Lucas 07/12/2017
Improvável mistura entre superficialidade, mistério e obscuridade
É sempre uma grande dificuldade prever o que um romance policial no "estilo" Dan Brown ou Sidney Sheldon irá causar no leitor. Aguçamento de aprendizado, suspense, uma leitura viciante ou pobreza e superficialidade narrativa, todas essas sensações surgem em obras assim que se dirigem, em sua maioria, para algum assunto histórico ou intrigante.
A Conspiração Franciscana, do norte-americano John Sack, se direciona para o primeiro desses escopos. Narra um dos maiores mistérios da Igreja Católica: a relação dela com um dos seus santos mais populares, o italiano São Francisco de Assis. Ele viveu entre os séculos XII e XIII (que é por onde, quase inteiramente, a narrativa se passa) e fundou a Ordem dos Franciscanos, uma das mais populares Ordens da Igreja Católica através dos séculos.
Dentro desse raciocínio e sem mais devaneios, o grande ponto positivo do livro é justamente esse: um minucioso relato das tradições e dos costumes envolvidos nos chamados Frades que ingressam nessa Ordem. Impulsionados pelo seu fundador, eles vivem para servir: não acumulam bens, são nômades por natureza e vivem em constante peregrinação. Há várias ramificações dentro da Ordem, mas o sentido do seu trabalho é atuar diretamente nos mais necessitados, sem a "pompa" de qualquer Celebração tradicional feita em Igrejas ou Templos. Este trabalho tinha um sentido ainda mais lúdico no século XIII, no interior da Itália, pobre e cheio de pessoas doentes e miseráveis. Assim, é muito interessante para o leitor conhecer o hábito dos Frades e a sua atuação nas comunidades rurais, nas famílias mais pobres e nas casas de leprosos. A Palavra atuava nessas pessoas, na maioria dos casos, como uma mensagem de esperança que tocava e que preenchia o vazio que elas possuíam. E a Ordem segue até hoje, quase oito séculos após a sua criação, atuando inclusive no interior do Brasil: os Frades visitam pequenas comunidades e ficam nelas por cerca de uma semana, fazendo celebrações diárias, visitando doentes, consolando famílias... É um trabalho fantástico, de fé e humildade, que deveria ser mais reconhecido por todas as religiões em geral.
Mas, assim como praticamente todos os livros do seu gênero, A Conspiração Franciscana sofre de alguns problemas. Obras similares são criticadas por serem cinematográficas em demasia: capítulos curtos, que normalmente terminam com uma frase direta e seca são marcas registradas das obras de Dan Brown, por exemplo, que fazem da história em questão ser muito similar a um roteiro de filme. É pobre narrativamente falando, mas é algo que prende a atenção. E é justamente aí que reside um dos defeitos da obra de Sack: mesmo contendo elementos históricos, suspense e muito mistério, a narrativa não é cinematográfica, não cativa o leitor de uma forma que ele se veja devorando o livro. Os "auges" da história são contados aos poucos e pecam também pela previsibilidade. Além disso, esses momentos são apresentados de uma forma crua, sem muita emoção ou arrebatamento, algo que incomoda até mesmo os que apreciam esse tipo de literatura.
Outro erro crucial para o andamento da história é o início confuso com que certos personagens vão sendo apresentados, além da forma abstrata que alguns mistérios são expostos. São momentos-chave, que prejudicam todo o andamento subsequente do livro, e fazem com que, principalmente, a primeira centena de páginas custe a passar. Há a impressão de que as atitudes confusas de certos coadjuvantes poderiam ser justificadas se houvesse um maior desenvolvimento deles e dos dilemas que eventualmente enfrentam. É perturbador, por exemplo, quando um personagem parece "sossegar" na narrativa e, de repente, ele some desvairadamente, sem um motivo crível. Problemas assim permeiam toda a obra.
O protagonista é Frei Conrad de Offida, frade que realmente existiu e que recebe uma carta enigmática de Frei Leo, o eremita mais próximo de São Francisco, que já estava, no "presente" da narrativa, falecido a cerca de 50 anos. Essa carta instiga Frei Conrad a percorrer as montanhas da região central da Itália até Assis, a cidade natal do santo, onde lá ele acredita ser possível desvendar a mensagem que lhe foi legada. No percurso, ele conhece Amata, a protagonista feminina, uma criança rebelde e inicialmente desvirtuada, que corresponde a um dos já citados personagens confusos que a história apresenta. No contexto da narrativa, o leitor vai descobrindo um grande segredo da Igreja Católica, que envolve Francisco, e que corresponde a outro ponto interessante da obra: o esforço que essa instituição secular fazia para expor o que ela achava adequado. Na época, nem se sonhava com protestantismo e percebe-se uma prática ainda mais rigorosa de clérigos de alto escalão para distorcer ou omitir verdades, com o intuito de construir algo mais "palpável" sob o ponto de vista da fé, mas abstrato com relação ao que de fato ocorreu. A Igreja, em seus primeiros séculos, infelizmente não media esforços para mostrar apenas o que Ela queria, usando, se necessário, dos mesmos pecados que os seus componentes faziam questão de condenar.
O passar das páginas, lento e arrastado, conduz a um desfecho igualmente engessado, que vai se desenhando de uma forma bem pausada. Além desse aspecto, um forte apelo sexual nos últimos capítulos (que soa como inverossímil, já que a narrativa se passa no auge da Idade Média) também atua como um argumento que explica a ausência de cinematografia e a pouca clareza da narrativa, principais pontos negativos do livro. Sucintamente, A Conspiração Franciscana vale a pena ser lido para que se admire o trabalho dos Franciscanos e a atuação corrupta da Igreja em algumas questões. Se o leitor espera algo maior que isso, é lamentável (mas necessário) dizer que ele não sairá plenamente satisfeito após a leitura.