O Casamento

O Casamento Nelson Rodrigues




Resenhas - O casamento


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Danielle 29/08/2016

Perturbador
Meu primeiro livro de Nelson Rodrigues, "o pornográfico". Leitura fácil e que prende bastante, do tipo que te deixa curiosa pra ler mais. Interessante o modo como ele retrata o pensamento dos personagens o tempo inteiro. Temas bem polêmicos e pesados até para os dias de hoje. Eu diria que um pouco "sujo" (sem julgamento moral aqui). Mas o mais interessante é o questionamento sobre o "homem de bem" e toda a hipocrisia que o circunda. Todos os personagens parecem meio perturbados o tempo inteiro e o sentimento é passado para o leitor.
Rafael.Manarelli 31/08/2016minha estante
SIm, o sentimento de perturbação dos personagens é passado ao leitor que compartilha os pensamentos hostis dos mesmos. Chega a ser pesado, exagerado. É interessante como Nelson Rodrigues escracha ao público os pensamentos e sentimentos íntimos dos personagens e como estes são hipócritas em não assumí-los. Uma das frases mais legais do livro é quando o padre fala "Se as pessoas conhecessem a intimidade dos outros, ninguém se cumprimentaria" ou "o ato sexual é uma mijada. Mas achei muito exagerada a história. Acaba por denotar uma intenção do autor em impactar, por ter só personagens insanos.




Marília 25/12/2023

Essa história nos mostra como as pessoas são hipócritas. Por fora bela viola por dentro pão bolorento.
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Tamires 08/11/2016

O Casamento
Certa vez resolvi ler A vida como ela é, de Nelson Rodrigues (1912-1980), mas a leitura não rendeu muita coisa. Mal cheguei à página 100. O autor pareceu muito politicamente incorreto para mim, e por politicamente incorreto entenda extremamente machista e um pouco homofóbico. Mal sabia eu que, pouco tempo depois, ficaria vidrada, presa até a última página, em seu romance O Casamento.

O Casamento foi o livro do mês de agosto/2016 enviado pela TAG- Experiências Literárias, indicação da Heloísa Seixas. Resolvi, como recomendado pela curadora, deixar o preconceito de lado e embarcar na leitura. Fiquei surpresa por ter gostado tanto do livro! Tanto que agora vou pensar um pouco mais antes de dizer que não leio de jeito nenhum determinado autor.

“Leia sem preconceito. Todo gênero é único. É criador, é inventor, não segue padrões existentes e por isso não se enquadra em escaninhos. Nelson é livre. E é preciso ser livre para lê-lo.” (Heloísa Seixas, para os associados da TAG)

O romance conta a história de Sabino Uchoa Maranhão e sua família. Ele é um bem sucedido empresário carioca e está às vésperas de casar a sua filha mais nova (e favorita), Glorinha. Tudo seguia conforme o planejado quando o ginecologista de Glorinha, Dr. Camarinha, faz uma revelação bombástica ao pai da moça: o médico teria surpreendido o genro de Sabino, Teófilo, aos beijos com o seu assistente, Zé Honório, chegando ao seu consultório. A partir daí, Sabino precisa descobrir o que fazer com essa informação, mas uma coisa era certa: cancelar o casamento estaria fora de questão.

"Afinal de contas, o casamento já é indissolúvel na véspera.” (p. 26)

Pensamos que o grande problema da história é a pederastia (sim, o autor usa esse termo) de Teófilo, mas há muito mais sujeira debaixo do tapete de Sabino e sua família.

Polêmico e publicado na década de sessenta, O Casamento foi censurado pela ditadura militar menos de dois meses depois de seu lançamento. O romance é uma leitura ágil, crua e totalmente despudorada. Nelson Rodrigues não usa de meias palavras em sua história. Aqui são expostos temas como machismo, incesto e homofobia de forma bastante escrachada. Escrito em capítulos curtos, dificilmente alguém demora mais de três dias para terminar essa leitura, a não ser os leitores que se incomodem em demasia com a trama.

Durante a leitura senti uma incômoda semelhança entre a sociedade da década de 1960 e a nossa. Obviamente o texto de Nelson Rodrigues faria muito barulho se fosse publicado hoje, pois ele não é do tipo que se esconde atrás da cortina do politicamente correto. A família de Sabino, a sociedade a qual ela pertence, lembra muito certa camada da sociedade brasileira que impõe regras, modos de conduta, mas que esconde, ao mesmo tempo, bastante sujeira debaixo de seus tapetes também. Sabino era um homem de bem. Quem fizer a leitura poderá tirar as próprias conclusões.

