Ícaro 12/10/2013
Cinquenta Tons de Masoquismo "do Bem" e Futilidade Literária
Primeiramente, é importante dizer: a trilogia de Cinquenta Tons iniciou como uma “FanFiction” de Crepúsculo, ou seja, a E. L. James fez um romance literário parcialmente baseado nos personagens de Crepúsculo. Entretanto, ela retirou toda a atmosfera vampírica e lupina, presente em Crepúsculo, e desenvolveu um novo enredo, mas recheado com “pipits” e “pepecas”. Portanto, sabendo que Anastasia Steele é ninguém mais do que Bella, torna-se fácil entender e situar-se na história, além de sondar características básicas do seu comportamento e modo de ver as coisas.
Bom, o primeiro volume da trilogia Cinquenta Tons, como o primeiro volume de toda trilogia, é para apresentar os personagens e a atmosfera da trama. Portanto, Anastasia Steele é uma moça de 21 anos de idade, virgem, que descreve um rapaz, no qual ela está interessada, com a mesma maturidade de uma menininha entre 11 e 15 anos de idade (são umas 100 ou 120 páginas de: “Uaí, iaí???”, até que chegue na primeira cena de intercurso sexual – sacanagem, putaria mesmo...). Já Christian Grey, é um “fodão”, ou seja, empresário, rico e sadomasoquista nas horas vagas (mas que fique claro, Christian Grey é um “masô” “do bem”, ele não faz coisas que vão muito além do que comumente faz um casal normal nos momentos mais “eufóricos” do intercurso sexual, principalmente quando este casal está no início da relação e dispõe de alguns “brinquedinhos”. A única coisa que deixa a leitura “penosa”, são os diálogos, pois Grey fala com Anastasia como se ela fosse, de fato, um “buraco”). Enfim, o primeiro volume pode ser resumido da seguinte forma: uma virgem que assina um contrato para ter intercurso sexual com um sadomasoquista e que acaba se apaixona por ele.
Se o primeiro volume (Cinquenta Tons de Cinza) trata de uma apresentação da atmosfera da história, o segundo volume (Cinquenta Tons Mais Escuros) é um livro de transição entre a “linda” história apresentada no volume anterior e o “clímax” do volume posterior (Cinquenta Tons de Liberdade). No segundo volume, história é mais bacana e tem um pouco mais suspense, pois não se resume ao “pornô vagabundo” do livro anterior. Anastasia acabou, no finalzinho do livro anterior, seu “romance” com o “(...) cavaleiro romântico” ( um pensamento de Anastasia sobre Christian Grey), e concentra-se agora em sua carreira profissional. Ela passa a trabalhar para Jack, outro pervertido, e Christian Grey percebe rapidamente que esse tal de Jack não é “boa gente”, afinal, um tarado reconhece o outro. Enfim, depois de alguns conflitos, acidentes e a aparição de uma antiga submissa de Christian, o livro termina com a revelação de um abuso sexual do passado e com Grey e Anastasia juntos.
No terceiro volume, a história pode ser resumida, basicamente, com a Anastasia usando seu orifício circular corrugado, localizado na parte inferior-lombar da região glútea, para ter intercursos sexuais com Grey... Depois do casamento, é claro.
Quando terminei de ler a trilogia de Cinquenta Tons, acho que fiz uma das maiores perguntas do século XXI: "como deixamos de ler 'O Amante de Lady Chatterley' (D.H. Lawrenc), 'Justine - Os Infortúnios da Virtude' (Marquês de Sade), 'História de O' (Pauline Réage/Anne Desclos) ou 'A Mulher de Trinta Anos' (Honoré de Balzac), para ler a trilogia de Cinquenta Tons (E.L. James)?", em outras palavras, como deixamos de ler livros que possuem um conteúdo pornográfico, congruência com a realidade, profundidade e larga crítica e social sobre a condição da sexualidade feminina na sociedade, para ler um refugo literário, que não apresenta nada mais do que verborragia pornográfica sem nenhum conteúdo intelectual ou reflexivo? Como a trilogia de Cinquenta Tons tem mercado de consumo atualmente?
Acredito que a resposta para tais questões, seja o fato do romance de E.L. James vender uma fantasia que soluciona, de modo fácil, um drama feminino universal, qual seja, a figura utópica do homem ideal; pois Christian Grey é rico, bonito, inteligente, viril, experiente e, em alguns momentos, bastante educado e, em outros, muito escroto.
Por isso, Cinquenta Tons tem mercado, por dialogar com mulheres românticas, cultas, ignorantes, críticas e assim por diante. Entretanto, como é moda as mulheres mentirem sobre os atributos masculinos que as atraem, ninguém confessa claramente o motivo de ter gostado da história de Cinquenta Tons. Todavia, é fácil identificar o que atrai verdadeiramente uma mulher, quando se observa os aspectos da criação fálica de qualquer menina de nossa época ou do passado; pois, enquanto meninos são ensinados pela sociedade que homens não devem chorar e demonstrar qualquer tipo de sensibilidade emocional, as meninas são ensinadas, pela mesma sociedade machista, que devem se relacionar com homens vitoriosos, viris e fortes, além de sugerir a liberdade de poder demonstrar publicamente sua sensibilidade, algo que para um homem deve ser impraticável. Portanto, na sociedade do século XXI, o machismo não está diminuindo, mas apenas tornando-se cada vez mais oculto e de difícil visualização, por está se escondendo atrás da figura da atual "Mulher Independente" e dos "Direitos de Liberdade Sexual", ou seja, a história continua exatamente a mesma, apenas o que mudou foram os personagens, a época e o cenário. Portanto, conhecendo bem os elementos que compõem a mentalidade de certa sociedade, é fácil desenvolver um produto que estimule o consumo dos indivíduos, como, por exemplo, a trilogia de Cinquenta Tons, que apresenta apenas a vida sexual de uma fêmea, que não é apenas submissa no sentido sexual, e de um macho, que não é dominante apenas no aspecto sexual.