Matheus 07/05/2024
A infertilidade do belo
?Espelho, espelho meu, existe alguém mais belo do que eu?? A famosa fala dos clássicos faz alusão a busca incessante do conceito de belo e perfeito. A parametrização da beleza em um nível a ser alcançado pelos demais. Quem sabe, até a exclusão da imagem da parte do indivíduo que não se sente vinculado a padronização de um todo. De um conceito. De uma definição única e singular: o belo é.
O Olho mais azul de Toni Morrison aborda os impactos da delimitação do conceito de beleza assim como seus reflexos na construção social de indivíduos a beira da marginalização social na década de 40, enquadrados, principalmente, a minorias de classe, gênero e cor.
Pecola, a personagem central da história, é descrita inúmeras vezes como preta e feia. Muito feia. O desejo ardente de sua alma é de se encaixar no parâmetro de beleza do regime atual a época: possuir os olhos azuis. Para a Pecola não há foco, não há holofotes, o que se absorve por sua história são os fatos descritos em outras narrativas de pessoas presentes em sua vida: amigas, mãe, pai e até desconhecidos.
A ideia de Toni é de criar nenhum vínculo afetivo com a personagem e sim causar repulsa e indignação aos fatos apresentados que levam ao clímax do enredo final. Por tanto, focada em trazer um lado obscuro e real dos acontecimentos narrados, a autora acaba pesando a linguagem em certos pontos, transformando a leitura em nenhum pouco convidativa e até intragável em certos momentos. Podendo ser tida até como confusa pela falta de linearidade com os diversos narradores presentes.
Contudo, o desfecho final, apesar de extremamente penoso e triste, é impactante e reflexivo. O sonho de uma criança de ser bela, de ser aceita, de ser acolhida é podado pela brutalidade da sociedade. A somatória de todos os acontecimentos narrados, culminaram para o não florescimento da vida da personagem. A culpa aqui não é destinada a semente, ao indivíduo, mas sim ao meio, a terra na qual ela estava inserida.
A fertilidade dos sonhos e os motivos destinados a continuidade de sua existência plena são extinguidos. Sendo a tragédia perpetuada na inocência e na pureza que blindam a personagem de toda infelicidade a ela acometida. E no fim só lhe resta um único questionamento que nutre sua reafirmação de belo e genuíno, de anseio arrematado: ?Amigo, amigo meu, existe um olho mais azul do que o meu??.