Outro ponto interessante relacionado ao tempo que estamos vivendo é o fato de o jornal O Globo e a Marcha da Família com Deus pela Liberdade apoiarem a ditadura na censura do livro, ainda que o autor fosse, na época, colunista do jornal. Um suplemento no final da história, na edição da Nova Fronteira, fala bastante sobre o caso.

O Casamento foi uma grata surpresa para mim: eu jamais compraria esse livro se o visse em uma livraria. Conhecendo previamente o autor, me incomodava demais o machismo em sua escrita, mas aqui, muitas passagens encarei com humor. É ficção. Claro que com boas e generosas pitadas da realidade da nossa sociedade. Mas, ainda assim, é ficção, não verdades absolutas. Afinal, qual o melhor lugar para explorar certos assuntos senão em um livro? O Casamento é uma leitura que pode ser perturbadora, mas que merece ser feita, especialmente por aqueles que admiram uma história bem escrita.


site: http://www.tamiresdecarvalho.com/resenha-o-casamento-de-nelson-rodrigues/
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Ana 12/06/2020

Sórdido
Se eu achava Asfalto Selvagem, O beijo no Asfalto, Otto Lara Resende ou Bonitinha mas ordinária, livros sórdidos e sujos, eu não poderia esperar pelo murro na cara que ia levar quando lesse O casamento. Aqui nesse romance temos todas as pequeninas obsessões do nosso querido Anjo Pornográfico, porém, como que vistas de uma lente de aumento, obsessões tais como: Incesto, assassinatos, lesbianismo, homossexualidade (que naquela época ainda era chamada de 'pederastia'), traição, suicídio, virgindade, miséria, etc. Só que tudo isso com um tom escatológico avançadinho demais para o Brasil em plena década de 60. Muito ousado, sem dúvida, e percebi aqui que pela primeira vez, Nelson não teve pudores em enfiar palavras de baixo calão nas bocas de seus personagens. E estou falando sério. Na época toda essa sordidez tinha muito mais impacto na sociedade, muito mais do que temos hoje. Hoje temos programas de TV e redes sociais, e Nelson parece fichinha perto disso.
Enredo: Sabino é um homem rico, com um escritório bem conceituado, uma família aparentemente normal, enfim, todos os elementos dos personagens burgueses do Nelson. Sua filha, Glorinha, por quem ele não esconde que tem preferência, está noiva e vai se casar com um rapaz que nem sequer aparece ativamente no romance, é quase como que uma sombra, apenas citado. Glorinha é a típica menina mimada de classe média alta, tem tudo o que quer, e aparentemente ama o noivo, embora haja qualquer coisa de estranho no relacionamento deles, pois o mesmo sequer foi para a festa de aniversário dela. A família de Sabino nutre uma forte amizade pelo doutor Camarinha, ginecologista da moça. Esse ginecologista certa vez flagra ou diz ter flagrado o noivo de Glorinha beijando seu assistente na boca. Achando-se no direito de 'proteger' a menina da 'pederastia' do noivo, ele conta o que viu ao pai da noiva. Doutor Sabino fica em choque ao saber da suposta homossexualidade do futuro genro, e inicia-se então um dilema pesado. Deve ou não contar para a filha?
A verdade é que nem tudo nesse romance é o que parece, e mais uma vez constatei, lendo as falas do doutor Camarinha a respeito do noivo de Glorinha o que já sabia: o homossexual masculino é o indivíduo mais discriminado do mundo, pois enquanto certos homens sentem fetiche em ver duas mulheres juntas, por outro lado ver dois homens juntos causa nojo em certos homens e mulheres, como se o ser homem consistisse única e exclusivamente em viver em função de mulher, em desejar a mulher. E digo mais: diante de tudo o que aparece nesse livro, a suposta pederastia do futuro genro de Sabino é o que há de mais leve e mais normal, de menos obsceno eu diria.
O personagem Doutor Camarinha sente repulsa ao descobrir que talvez haja um pederasta entre os membros da família de Sabino, pai de Glorinha. Mas a própria personalidade de Sabino, sua própria sexualidade, aparece de forma um tanto quanto nebulosa nesse assombrosamente sórdido livro. Leia se tiver coragem.
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Tice 15/02/2022

Nelson Rodrigues
O casamento é uma obra cercada de atos insanos como: suicídios, incestos, homicídio, feminicídio, adultério, ganância e tantas outras mazelas sociais e familiares que já são anunciadas na orelha do livro. Por tanto, apesar de tanta atrocidade, consegui visualizar Nelson Rodrigues trancado numa sala com um maço de cigarro (nem sei se ele fumava) e garrafas de café para controlar a tensão que deve ter sido produzir esse romance. A história é muito desafiadora e intensa.

