Amós 13/04/2022Resenha da obra “A Ética Protestante e o Espírito da Capitalismo” do Max Weber; Leitura finalizada em Oito de Abril de 2022 Autor e obra em questão dispensam apresentações, sendo considerado, junto a Marx e Durkheim, um dos pais fundadores da sociologia e sua obra é seminal para o pensar o desenvolvimento do sistema capitalista através da modernidade. Max Weber é nascido na Alemanha pré-unificação em 1864 e iniciou seus estudos na Universidade de Humboldt de Berlim, tendo se dedicado ao estudo de religiões ocidentais e orientais. Seu trabalho tem importância destacada devido a sua formulação do método de análise sociológico empregado por ele e que se difundiu no meio acadêmico contemporâneo, método esse que engloba em si apreensões da História, Economia, Direito e Filosofia para construção de teses sociológicas.
Já a obra em si, foi escrita nos primeiros anos do século XX, em meio a um apogeu do imperialismo europeu sob Ásia e África, onde muitos pensadores se dedicavam a entender o porquê da disparidade no desenvolvimento econômico europeu frente às colônias na periferia do sistema capitalista. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo foi escrita em forma de artigos que posteriormente foram reunidos e organizados em forma de ensaio, que destrincha pontos centrais da mentalidade protestante frente ao desenvolvimento do capitalismo europeu e estadunidense. Sua tese no livro serve de contraponto ao pensamento marxista, pois pensa o desenvolvimento do capitalismo a partir de uma ótica culturalista, dando maior atenção às formas de pensar/agir das sociedades analisadas frente ao método materialista histórico-dialético de Marx.
Logo no primeiro capítulo, Weber irá pensar como as diversas formas religiosas se posicionam dentro dos estratos sociais dos países analisados, pois dessa forma busca entender de que forma suas práticas privadas contribuem em maior ou menor medida para seu ascenso econômico. Dessa análise o autor conclui que postos chaves da economia capitalista são ocupados majoritariamente por protestantes de diversas denominações e de como isso se construiu historicamente a partir de uma ética de trabalho árduo e ascetismo pessoal dessa parcela da população. Partindo disso, o segundo capítulo busca fazer uma definição melhor do que o autor entende por “espírito do capitalismo”, colocando que isso vai além da simples formulação econômica da busca de lucros - que na visão de Weber é possível de ser identificado em outros vários contextos do mundo e do tempo - mas sim por um ethos de racionalização do trabalho em torno de um propósito de aumento de produtividade sistemático a partir do reinvestimento dos lucros obtidos. Isso se dá devido à lógica supracitada de uma vida ascética. Isso em grande medida se contrapunha aos “capitalistas tradicionais”, que apesar da busca por obtenção de grandes margens de lucro, não o reinvestiram na produção de mercadorias, mas sim gastavam boa parte do que era adquirido com bens e com uma vida mais luxuosa. Isso fica claro no seguinte trecho (pg. 72): “ O tipo ideal do empreendedor capitalista [...] evita ostentação e as despesas desnecessárias, bem como o desfrute consciente de seu poder, e sente-se embaraçado com os sinais externos de reconhecimento social que recebe.”
Já no terceiro capítulo o autor se dedica ao entendimento do conceito de vocação, que é percebido para além do simples trabalho, mas alcança a compreensão que o exercício de uma profissão com dedicação absoluta é uma virtude elevada a ser alcançada pelos indivíduos. Essa lógica é presente dentro da ética protestante na medida que o trabalho justo é uma forma de expressão de amor fraternal pela sua comunidade e em última instância, uma forma de louvar a Deus. Isso se contrapõe aos capitalistas tradicionais, que tinham sua vida luxuosa condenada pelo ethos ascético dos protestantes. Essa forma de compreensão de vocação se desenvolveu dentro das diversas correntes do protestantismo moderno, em especial os calvinistas, metodistas, pietistas e outras seitas protestantes que o autor irá abordar no capítulo seguinte. O que cabe destacar desse trecho é a abertura da possibilidade da obtenção de lucros capitalistas como forma de demonstrar sua vocação ao trabalho exercido e consequente enriquecimento como forma de demonstrar de sua fidelidade a Deus, extrapolando isso ao ponto de que a posse de riquezas passa a ser visto como uma marca dos verdadeiros cristãos.
No quarto capítulo o autor se dedicará a análise aprofundada da ética das diversas correntes do protestantismo, destacando de cada uma delas pontos que irão se constituir numa ética protestante mais geral. Dos calvinistas a ideia de predestinação dos salvos se relaciona profundamente com o entendimento de que o sucesso econômico são as marcas de um salvo, visto que dentro dessa lógica não haveria outras possíveis marcas dessa salvação cristã e que somente os escolhidos por Deus tem sobre si sua bonança divina. Dos metodistas se tem o fortalecimento de uma sistematização racional do trabalho em vistas do aumento de produtividade, retomando a ideia de que o exercício de sua vocação com dedicação é uma forma de amor fraternal cristão. Já os pietistas tem destaque devido ao reforço de sua lógica ascética e da repreensão de uma vida com luxos. Por fim o autor vê nas diversas seitas (como quakers, batistas e puritanos) uma mescla dessas diversas correntes do protestantismo que em menor ou maior medida se fizeram presentes nos Estados Unidos da América e de como essas influenciaram grandemente o desenvolvimento do capitalismo.
No capítulo final da obra o autor recolhe todas essas compreensões para construir sua tese, afirmando que essas características do protestantismo em conjunto construíram um novo ethos, que se contrapunha ao cristianismo medieval católico e que valorizava o acúmulo de riquezas como marca do verdadeiro cristão. Isso fica transparente no seguinte trecho (pg. 243-244): “A riqueza só é, portanto, ruim, do ponto de vista ético, conforme seja uma tentação ao ócio e à fruição pecaminosa da vida, e a sua aquisição somente é ruim quando é realizada como último propósito, o de uma vida folgada e sem cuidados. Entretanto, enquanto realização de um dever para uma profissão, esta não é apenas moralmente permitida mas é, na verdade, ordenada." Com isso temos uma nova mentalidade burguesa se solidificando dentro dos países de maioria protestante, o que se espalha para outras nações, tornando ideias como vocação ao trabalho presentes na lógica capitalista como um todo.