Dayane 05/08/2012
Memórias de um Sargento de Milícias
Nos tempos do rei o nascimento de uma criança dá início a essa obra cômica e um tanto quanto trágica que é um marco da literatura propriamente brasileira.
Filho de Maria-da-Hortaliça e de Leonardo-Pataca, Leonardo é um menino endiabrado que não poupa ninguém de suas travessuras, depois da separação de seus pais, é adotado pelo padrinho-um homem calmo e tolerante que deseja o tornar clérigo. O problema é que o menino não tem vocação para isso e até mesmo na igreja consegue criar confusão, o compadre sempre parece ser o único a apoiá-lo e às vezes até ri de suas maldades, no fundo tendo um imenso amor por Leonardo.
O garoto cresce e continua da mesma maneira, mas ao conhecer Luisinha, seu primeiro e grande amor, muda seus comportamentos; Leonardo, encorajado pelo compadre se declara a Luisinha, que mostra gostar dele também, o problema é que um antigo amigo de Dona Maria- a mulher que adotou Luisinha- já tem planos de se casar com a moça; Leonardo recorre ao compadre, que por sua vez recorre à comadre- madrinha de Leonardo- uma parteira que quando se trata de assuntos da cidade esta sempre por dentro. A comadre inventa uma mentira enorme a respeito do amigo de Dona Maria, e Leonardo ganha pontos com Luisinha, mas no final a mentira é descoberta e Leonardo perde a moça de vez para Jose Manoel, que reconquistando a honra da amiga, casa-se com Luisinha.
Nesse decorrer de tempo, o compadre fica muito doente e morre, deixando uma pequena herança para seu afilhado, que resolve ir morar com seu pai; e já que Leonardo-Pataca (depois de muitos desentendimentos amorosos e episódios constrangedores) casou-se com Chiquinha, filha da comadre, essa resolve ir também. Leonardo nunca se deu bem com Chiquinha, os dois sempre estavam discutindo por algum motivo, mas um dia a briga foi tão feia que Leonardo fugiu de casa com medo de apanhar do pai. Leonardo correu tanto que nem fazia idéia de onde estava, mas não se preocupava com isso, seus pensamentos estavam muito longe quando foram interrompidos por gargalhadas vindas de trás de uns arbustos, ele reencontrou um grupo de velhos amigos onde conheceu Vidinha, uma moça muito bonita que encantava a todos com sua voz e talento para modinhas, Leonardo apaixonou-se perdidamente por ela, esquecendo dessa forma, Luisinha que já estava muito bem casada.
Leonardo foi morar na casa da família de Vidinha, por lá ele era muito amado, exceto pelos dois primos de Vidinha que também eram apaixonados por ela. Vidinha não escondia sua preferência por Leonardo e isso despertou a fúria dos dois rapazes que fizeram com que Leonardo fosse preso pelo Major Vidigal, uma autoridade muito respeitada naquele tempo; Leonardo esperto e muito ágil conseguiu escapar no momento em que estava sendo levado para a prisão, com essa atitude o major sentiu-se desafiado e desapontado, já que ninguém nunca havia conseguido fugir dele, prometendo assim vingança a Leonardo.
Leonardo nunca estudou ou trabalhou (pelo menos não por muito tempo), nas uma ou duas vezes que tentou, suas tentativas não trouxeram resultados significativos; mas dessa vez ele precisava trabalhar, para poder assim, diminuir as chances do Major Vidigal prendê-lo. Ele foi trabalhar com o rei, era um emprego bom e bem remunerado, mas não fique tão feliz, pois não demorou muito tempo pra ele arranjar encrenca: onde ele trabalhava havia um homem chamado Toma-largura que maltratava muito sua mulher, Leonardo sentindo pena da moça resolveu um dia levar uma tigela de caldo para ela enquanto seu marido estava trabalhando, mas o homem chegou bem na hora em que os dois estavam tomando o caldo, vendo aquela cena o Toma-largura começou a correr furioso atrás de Leonardo, que saiu apressado derrubando tudo o que via pela frente, causando assim sua própria demissão.
Quando sua nova família- e principalmente Vidinha- descobriram o motivo de sua demissão as coisas se complicaram; Vidinha era extremamente ciumenta, e depois de chorar e gritar resolveu que iria pessoalmente a casa do Toma- Largura entender o que havia acontecido; Leonardo saiu correndo atrás da amada, mas foi deixado para trás; de repente sentiu uma mão o puxando pela gola da jaqueta, era o Major e desta vez não havia como fugir.
