1968: O Ano que Não Terminou

1968: O Ano que Não Terminou Zuenir Ventura




Resenhas - 1968


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Fabio Shiva 19/06/2018

Tempos de Violência
Neste ano de 2018, em meio a tantas turbulências e conflitos ideológicos em que vivemos, com discursos intolerantes de parte a parte, uma das frases que mais se ouve (ou se lê nas redes sociais) é: “Vá estudar!”

Resolvei seguir o conselho, mergulhando nesse livro do Zuenir Ventura, muito bem escrito e documentado. De cara já comecei a entender um pouco o esdrúxulo absurdo de ver tantas pessoas negando que sequer tenha ocorrido uma ditadura militar no Brasil. É que por aqui, como afirmou Ivan Lessa (citado no livro), “de quinze em quinze anos, esquecemos os últimos quinze anos”.

Procede. Só a amnésia total ou parcial explica tantas pessoas, hoje, clamando por uma intervenção militar e pela volta da ditadura (na verdade nunca pedem abertamente pela ditadura, o que seria indefensável sob qualquer ângulo. Por isso preferem utilizar eufemismos que pavorosamente são muito parecidos com os utilizados pelos ministros de Costa e Silva ao aprovar o famigerado AI-5, que instituiu dez anos de barbáries no país). Mas talvez possamos encontrar outros motivos para explicar um comportamento tão aberrante, que me faz querer me beliscar, para tentar acordar do pesadelo: ver tantas pessoas se expressando para pedir o fim da liberdade de expressão!

Um dos argumentos mais recorrentes dos que querem os militares no poder é o de que eles só prenderam e mataram “bandidos e comunistas” (o que na cabeça dessas pessoas é a mesma coisa). E que durante os anos da ditadura suas famílias passaram muito bem, obrigado, ninguém foi preso nem torturado, pelo contrário, por isso a ditadura foi uma coisa boa e deve voltar. E por aí vai.

A melhor resposta a esse tipo de argumento encontra-se no relato da prisão do ex-governador Carlos Lacerda, ocorrido logo após o decreto do AI-5. Se tem uma coisa que Lacerda nunca foi, é comunista. Ele foi, inclusive, uma das principais vozes a pedir a intervenção militar em 64. O que demonstra a obtusidade daqueles que pensam que, por quererem alimentar a besta-fera com o sangue dos outros, estarão livres de sua mordida. Pois então, ao ser preso de forma totalmente arbitrária, Lacerda resolveu protestar fazendo uma greve de fome, e chegou a ficar uma semana sem comer. Segue o texto de Ventura:

“O seu irmão Maurício o desestimulou com o convincente argumento de que os jornais não estavam noticiando a greve, o sol estava maravilhoso e as praias cheias de pessoas despreocupadas. Terminava com uma comparação que se tornaria famosa:
– Você vai morrer estupidamente. Você quer fazer Shakespeare na terra de Dercy Gonçalves.”

O fato de alienados desfrutarem a vida, indiferentes aos que sofrem, não justifica o sofrimento. E o mais apavorante é ter que dizer (e repetir) isso!

Se eu fosse falar tudo o que esse assunto me faz pensar, teria que escrever um livro. Por isso vou resumir o principal: algo que me confortou, e ao mesmo tempo me atemorizou, foi perceber o quanto o momento emocional do país e do mundo, em 1968, é semelhante ao que vivemos hoje, em 2018. Me confortou pela percepção de que não estamos vivendo uma aberração única no espaçotempo, mas algum tipo de ciclo recorrente da história. E me apavorou pela percepção de que 1968 deu ruim. Espero que tenhamos melhor sorte em 2018.

