- Pois, poderá ele perceber alguma coisa? - disse o segundo, e os dois, sacudindo os chapéus e puxando para baixo os cintos, começaram a raciocinar sobre os seus problemas e necessidades. Lamentavelmente, Bazárov, aquele que encolhia com desprezo os ombros e que, como se gabara na conversa com Pável Petróvitch, sabia falar com os mujiques, esse mesmo Bazárov convencido nem desconfiava que, aos olhos do mujique, não passava sempre de uma espécie de palhaço.
Porém, complemento dizendo que assim como na minha adolescência eu gostava muito das sacadas de Nietzsche e da força das suas argumentações contra as coisas, talvez eu também - naquela época - visse Bazarov como um cara maravilhoso.
- Há apenas sensações. Tudo depende delas.
- Como é isso?
- É simples. Por exemplo, eu: sou seguidor da tendência niilista por força de uma sensação. Tenho o prazer de negar, o meu cérebro é assim... e é quanto basta! Por que gosto da química? Por que gostas tu de maças? Também por força de sensações. Tudo isso é a mesma coisa. As pessoas nunca vão penetrar mais fundo do que isso.