Vidinha não conseguiu nada na casa do Toma-largura, afinal não havia nada a se esclarecer, ela só conseguiu chamar a atenção do homem, que rapidamente apaixonou-se por ela; depois da prisão de Leonardo ele sumiu e ninguém tinha notícias dele, por isso Vidinha se aproximou de Toma-Largura, mas seu romance se desfez quando em uma cerimônia de família o homem causou uma tremenda confusão e foi preso pelo, agora, granadeiro Leonardo.
Mesmo depois de se tornar granadeiro, Leonardo não parou de aprontar, e arrumou uma confusão tão grande que foi preso e condenado a chibatadas, mas essas não lhe atingiram a pele graças a Dona Maria, a comadre e à Maria-Regalada - uma antiga paixão do Major - que o ajudaram, o plano das três mulheres (principalmente da última) foi tão bom que Leonardo foi solto e promovido a sargento.
Passando-se um tempo, José Manoel morreu e Leonardo foi prestar as condolências à família, depois de uma conversa rápida com Dona Maria, ele começou a procurar uma pessoa especial, que não via há muito tempo, sem demora encontrou Luisinha, que retribuiu seus olhares; os dois ficam surpreendidos com a mudança de aparência um do outro que aconteceu no decorrer dos anos e conversam brevemente, despedindo-se com um aperto de mão, que naquela época significava muita coisa.
Dias depois os dois reataram o namoro e queriam se casar, o problema é que para isso Leonardo precisava dar baixa na sua tropa de linha e que passasse no posto de sargento para as milícias, mas isso exigia a permissão do Major; então lá foram Dona Maria, a comadre e Luisinha à casa do Major, que sendo encontrado na companhia de Maria-Regalada deu sem demoras a permissão, e Leonardo pode assim finalmente casar-se com sua amada.
O desfecho da história é desastroso, e um tanto quanto engraçado: Dona Maria e Leonardo- Pataca morrem e o narrador resolve nos poupar de uma série de acontecimentos tristes que com certeza renderiam muita confusão e que nos provariam realmente que (como dizia a comadre) Leonardo não nasceu num bom dia.
O livro memórias de um sargento de milícias é um ótimo livro, pois nos conta de uma forma divertida a história de personagens que nos ajudam a compreender como se portava a sociedade brasileira no século XIX. O único livro de Manuel Antônio de Almeida, retrata a sociedade da época, evidenciando os problemas sociais e criticando os valores, deixando de lado a idealização de personagens, e reconstruindo costumes que nos mostram uma visão muito próxima da realidade, sendo, portanto, uma obra precursora do Realismo no Brasil.
Por ser originalmente um folhetim, o livro apresenta capítulos curtos e independentes, em geral contando um episódio completo, revelando sempre uma grande surpresa que será desenvolvida somente no capitulo seguinte, causando assim no leitor, grande expectativa e curiosidade. No livro o autor usa elementos que atingem e atraem exatamente as classes sociais que ele retratava: as personagens se apresentam em uma categoria mais social e menos psicológica, representando muitas vezes tipos alegóricos: os personagens não representam indivíduos definidos, mas sim tipos sociais. E a linguagem é popular, simples e coloquial, de acordo com pessoas pertencentes a camadas sociais mais baixas. O autor aproxima as falas das personagens das expressões usadas na época, em uma linguagem objetiva e de fácil compreensão, que facilita a leitura, tornando-a dessa forma mais rápida.
O narrador é muito importante é muito importante no livro, pois no decorrer da história ele cria com o leitor certa cumplicidade, principalmente pelo fato de ser onisciente, ele opina sobre os acontecimentos e nos mostra seus pensamentos, tornando assim a história mais dinâmica, com um ponto de vista adicional que nos ajuda a compreendê-la; ele a todo o momento nos dá dicas sobre os personagens e literalmente conversa conosco. O narrador descreve as características dos personagens e do espaço em que eles estão perfeitamente, sendo muitas vezes detalhista e íntimo em suas descrições, fazendo assim com que nos transportemos para a época e para o espaço onde a história aconteceu.
O livro memórias de um sargento de milícias realmente despertou meu interesse pela literatura nacional; com uma linguagem simples, mas com riqueza de informações, o livro consegue nos cativar, despertando cada vez mais nossa curiosidade; os personagens são tão autônomos que parecem reais, que parecem nossos conhecidos, e essa é a verdadeira magia da leitura, através de palavras o autor consegue nos apresentar a pessoas, costumes e gostos diferentes dos que estamos habituados, e que no passado fizeram parte da sociedade brasileira, nos ajudando a construir o que somos hoje, por isso possuem tamanha importância.