Por fim, existem aqueles que defendem a volta da ditadura (ou a eleição de seus mal disfarçados representantes “democráticos”) não por amnésia ou memória seletiva, mas pela apaixonada convicção de que a solução para os males do país é um coturno na cara dos “bandidos”. Pensando nessas pessoas, quero compartilhar nesta resenha a minha experiência pessoal com o glorioso Exército Brasileiro, do qual sou 2º Tenente R/2. Um dos maiores ensinamentos que tive no Exército e que trouxe para a vida foi o de que realmente o poder revela a verdadeira natureza das pessoas. Pois justamente aqueles que durante sua formação como oficiais foram os mais ineptos, os mais preguiçosos, os mais egoístas, os mais “mocorongos” e “bisonhos”, quando ganharam sua estrelinha de Aspirante se tornaram os mais cruéis e impiedosos torturadores da paz alheia. Um deles, que era um afável estudante de engenharia da UFRJ, me chocou ao narrar com deliciados detalhes a sessão de tortura a que submeteu um rapaz que ousou invadir o campo de Gericinó durante o seu turno de guarda. Tortura, aliás, era matéria ensinada (extra-oficialmente, é claro) em sala de aula, e olhe que estávamos em 1992. Ou seja, não será o coturno de heróis a esmagar a face deformada de vilões, mas apenas covardes fazendo uso de uma força bruta superior. Como sempre.

“A violência é o último refúgio do incompetente.” – Isaac Asimov

http://comunidaderesenhasliterarias.blogspot.com/2018/06/1968-o-ano-que-nao-terminou-zuenir.html


site: https://www.facebook.com/sincronicidio
Salomão N. 19/06/2018minha estante
Belíssima resenha, meu caro.


Juliana 19/06/2018minha estante
Shiva, tuas resenhas aquecem o coração!


Fabio Shiva 24/06/2018minha estante
Gratidão por essa energia boa, Juliana, fico muito feliz!


Fabio Shiva 24/06/2018minha estante
Gratidão, amigo Salomão!




Pris Monção 11/03/2019

O ano que ainda não terminou
Cresci com meu pai fazendo referências a este livro.
Comprei em 2014 mas não me encantei de cara por ele, principalmente por não entender as tiradas de humor do autor.
Após anos esquecido na estante, resolvi encará-lo como livro de estudo.Li com google do lado, procurando o perfil de cada personagem que aparecia. Comecei a entender o humor do autor e me descobri numa leitura leve mesmo com um tema tão pesado.
Encerro a leitura com a certeza de que todo brasileiro deveria ler.
Deveria ser leitura obrigatória nas escolas para que as futuras gerações entendam o quão hediondo foi esse período.
Zuenir escolheu esse título com tom profético. Estamos em 2019 e 1968 ainda não terminou.
No decorrer da histórica, redescobrimos personagens já carimbados na cena política mas sob uma nova perspectiva.
Hoje, este livro ocupa o primeiro lugar da lista dos favoritos.
Obrigada Zuenir pela excelência.

Shay 04/11/2019minha estante
Acho q vou fazer a leitura como tu fez, encarando como estudo e pesquisando mais. De repente assim eu consiga concluir, achei interessante quando comecei mas não o suficiente para continuar, obrigada pela tua resenha!!


Pris Monção 14/12/2019minha estante
Shana,

O Zuenir escreve como se fosse uma conversa entre amigos, falando de outros amigos.
Depois me conta o que achou.




iza 24/06/2011

Aquilo que eu não vivi.
É um livro muito bom, muito bom mesmo.
É uma narrativa no estilo Romance que nos lembra uma das épocas mais interessantes que o mundo passou, o ano de 68.
A época da arte engajada onde qualquer livro de Marcuse, Marx e Guevara era trocado por um programa de TV.
Sinto nostalgia daquilo que não vivi, trágico.
Mas talvez eu tenha nascido na época correta.

Enfim, para ressaltar: Muito bom.
Ana 14/09/2013minha estante
"A época da arte engajada onde qualquer livro de Marcuse, Marx e Guevara era trocado por um programa de TV." Perfeito! E ainda é assim.




Lilia Carvalho 02/02/2009

Favorito
Um dos melhores livros que já li. Simplesmente fantástico!
Um passeio pela história, pela cultura e pela ditadura militar.
Um livro leve apesar de trazer uma realidade de censura e exílios!

Muito bom!
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silastorres 05/04/2011minha estante
obrigado pelo "livro leve" =) com os outros comentários eu ja estava com medo de ser um livro forte de mais.




Laura Buu 02/12/2009

A verdade sobre o AI 5
Impressionante relato de Zuenir sobre o período mais sombrio da história brasileira. Fascinante e chocante.
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Rogério Xablau 06/01/2010

1968 - O Ano Que Não Terminou
"É muito bom o livro de Zuenir Ventura. A conversa sabida nos meios da elite jornalística era que Zu ia fazer um trabalho de carregação, com apenas dez meses de preparo. Picas. O texto é cuidadíssimo. Quem escreve sabe que aquilo que lá
está foi reescrito "n" vezes. É a melhor coisa que Zuenir já escreveu."