P. S. Primeiro livro censurado depois de 1964.
É uma oportunidade exclusiva fazer essa leitura.
Eu indico porque vale muito a pena.
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Jardel.Felipe 11/07/2021

Primeira vez
Bom, primeira vez lendo algo de Nelson Rodrigues. E, creio que como muitos outros leitores de primeira viagem do Nelson, eu saio perplexo kkkk Pelo que li sobre o livro ele é o primeiro e último romance do autor.

Uma coisa que me deixou curioso é adoração que alguns conservadores da nossa atualidade tem por Nelson Rodrigues. Esses ditos conservadores nos costumes e liberais na economia. Muito me impressiona algumas citações que fazem dele tendo em vista tudo que ele representa. Que ao meu ver não tem nada de conservador e muito menos conservador da tradicional família brasileira. Creio que talvez eu precise ler mais para poder compreender de onde vem a adoração.

Sobre o livro ele é tudo que falam mesmo. Chocante, nojento, abjeto, repugnante e por consequência humano! Nesse romance em específico vemos traições, estupros, incestos, homicídio, suicídio e por aí vai. Ficamos diante da hipocrisia humana. Vemos o que há por trás de cavalheiros e damas da alta sociedade. Cada pensamento é nos jogado na cara. Sem filtros, assim como pensamos no dia a dia.

Para quem tem curiosidade de ler, aconselho que leia. Sem medos. Se você for muito sensível no máximo sairá perplexo como eu kkkk Aos que já leram Dostoiévski ou Tolstoi, acho que seja uma boa. Me pareceu a escrita. Só que com um toque a brasileira kkk Quem curte Bukowski também, possivelmente vá gostar!
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Mari Briese 09/08/2022

Entre uma hipocrisia e outra são 56 anos
Essa foi para mim a resenha mais complexa de escrever, tantas coisas vêm a mente, que fica difícil saber o que elencar, o que dizer.
Meu primeiro contato com Nelson Rodrigues se deu através dessa obra, afinal, sempre ouvi falar de Nelson Rodrigues.
Não sei ao certo, porque de "O casamento", me lembrar "Ensaio sobre a cegueira" de José Saramago, especialmente quando este último, diz que: " não somos bons e, é preciso coragem para reconhecer isso".
Nessas 300 páginas ( coincidentemente o mesmo número de páginas da obra de Saramago) somos levados a década de 60 , ainda que essa ponte entre dois mundos, talvez nem tão distintos assim, nos faça refletir se estamos ficando loucos ? Afinal, é uma narrativa que parece beirar o absurdo, o surreal. Mas, infelizmente nos damos conta que são pitadas de realidade da nossa sociedade, que de lá pra cá , nem tanta coisa mudou assim.
Uma obra repleta de tabus e preconceitos, que aborda desde incesto, adultério, homossexualidade, recheada com um falso moralismo, pois o "homem de bem" , preza pela família, bons costumes e a moral, sem se esquecer de ir a igreja, mas por trás de tudo isso, escondem muita sujeira embaixo do tapete. Sujeira esta que Nelson Rodrigues escancara sem dó, nem piedade, apontando os segredos e podres do ser humano, como também, seus pensamentos pecaminosos.
Não é à toa que durante a Ditadura, o livro foi censurado , um mês após seu lançamento, com a justificativa de que era uma "afronta à organização familiar". O que não faz com que o que Nelson Rodrigues escreveu seja menos verdade.
Fico pensando, será que por não falar e expor a realidade trazida no livro, tudo isso deixa de existir ? Deixa de acontecer?
Apesar da minha revolta ao ler o livro e ver essa "massa que nós somos feitos, metade de indiferença, metade de ruindade" (SARAMAGO, 2020), acredito que seja um livro que tem o intuito de perturbar, de nos deixar incomodados e reflexivos, e com certeza, merece ser lido .
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Luciano Luíz 10/07/2022

O CASAMENTO de NELSON RODRUGUES é aquele romance que contém absolutamente tudo desse escritor genial. Amor, traição, sexo, incesto, homossexualidade, religião, política, economia, violência em questão de agressão física e claro, morte e toda a rotina de uma família que possuí os mais insanos segredos.
Glorinha tem três irmãs, mas elas não se comparam a sua beleza. Glorinha é a princesa do papai e da mamãe e com 18 anos vai se casar com Teófilo, um rapaz que gosta de rapazes. Glorinha passa por experiências sexuais e psicológicas. Tudo nesse romance se desenvolve da melhor maneira como nos contos e apesar de já conhecermos o autor este sempre surpreende com seus diálogos de efeito e reflexão e cenas corriqueiras que podem acontecer com qualquer pessoa no mundo real.
O Casamento mesmo sendo um romance de 1966 é impressionantemente atual e continua pesado em diversos aspectos. É uma leitura para quem tem a mente livre em todos os sentidos. Vale o investimento para incluir na estante. É mais que recomendado.

