spoiler visualizarRay 11/09/2022
Um livro quase perfeito (SPOILERS)
O embate filosófico é o ponto alto do livro, e como o autor desenvolve isso? A partir da interessante interação entres os protagonistas, das situações grotescas, e da demonstração da crua realidade da vida do homem do mar.
Juro, em determinado momento fiquei esperando pelo autor discutir sobre as questões de classe, acerca do brilhantismo disperdiçado pela origem de Wolf, que não teve as oportunidades para ascender, e quem sabe se tornar um Gentleman assim como Humphrey, e no meio de quem sabe da sua frustração, ele se tornou tirano (mas um tirano com propriedade) que abdicou qualquer código moral, e usa da sua capacidade de autodidatismo pra se autojustificar naquela posição. Hump por outro lado é o homem comum da melhor parte da sociedade, e não pensava muito sobre isso até embarcar no Ghost.
E tudo vai muito bem, com personagens interessantes pra além dos protagonistas (Death Larsen que o diga) mas que de repente, subitamente, desaparecem em nome de um romance que cai, literalmente, do nada na embarcação do Ghost. É quase sofrível de acompanhar, não fosse a capacidade de envolver do autor até em situações que não são interessantes pro leitor naquele momento. O Ghost some, o Wolf só retorna no final tão decadente quanto a escuna, e volta somente pra definhar diante a "glória" de Hump, que de forma bem direta, vence aquele embate e ainda fica com a mocinha; parece que todo o potencial desses personagens se resume ao típico arco do protagonista fraco se tornando forte por meio da conquista de uma mulher, e tudo isso por qual motivo?
Fiquei pensando sériamente nisso. Era como se a história tivesse se dividido em duas, como se em algum lugar daquele texto, a verdadeira história tivesse ficado de lado, escondida em seu grande potencial, simplesmente não temos mais o aprofundamento de determinados personagens citados, como o cozinheiro ou o irmão de Larsen, que são lembrados muito vagamente só ao final do livro.
Dai qual não foi a minha surpresa, ao voltar pra introdução dessa edição da história e encontrar uma explicação provável pro que eu mesma tinha notado ao decorrer do texto: a tensão sexual não intencional entre os protagonistas, parece absurdo, mas acompanhe o raciocínio.
Larsen sugere muitas vezes atração intelectual por Hump, e não hesita em transformá-lo numa espécie de dama de companhia, e Hump por sua vez mantém sua admiração explicíta no texto que se bem observada soa um tanto quanto ambígua, ao mesmo tempo que também não disfarça a repulsa de suas ações. Ele admira tudo no personagem, fisicamente e intelecutalmente, mas repudia suas ações e sua brutalidade. O autor faz questão ainda, de ocultar explicitamente um fato recorrente nas embarcações daquele tempo, ao chamar os marinheiros de "celibatários marinhos", e sinceramente, é até engraçada a tentativa dele de limpar esse aspecto, considerando que ele nos mostra cenas de tortura psicplógica e fisica tão explicitamente.
A resposta no entanto pode não ser exatamente essa, mas talvez um simples desejo de tornar a históra mais autobiográfica por algum capricho do autor, que tenha surgido da necessidade de tornar a história mais palátavel pros leitores e se afastar, deliberademente ou não, de uma forma de interação intima demais entre dois homens...
Não que eu esperasse que o final terminasse em um casamento gay, mas definitivamente esperava um embate verdadeiramente intenso entre esses dois personagens e que não tivesse sido reduzido com a presença de uma personagem feminina relativamente interessante, mas totalmente sem sentido pra essa história.