wickedeye 24/09/2022
Humano, demasiado humano
Natsume Soseki sabe muito bem transpassar sua imersividade em sua narrativa prosaica muito bem condensada e de teor extremamente humano. Os relatos de Kokoro conversam com a carne, a mente e a alma, são retratos de uma geração com uma confusão de identidade generalizada num dos momentos mais complexos vividos pelo povo japonês, onde não se sabia encaixar devidamente o íntimo da cultura com a nova leva de invasão e mescla vinda da cultura ocidental. Tendo vivido isso na pele, Soseki passa para o papel confissões extremamente humanas através de personagens de natureza divergente, de tempos diferentes com ideias a passar adversas mas que mergem muito bem para o contar de sua trágica história, sobre pessoas que se perderam ou que estão perdidas, com amarguras diversas e sonhos fraturados, com descrenças para com a humanidade e para consigo mesmo. Soseki condena o espírito de seus personagens, mostrando o declínio que os leva a completa falta de fé num amanhã próspero. Kokoro consegue te alcançar no íntimo dos pensamentos sem ser nenhum pouco intrusivo, com uma leitura que flui como estar lendo relatos de pessoas que estão pedindo ajuda à fuga de suas mentes. A força motiz destrutiva da existência amargurada do Sensei em contraponto com a figura passiva e simplória de seu pai afetam o nosso protagonista sem nome, sendo o representante de uma nova geração que viria em frente, mas ainda assim tendo a influência de duas visões tão diferentes que conversam em antítese de um período Meiji que é por fim sepultado.