E com essa citação do jornalista Paulo Francis que começo o post/resenha que fala do livro 1968 - O Ano Que Não Terminou do também jornalista Zuenir Ventura.

Todos sabem que o ano de 1968 é cercado por vários fatos históricos no Brasil e no mundo, foi um ano em que muita coisa mudou, seja ideologicamente, seja politicamente e o livro de Zuenir é uma reflexão e uma recordação daquele período, com ênfase no que viveu o autor, o 1968 brasileiro.

Tudo começa em um reveillon da virada de 67 para 68 na casa do casal Luís e Heloisa Buarque de Holanda, uma festa que
reuniu boa parte dos intelectuais brasileiros daquela época, começar o ano daquela maneira já mostrava como aquele seria um ano que ficaria marcado.

Depois, cronologicamente, Zuenir vai relembrando cada momento importante do ano de 1968, situando o leitor naquele momento, com depoimentos e citações de quem viveu aquele período, como por exemplo Luís Carlos Lacerda, o Bigode, que disse:

"Você não pode imaginar o que sofria uma pessoa como eu, que era comunista,homossexual e transava droga."

Alguns episódios ocorridos no ano são essenciais para a história e para o livro, um deles é a morte do estudante Edson Luís Lima Souto, baleado no peito por um soldado da PM após um confronto no restaurante estudantil do Calabouço.

A repercussão do fato atingiu a todos naquele momento, a narrativa da missa de sétimo dia alguns capítulos adiante também é muito interessante.

Pouco tempo depois desse episódio veio outro muito importante, relatado no capítulo "E todos se sentaram", foi a famosa passeata dos cem mil, comandada pelo líder Vladimir Palmeira, o líder que fez, literalmente, todos se sentarem no meio-fio antes de começar a passeata e depois discursou coisas assim:

"A ditadura mais descarada adora leis, deixa eles fazerem leis. Façam uma, duas, três constituições, instalem e depois amordacem um, dois, três congressos. A gente deixa, pessoal. Mas, a gente sabe que não hoje, mas até o fim desta luta a gente derruba uma, duas, três constituições e faz nova lei e nova assembléia, porque esta assembléia não resolve problema de ninguém. Mas, minha gente, não pense que aplaudir e gritar "abaixo a ditadura" é uma vitória. Hoje a repressão não veio porque não pôde. E a nossa vitória é esta: ter saído na raça porque achava que tinha que sair. Mas a gente vai voltar pra casa, o estudante pra aula, operário pra fábrica, repórter pro jornal, artistas pro teatro. E é em casa, no trabalho, que a gente vai continuar a luta. Eu quero botar isso em votação: a gente vai continuar esta luta?"

Sim tudo isso é muito bonito, ficou para a história e merece muito respeito, mas aos poucos o Movimento Estudantil e as camadas comunistas, principais "combatentes" na luta contra a Ditadura foram se equivocando, rachas e desentendimentos nesses grupos também são narrados, outro episódio importante é narrado no capítulo "Que Juventude é essa?", quando Caetano Veloso, durante o III Festival Internacional da Canção escancarou e deixou claro pra juventude da plateia que muita coisa estava errada:

"Vocês tem coragem de aplaudir este ano uma música, um tipo de música, que vocês não teriam coragem de aplaudir no ano passado; são a mesma juventude que vai sempre, semre, matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem! Vocês não estão entendendo nada, nada, nada, absolutamente nada!"

Sérgio Ribeiro Miranda de Carvalho é outra personagem importante do livro, foi o homem que impediu que um diabólico plano do brigadeiro João Paulo Burnier se concretizasse.

Também é narrado um confronto entre os estudantes de direita da Mackenzie contra os estudantes de esquerda do curso de Filosofia da USP, a perseguição à peça Roda Viva, de Chico Buarque, em Porto Alegre e o fracassado XXX Congresso da UNE, num sítio em Ibiúna, São Paulo.

