Sâmya Mesquita 05/09/2020Precisamos falar de MULHERES QUE CORREM COM OS LOBOS, da Clarissa Pinkola EstésO best-seller da psicanalista americana é uma coletânea de histórias folclóricas misturadas a uma análise psicológica para resgatar a natureza feminina primitiva - regada a doses de espiritualidade e ensinamentos. A cada novo mito, a autora tenta aproximar o dito feminino selvagem, como egrégora do inconsciente coletivo, da realidade da mulher moderna e sua necessidade de libertação da opressão patriarcal. O objetivo é fazer a leitora perceber que pode ser livre para ser e fazer o que quiser. E que, por mais que o mundo nos machuque e traumatize, nós temos o poder inerente de mudar nossa realidade.
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Li esse livro pela primeira vez em 2017 e, naquele momento, me ajudou a entender muito de quem eu sou: minha ancestralidade, minha espiritualidade, minhas curas e meus traumas. Ele dá margem a entender diversas outras práticas do Sagrado Feminino. Mas vamos deixar claro que elas se encaixaram perfeitamente à minha realidade: sou uma mulher branca, cisgênero, com útero relativamente saudável e com certa facilidade de acesso a esse entendimento holístico do mundo. Nem todas as mulheres vão ter essa facilidade:
. Algumas são pretas e não vão se sentir representadas nessas histórias.
. Outras são trans e não possuem útero para ligarem-se a esta "natureza feminina primitiva" - elas são menos mulheres por isso?
. Tem ainda mulheres que, por algum motivo, não possuem mais útero por diversos motivos de saúde.
. E ainda tem naquelas que, por viverem em periferias ou em situações de risco, não conseguem se conectar a círculos de mulheres, não tem como comprar livros caros de reconexão ou mesmo ter um cantinho pra "plantar a lua" - ritual simbólico ou mágico de reconexão com a terra.
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Talvez, por falar de mitos folclóricos, tem demasiadas histórias de violência sexual. Mas até posso tentar entender, já que foi lançado há 28 anos e não se falava tanto em cultura do estupro. Ele tem ajudado milhares de mulheres nas últimas décadas, desde quando foi lançado. Ajuda a ter orgulho de ser mulher e de nossa história ancestral, ao contrário do que nos é ensinado. Pena que seu conhecimento é restritivo à mulher cis, branca e privilegiada, muito aquém da complexidade moderna do que é Ser Mulher.
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De qualquer maneira, recomendo a leitura. Esta resenha é baseada em como penso hoje esses assuntos - o que é totalmente diferente de quando li pela primeira vez e, com certeza, poderá mudar nos próximos anos. Mas se me ajudou, pode te ajudar também. Daí, você tira suas conclusões.
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