L. L. Santos

site: https://www.facebook.com/lucianoluizsantostextos/
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Lilly 30/09/2016

Bizarro
Nelson Rodrigues tem uma necessidade incrível de chocar a sociedade, não é um choque para fazer a sociedade refletir,é o puro ato de simplesmente chocar e nada além disso,não lhe traz uma reflexão profunda.
Isso é lamentável.
A primeira mão ficamos na curiosidade será que o noivo é pederasta ou não,só que a história vai tomando outra proporção, e o exagero de cada personagem não enfeita a história tenho a sensação que a deixa mas pobre.
A única verdade que esse livro diz é que somos todos leprosos,pois todos nós temos as suas chagas.
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claradebolacha 25/05/2022

Não foi pra mim
sinceramente não gostei.
ganhei da TAG em 2016 e só li agora, mas quis gostar, abri com gosto pq minha expectativa é ler autores nacionais e sempre apoiar e gostar (ainda mais censurados na ditadura militar) mas desse livro não gostei. Achei mal executado e muito disperso. Já li outros livros nacionais que falam de uma família totalmente desfuncional, em uma crítica a família tradicional brasileira) e por isso soube que esse aqui não funcionou para mim. Talvez pq tenha sido escrito em apenas 2 meses, faltou polimento...
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Joy 17/10/2016

Cru, cheio de "coisa errada", mas incrivelmente viciante. Só não li num dia só por ter começado no fim da tarde. A escrita de Nelson Rodrigues é maravilhosa. Recomendo esse livro a todos que consigam transcender a polêmica e se focar na forma e na essência.
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Digas de León 20/05/2024

Bem Nelson Rodrigues
?O que faz o romance é o poder de criar vida e não imitá-la. Isso a que chamamos ?vida? é o que está no romance e não o que vivemos cá fora. Assim, o personagem de 'O casamento' é mil vezes ?mais vivo? do que o leitor. (....) Diante [de Glorinha], do frêmito que sua complexidade irradia, a leitora finge e apenas finge que é mulher, finge que é humana, e finge ainda no leito do seu amor e de sua agonia.?

(...)

"'O casamento' foi o primeiro livro a ser censurado no Brasil durante a ditadura militar, em 1966. Para o governo da época, a obra era como um ataque à sagrada instituição da família brasileira, mas, na verdade, o que havia era um retrato fiel de uma sociedade e de uma cidade em franca decadência"
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Matheus Penafiel 24/04/2017

Ouro e fezes
Lendo uma lista dos dez clássicos da literatura erótica, no Diário do centro do mundo, uma frase me chamou a atenção: “[Nelson Rodrigues] escreveu folhetins com os companheiros de redação olhando pelas costas onde iam dar as tramas”. Em outras palavras, Paulo Nogueira, quem compila a lista, está sugerindo que, ao escrever suas histórias, o autor sabia tanto quanto seu leitor, também ele curioso sobre qual o desfecho de suas narrativas. Fiquei imaginando que interessante exercício literário poderia ser esse, em que primeiro recebe os elementos necessários que irão compor o conto ou o romance, sejam personagens, ambientes, objetos, e depois deve rearranjá-los em uma trama coerente. Fiquei me perguntando se O casamento, de Nelson Rodrigues, não foi escrito assim, olhando o romance pelas costas.
A crença se justifica pela brevidade dos capítulos, regulando o mesmo tamanho dos contos de A vida como ela é…. A maioria dos elementos que comporão a narrativa são disponibilizados desde os primeiros. O personagem principal Sabino Uchoa Maranhão, ou apenas Sabino, como é tratado na maior parte do romance, irá casar sua filha caçula e predileta, Glorinha, dentro de dois dias. A narrativa muitas vezes é intercalada com o pensamento distante dos personagens, quando, por exemplo, ao se recordar de uma de suas visitas ao prostíbulo, Sabino relembra a morte do pai.

Quando chega ao escritório da imobiliária da qual é presidente, Sabino é informado de que o dr. Camarinha, ginecologista da família e portanto de Glorinha, vai visitá-lo com urgência. Ansioso em seu escritório, Sabino liga para a mulher, Eudóxia, pergunta como estão as coisas em casa, e ela responde que Glorinha vomitou. Essa é a primeira curiosidade que Nelson Rodrigues tenta nos cravar no coração: será que a visita do dr. Camarinha é para dizer que sua filha não é mais virgem e que está grávida? O questionamento é reflexo da época e sociedade abordados no romance, o Brasil e o Rio de Janeiro conservadores de 1966.