Este episódio em especial expõe muito da desorganização e desunião que existia dentro do Movimento Estudantil.

E depois de tudo isso, na parte final do livro Zuenir conta com muitos detalhes os dias que antecederam o decreto do AI-5, o que acabou sendo o grande fato do ano.

Como a aparente vitória do deputado Márcio Moreira Alves, na véspera do decreto do AI-5 se transformou em uma enorme derrota, o próprio Costa e Silva, então presidente do Brasil, na reunião que colocou em voto o AI-5 disse:

"Eu confesso que é com verdadeira violência aos meus princípios e idéias que adoto uma atitude como esta."

Mas mesmo assim o AI-5 se transformou em realidade e algumas de suas primeiras vítimas são lembradas no capítulo final do livro.

O livro termina, mas 1968 não, este ainda ressoa atualmente por tudo que aconteceu nele, e se tudo não aconteceu da melhor maneira possível lá, que os erros sirvam para a minha geração ou para gerações futuras como aprendizado.

Publicado originalmente no meu blog: http://unquimera.blogspot.com/
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Jubs 10/09/2010

Sensacioanal
Este livro é sensacional. Zuenir Ventura é fantástico ao relatar como foi o ano que resultou no AI-5, o pior período da Ditadura no Brasil, ele próprio como um dos protagonistas desse relato.

É impossível ler o livro e não querer se tornar um pouco mais politizado. Retrata con detalhes a história recente do nosso país. É de fácil leitura.
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Marcelo 10/12/2010

Raio X da ditadura no Brasil
Todo brasileiro que se preze deveria ler. Só assim para entender o quão hedionda foi a ditadura militar. Esse negócio de falar que os militares no Brasil foram menos agressivos que os da Argentina e os do Chile é fala de gente mal informada e que não dá valor à História. Zuenir Ventura, genial como sempre, mostra o quão foi cruel e insidiosa o chamado "Golpe dentro do Golpe", do qual originou o AI-5, suprimindo todas as liberdades individuais e as manifestações da sociedade civil. Zuenir narra isso como se escreve uma boa reportagem. Dá voz e vez a todos os lados, checa os dados com exaustão e mostra, com seu texto que nos pega da primeira a última página, que certos fatos não devem ser esquecidos jamais para que não aconteçam novamente.
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MVGiga 14/04/2011

Que juventude é essa?
A frase de Mario de Andrade que iniciou este livro-documentário é impactante devido a coerência com toda a história do Brasil. Eis a frase: "Não devemos servir de exemplo a ninguém. Mas podemos servir de lição". Lições que devemos prestar atenção, para que não possamos cair no mesmo erro.

Nas aulas de História aprendemos que o Brasil passou por um golpe militar que levou a ditadura, a partir dos meados da década de 60, e que os jovens da época protestaram contra esse poder totalitário. Zuenir Ventura estava lá e relata neste livro os bastidores e os seus principais personagens da Revolução de 1968.

Uma singela música popular nos contextualiza sobre os principais confrontos da época: PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES de Geraldo Vandré, um pequeno trecho:

"Há soldados armados, amados ou não. Quase todos perdidos de armas na mão. Nos quartéis lhes ensinam uma antiga lição: De morrer pela pátria e viver sem razão... Nas escolas, nas ruas, campos, construções, somos todos soldados armados ou não. Caminhando e cantando e seguindo a canção. Somos todos iguais braços dados ou não..."

Este livro é um bom material de estudo.
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Lila Castro 22/03/2013

Citações:
"Experimentava-se em todas as áreas, quase sempre pelo simples prazer da descoberta. Quando se pergunta a Caetano Velos o que o levou a resgatar Roberto Carlos, rei do iê-iê-iê, e, principalmente, a interpretar Coração Materno, de Vicente Celestino, um monumento ao mau gosto, ele responde: "Pela curtição da descoberta em mim mesmo poder gostar daquilo." A sua liberdade de "conhecer uma beleza que passa primeiro pelo feio" foi, aliás, uma experimentação revolucionária, que ajudou a criar um fenômeno na época: a valorização estética do kitsch."
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Amanda Guelso 14/04/2024

