Oz 29/08/2017
Meio copo de cólera
Sobre a forma, o livro é curto, mas relativamente denso. Não me incomodei em nada com a escrita sem pontos finais, já que um dos meus escritores favoritos, Saramago, também não é lá muito ortodoxo nesse sentido. Até acho que é um ponto positivo, já que dá uma fluência e uma dinâmica grande no fluxo de pensamento dos personagens.
A história começa com um casal fazendo amor e, na manhã seguinte, o sujeito se enfurece com as formigas que comem a cerca-viva do seu jardim. Ele sai chingando tudo quanto é coisa e a mulher (jornalista) toma as dores dos empregados, repreendendo a forma bruta com que o sujeito se expressa. Nisso, começam a entrar na discussão as visões de sociedade conflitantes entre os dois, rolando algumas metáforas com o tempo em que a obra foi escrita.
Tudo isso é bem interessante, mas certamente não faz meu estilo. O que me incomodou nesse livro é que, para mim, a escrita mais lírica e rebuscada com que o personagem-narrador expressa suas ideias não condiz muito com o modo com que uma pessoa pensaria/falaria nessa situação, o que acaba por me soar um texto poético, porém artificial e cansativo. Embora a literatura se permita lançar mão justamente desse estilo mais "complexo" de texto, isso só me agrada quando vejo um sentido para aplicar essa forma aos personagens. Na obra, os personagens acabam sendo apenas uma alegoria para expor ideias conflitantes. Nesse caso, o que importa para o autor, é mais ressaltar a discussão de ideias do que desenvolver uma trama ou a fazer uma caracterização mais pormenorizada dos personagens. Essa escolha, para o meu gosto, é como beber de um copo meio cheio ou meio vazio, que, ao mesmo tempo, mata a sede com algumas frases marcantes, mas não me satisfaz completamente como leitor.
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