Porém, o que tem o doutor a dizer para Sabino é outra coisa: viu seu futuro genro, Teófilo, beijando seu assistente Zé Honório na clínica. Faltando dois dias para o casamento, Sabino, na condição de chefe de família, tem que lidar com a traição de seu genro, questão secundária, aliás, e a possível “pederastia” dele, esse sim, visto pelo personagem como problema. Leva adiante o casamento, para o qual convidou metade do Rio de Janeiro e cujo um dos padrinhos era Ministro, ou dá fim a ele, pondo fora seu investimento? Em agonia, Sabino consegue exclamar: “Sejamos práticos. E o escândalo? O senhor já pensou no escândalo? O que é que eu vou dizer?”.

Isso lembra alguns versos de Gregório de Matos Guerra, de Preceito 5:

Era dourada parece,
Mas não é como eu a pinto,
Porque debaixo deste ouro
Tem as fezes escondido.

Um fato interessante sobre o romance é que ele foi proibido de circular durante a ditadura militar presidida por Castelo Branco, pois atentava contra a instituição da família. A revista literária da TAG, que acompanha o kit do mês de agosto no qual me foi enviado o livro, nos sugere com lucidez clarividente e precisão histórica que, caso queiramos conhecer os tabus de uma sociedade, investiguemos aquilo que ela proíbe. Se reconstruirmos a sociedade carioca da época pelas polêmicas levantadas pelo romance, perceberemos que eram tabus o adultério, o incesto, a homossexualidade, a virgindade e o sexo pré-marital.
Nessa sociedade, contrastando com a figura do padre, pode ser analisada a compreensão da figura do ginecologista. O próprio Sabino diz que deveriam os “ginecologistas usar batina”. A razão, possivelmente, é a de que são eles os guardiões dos piores segredos encarados pela sociedade: os sexuais. Lembro-me do padre Ángel, em O veneno da madrugada, que no romance garantia que aquilo que denunciavam os misteriosos pasquins distribuídos à noite não mereciam importância. E quando questionado por um médico sobre tamanha certeza, respondeu categoricamente:

– Eu o saberia pelo confessionário.

Essa certeza também é posta em dúvida pelo médico. Já no enredo de Nelson Rodrigues, na qual nada seria confessado ao padre e, mais do que isso, a própria virtude do padre é posta em questão, os segredos são guardados pelo ginecologista. Alguns deles são escondidos do leitor pelo dr. Camarinha por muito tempo, o que aprofunda nossa ansiedade de terminar a história.

É interessante de se observar também a relação repressiva encarnada nos pais. Sabino, pai de Glorinha, exigindo de forma velada a virgindade da filha. Dr. Camarinha querendo que seu filho Antonio Carlos tome jeito na vida e não se mantenha como gigolô. O moribundo pai de Zé Honório reprimindo a sexualidade do filho. Nos estaria Nelson Rodrigues apontando as consequências de uma sociedade centrada na figura do patriarca?

É certo que Nelson Rodrigues é um exímio narrador. Se o leitor quiser pôr à prova a constatação sem ler o romance, poderá pelo primeiro conto de A vida como ela é…, O inferno. Será surpreendido ao final do conto, respirará exasperado e tentará reconstruir a narrativa mentalmente, se não voltar a lê-la, para procurar entender. Uma qualidade bastante treinada se de fato o autor tiver escrito o romance olhando pelas costas. Algumas coisas, porém, parecem inverossímeis, como o excesso de violência física ou verbal empregado pelos personagens. Ou seria inverossímil apenas nos dias de hoje, cinquenta anos depois?

Infelizmente, O casamento não me foi um romance surpreendente, talvez pela distância histórica, talvez pelos enredos pouco críveis a mim. Nelson Rodrigues me parece mesmo exagerado no romance: não traça apenas um contraste entre o discurso moralista e os atos dos oradores dos bons costumes, mas o faz de tal modo que não haja personagem sem um grande pecado implicado em seu histórico. Se uma comunidade de santos púdicos nos pareceria absurdo, podemos nos fiar na existência de uma sociedade de grandes pecadores, sem que se salve um? Me parece fantasioso demais, mas talvez seja o imaginário de Nelson Rodrigues manifestando o que ficou imortalizado em uma espécie de aforismo: “Se conhecessem a intimidade sexual uns dos outros, ninguém se cumprimentaria”.

site: www.matheuspenafiel.wordpress.com
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