A ditadura militar é um período que eu gosto de estudar sobre. Acho importante perceber a historicidade desses eventos e como eles estão presentes no hoje mais do que no passado. Achei a narrativa tendenciosa por parte do autor. Há em toda ela uma tentativa do autor em se mostrar imparcial. Contudo, essa busca por imparcialidade já diz muito sobre o livro. Tratar a resistência à ditadura como violenta, colocando-a numa posição de equivalência com a violência do estado ditatorial, é uma forma de posicionamento. Não existe uma balança entre a violência dessas duas posições. Afinal, pra colocar as duas em pé de igualdade, ambas precisariam ter o mesmo poderio, o que não estava nem perto de ser a realidade da guerrilha armada.
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Lista de Livros 24/12/2013

Lista de Livros: 1968 - O ano que não terminou, de Zuenir Ventura
Parte I:

“Apesar dos riscos que ofereciam, as passeatas são lembradas com doce nostalgia, talvez porque, quando a polícia deixava, elas correspondiam ao que havia de mais generoso naquela geração: a capacidade quase religiosa de comunhão, o impulso irrefreável para a doação. Se houve na história um movimento em que seus componentes não souberam o que era egoísmo, anulando-se como indivíduos para se encontrar como massa, esse movimento foi o da espetacular, pública e gregária geração de 68.”
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Mais do Blog Lista de Livros em:
https://listadelivros-doney.blogspot.com/2013/02/1968-o-ano-que-nao-terminou-zuenir.html

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Parte II:

“– O senhor se lembra daquela foto do Vladimir na Passeata dos 100 Mil publicada pela revista O Cruzeiro, cercado de seguranças? – diverte-se agora o general no seu apartamento na Tijuca. – Pois bem, pelo menos três deles eram sargentos nossos.

O general lamenta não ter, para mostrar, um pôster que durante muito tempo ornamentou o departamento por ele dirigido na época.

– Se o senhor quiser, traz aqui uma revista que eu mostro. Agora não tem mais perigo porque os três já estão mortos.

Não é por falta de orgulho que esse general se mantém no anonimato, e sim por recato e segurança. Na época ele era um poderoso coronel que ajudou a implantar um dos órgãos de informação das Forças Armadas. Suas convicções ideológicas hoje provocam riso pela extravagância da radicalidade – e porque estão em recesso. Ele é um general da reserva.

– Dizem que eu sou de direita, mas isso é uma injustiça. Nunca fui e não sou de direita. O seu rosto, habitualmente sisudo, começa a esboçar um sorriso que promete mais do que sua boca acaba de dizer. Uma demorada tragada protela o desfecho. Ele já deve ter testado antes o efeito desse suspense. Finalmente diz:

– Eu sou de extrema-direita.

O número é de fato irresistível. Num país onde é raríssimo alguém se confessar de direita, dizer-se orgulhosamente de extrema-direita não deixa de ser um feito inédito. A gargalhada que se ouve agora vai na certa anunciar outra atração:

– Eu estou à direita de Hitler, eu estou à direita de Gengis Khan.

Em fevereiro de 1988 essas declarações, como não têm consequências práticas, produzem hilaridade. Mas em fins da década de 60, começos de 70, a cabeça que defende essas ideias ajudava a pensar a estratégia da repressão.”
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https://listadelivros-doney.blogspot.com/2021/02/1968-o-ano-que-nao-terminou-parte-ii-de.html

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Parte III:

“Em dez anos de vigência, o AI-5 já tivera tempo de punir 1607 cidadãos, dos quais 321 cassados: seis senadores, 110 deputados federais e 161 estaduais, 22 prefeitos, 22 vereadores – mais de seis milhões de votos anulados. Além da cassação, todos os senadores e 100 deputados federais tiveram seus direitos políticos suspensos por 10 anos. Entre as punições a funcionários públicos, estavam o afastamento de três ministros do Supremo Tribunal Federal – Hermes Lima, Evandro Lins e Silva e Vítor Nunes Leal – e de professores universitários como Caio Prado Júnior – condenado a quatro anos e meio de prisão por uma entrevista a um jornal estudantil – Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Mário Schemberg, Vilanova Artigas, Hélio Lourenço de Oliveira e uma dezena de pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz, entre outros, muitos outros.

