Helder 20/03/2016Jantar entre SelvagensEu acredito que tanto em um filme quanto em um livro, é sempre saudável para a estória fluir que exista um mocinho e um bandido. Aqui neste livro demora um pouco para percebermos quem é o vilão, mas não se iluda. No meio de tantos pratos, frescuras e papo furado existe um vilão, e o que mais assusta é que ele pode estar ao seu lado em seu dia a dia.
O jantar é um livro muito diferente. Percebemos logo que é um livro extremamente pensado. Até nas suas divisões, pois começa na entrada, passa pelo prato principal, a sobremesa e termina no digestivo. Tudo que um restaurante chique deve ter se tivermos dinheiro para pagar.
A princípio a estória passa-se no tempo de um jantar.
Em um restaurante, um jantar entre dois irmãos e suas esposas. O ar cheio de tensão. A falsidade e as máscaras levadas ao extremo. Serge é o principal candidato a primeiro ministro da Holanda, e Paul, seu irmão e narrador do livro faz de tudo para que vejamos cada vez mais o lado mesquinho de Serge, que já começa desde o início na escolha de um restaurante extremamente caro para um jantar em família. Um simples ato para mostrar poder. Mas não é um simples jantar entre casais. Existe algo para ser conversado. Seus filhos fizeram algo muito errado. E eles precisam discutir os próximos passos. Mas o que ocorreu?
Com extremo talento, Herman Koch vai descrevendo o restaurante e os pratos, com toda a sua pompa burguesa e exagerada do século XXI. O livro é narrado por Paul em primeira pessoa, um personagem extremamente chato, extremamente derrotista, invejoso e com um caráter duvidoso, mas que vai nos envolvendo cada vez mais em uma estória inacreditável, que quando chega ao final nos enche de amargor e, por que não, de medo.
Entre a entrada, pratos principais, sobremesas, Paul nos leva ao passado e nos mostra o que aconteceu, e quando achamos que a ação dos garotos foi algo terrível e brutal, nos deparamos com as atitudes dos pais, e é aí que realmente vem o choque e o medo.
Medo do que o ser humano é capaz de fazer. O autor ultrapassa todos os limites do politicamente correto e nos tira de nossa zona de conforto. Até onde os pais podem ir para proteger seus filhos? O que é ética? O que é amor? O que é psicopatia? A maldade é hereditária?
São perguntas que com certeza o autor traz à tona com seu livro. Não é um livro fácil. As vezes as descrições do jantar são extremamente presunçosas, mas no fim percebemos que tudo ali é extremamente necessário para a narrativa.
Extremamente necessário para nos mostrar que o homem do século XXI com todo o seu verniz chique e presunçoso, no fundo não passa de um selvagem.
Recomendo para quem tem estomago forte.