Paralelamente a essa caçada aos criadores, o AI-5 desenvolveu um implacável expurgo nas obras criadas. Em dez anos, cerca de 500 filmes, 450 peças de teatro, 200 livros, dezenas de programas de rádio, 100 revistas, mais de 500 letras de música e uma dúzia de capítulos e sinopses de telenovela foram censurados. Só Plínio Marcos teve 18 peças vetadas. O índex reunia um elenco variado, que ia de Chico Buarque, um dos artistas mais censurados e perseguidos da época, a Dercy Gonçalves e Clóvis Bornay. A violência, que o marechal Costa e Silva confessou ter sentido ao editar o AI-5, ia deixar de ser uma figura de retórica. A partir do dia 13 de dezembro de 1968, ela se abateria de fato sobre a alma e a carne de toda uma geração.”
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Lanzellotti 10/05/2014

Um livro histórico, contado como um documentário de uma época na qual não se pode servir de exemplo, mas pode-se servir de lição.
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Luiza - @oluniverso 26/06/2015

Resenha originalmente publicada no blog Choque Literário.
Galera, hoje trouxe para vocês a resenha de um livro mais pesadinho, sobre uma parte muito importante da história do Brasil. Para quem não sabe, em 1968 ocorria aqui a Ditadura Militar (1964-1985). Apesar de ela ter durado vinte e um anos, o livro é exclusivamente sobre o ano de 1968. É importante destacar que para aproveitar o livro e entendê-lo bem, você terá que ter o mínimo de conhecimento sobre o período.
Talvez, a sacada mais legal da obra seja a importância que o autor deu para os movimentos estudantis que ocorriam.

"A conta nunca foi feita, mas é provável que os estudantes inscritos nas escolas e faculdades brasileiras de 66 a 68 tenham passado mais tempo na rua do que nas salas de aula. Somado o tempo gasto nas assembleias com as horas despendidas nas passeatas, os estudantes daquela época devem ter tido pouca disponibilidade para estudar."

Inclusive, o assassinato de um estudante foi o que fez a população abrir os olhos para o que estava realmente acontecendo (e a própria missa de sétimo dia dele).

"Aquele sol tremendo e as pessoas chegando sem parar, com flores, rosários: crianças de escolas primárias, freiras, madres, padres, alunos de colégios, professoras levando turmas, pessoas inclusive de direita. Crianças de 7, 8 anos, ao lado de mães, velhos, donas-de-casa se exprimindo politicamente pela primeira vez. Parecia que havia uma grande articulação e não era nada disso. Uma coisa contraditória esse enterro: uma manifestação impotente, cheia de vida. Foi comovente."

Automaticamente, o leitor fica sabendo o quanto os estudantes sofreram, seja por meio da prisão, tortura, pancada e repressão, por não ficarem quietos.
Também são narrados ao longo do livro eventos cruciais do ano, como a Passeata dos 100 Mil, uma reunião dos estudantes em Ibiúna e depois relatos do que aconteceu com eles e com o casal que cedeu o espaço para ela (havia muita gente infiltrada no meio dos estudantes, inclusive da CIA). O autor ainda dedica um capitulo (e mais um pouco) para contar sobre a repressão que os atores de teatro e artistas de música sofriam.
Dentre outros acontecimentos importantes, o último deles é o decreto do AI-5 (ato considerado um golpe dentro do Golpe) e ainda um pouco do que houve por trás da aprovação dele, que instaurava e formalizava a censura.

"As precauções de Beltrão não levavam em consideração que o AI-5 estava sendo editado não para proteger inocentes, mas para transformá-los em suspeitos ou culpados."

Confesso que demorei um pouco para pegar o ritmo da leitura, mas isso ocorreu porque no início o autor apresentou fatos e informações que eu não dominava tanto, então tinha que refletir muito a respeito. Já do meio para o final foi mais fácil. O Zuenir não é imparcial e muitas vezes usa a ironia para mostrar sua indignação; mesmo assim, nos mostra os dois lados da história.

"A história do ano acaba aqui. Na verdade, era apenas o começo. 1968 entrava para a História, senão como exemplo, pelo menos como lição."
Confira também o post do blog: http://choqueliterario.blogspot.com.br/2015/05/falando-sobre-1968-o-ano-que-nao.html

site: http://choqueliterario.blogspot.com.br/2015/05/falando-sobre-1968-o-ano-que-nao.html
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